Na prática, os embargos infringentes existem para que um dado tribunal emita juízo mais abrangente acerca de decisão tomada por órgão fracionário do mesmo tribunal. Em determinadas situações, se a decisão for unânime, não cabe recorrer à própria corte através dos embargos infringentes, mas, se a votação for proferida por maioria de votos, abre-se precedente para que outros julgadores votem sobre o caso e decidam qual decisão deve prevalecer, dentro do âmbito de competência daquele tribunal. No caso da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), em aceitar os embargos infringentes para os condenados do mensalão, a discussão recai sobre a velha prática que emperra o Judiciário brasileiro: excesso de recursos. Uma tradição que parece estar enraizada e que faz com que as decisões dos processos sejam revistas diversas vezes, em muitas oportunidades pelos mesmos órgãos julgadores.
A decisão de admitir os embargos mancha a imagem da corte e, ao ver dos cidadãos (leigos, via de regra), a conclusão é a de que a Justiça no Brasil continua tardia e falha. Com o processamento dos embargos, que será feito a partir de agora, novamente as mesmas onze cadeiras do Supremo vão reanalisar o processo. Ou seja, a corte vai julgar duas vezes a mesma questão. Parece que os seis anos do Mensalão e os quatro meses de julgamento, com mais de 50 sessões, não valeram de muita coisa. É esse o sentimento de quem acompanha o julgamento pelo noticiário.
Essa decisão escancara um dos problemas do sistema jurídico brasileiro: privilegiar recursos se tornou tradição no país, mesmo que a aplicação técnica seja discutível. E isso não significa deixar de lado a Constituição, pois, em muitos casos, de fato não cabe recurso. Isso só demonstra como os julgamentos não são reconhecidos e efetivados, pois nem a mais alta corte do país ficou livre dessa prerrogativa.
O tema, que agora está sendo amplamente questionado, é velho conhecido de todos os tribunais. Diariamente, os juízes analisam recursos do recurso, e aí por adiante. O problema é que essa possibilidade de repetição de medidas judiciais é amparada em conjunturas e doutrinas. É como se o Judiciário se transformasse em reprodução de teorias e cada parte insatisfeita apelasse novamente. Para quem vê isso de fora, parece que esse nó nunca conseguirá ser desfeito.
Talvez essa seja a grande questão que permeia todo o caso. Até quando o Judiciário vai arcar com esse entrave nos processos? E isso não quer dizer privar o réu do direito de defesa, mas acolher o recurso quando existe efetivamente previsão legal e lógica para isso. Os tribunais devem se desfazer das amarras de tradições.
Embora os ministros defendam a posição de aceitar o recurso, isso também pode ser considerado um tiro no pé, já que o custo também será alto para eles. A decisão poderá ser responsável por paralisar o Judiciário brasileiro e deixar por mais tempo na fila milhares de processos. Enquanto isso, o Supremo recomeça do zero o mensalão. Ademais, ainda existem os prazos regimentais da corte, o que deve arrastar o julgamento dos embargos infringentes para 2014.
O ponto aqui não é questionar a decisão técnica do Supremo de aceitar ou não os embargos, pois existe divisão de opiniões a respeito. Alguns entendem que era cabível o recurso e que a decisão mostra que a corte manteve a tradição de não ceder a pressões externas. Há outros que acreditam que o recurso não se ajustaria ao caso concreto, até mesmo pela revogação da legislação que lhe prevê. Porém o questionamento está na credibilidade e na imagem que o Supremo passa a ter depois dessa decisão.
Para o leigo, isso pode parecer artimanha para reduzir a pena dos réus ou, no jargão popular, para a história acabar em pizza. Já para os conhecedores das bases jurídicas e que apoiaram a decisão do tribunal, o segundo julgamento só vai confirmar o que já foi decidido no primeiro e não poderá abrir precedente para que os réus recorram a organismos internacionais. Isso é o que todos esperamos.
De fato, o Judiciário não deve ceder a qualquer tipo de pressão seja política, econômica, popular ou social. O exercício deve ser feito dentro da ética e apoiado na legislação. No entanto o grande problema da Justiça brasileira é a demora na definição dos processos e a morosidade do sistema por conta de tradições e burocracias técnicas, que foi o que aconteceu com o julgamento do mensalão. Diante de toda a repercussão que está tendo o caso, é impossível deixar de lado a expectativa que foi criada para que os culpados fossem condenados. Toda a sociedade ansiava por essa definição.
Para o novo julgamento fica a expectativa de que as penas serão confirmadas, conforme havia sido decidido anteriormente. Afinal, esse é o momento de mostrar que ainda resta moralidade no nosso país e que aqueles que corrompem o nosso sistema político não ficam impunes. Assim, ficará comprovado para a população que os dois julgamentos não foram em vão e que os condenados pagarão pelos crimes cometidos.
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