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Fizemos, os contribuintes brasileiros, há pouco, nossas declarações de Imposto de Renda. E entre outros dissabores e frustrações, surpreendemo-nos – especialmente aqueles que estudamos, ou que temos filhos ou dependentes que o fazem – quando somamos nossos comprovantes de despesas escolares e tentamos lançá-los no formulário. Em verdade, esbarramos em tantos limites e vedações, que, ao verificarmos o enorme descompasso entre o quanto poderíamos deduzir e os valores que, de fato, desembolsamos, mais do que espantados, ficamos todos indignados e revoltados.

E o curioso é que a nossa Constituição oferece todo o amparo para essa indignação e revolta, tão relevante é o direito à educação no seio da Lei Mãe. Trata-se de um direito social (art. 6º); de uma necessidade vital básica (art. 7º, IV); "...direito de todos e dever do Estado..." (art. 205); informado pelos princípios da gratuidade e do padrão de qualidade (art. 206, IV e VII); além de direito público subjetivo (art. 208, § 1º). Seria inimaginável que o IR não o prestigiasse. E ele o faz, mas, por força da sua legislação ordinária, de forma plenamente tímida e frouxa; de modo absolutamente minguado e precário.

Se a igualdade é o princípio dos princípios constitucionais, a capacidade contributiva, que dela decorre e que deve reger todos os tributos, inclusive o IR, é o princípio dos princípios tributários. Ora, para satisfazer aos requisitos da capacidade contributiva subjetiva, há que descontar dos rendimentos obtidos pelos contribuintes as suas despesas pessoais e familiares, de sorte a considerar as circunstâncias individuais de cada cidadão, distinguindo-o dos demais; mas essa dedução é, hoje, enormemente restrita, especialmente quanto à educação.

Até 1988, era possível abater mais amplamente, da renda bruta, as despesas com instrução do contribuinte e dos seus dependentes. Na atualidade, é autorizada essa dedução tão-só dos pagamentos a estabelecimentos de ensino, relativos à educação infantil (creches e pré-escolas), ao ensino fundamental e médio, e à educação profissional e superior (graduação e pós); com o limite anual individual de R$ 3.230,46, para esse exercício. Não há licença para todos os demais descontos, antes permitidos: livros, enciclopédias, revistas e jornais; material escolar; uniformes; transporte escolar; contribuições para associações de pais e mestres; aulas particulares; cursos preparatórios para vestibular e para concursos; cursos de informática, de idiomas, de música, de dança, de pintura, de natação, de tênis, de ginástica, de trânsito, de corte e costura e assemelhados.

Do robusto dever constitucional do Estado quanto à educação, salta à vista o infortúnio dos obstáculos impostos, hoje, pela legislação infraconstitucional do IR, a essa dedução. A começar pelas restrições qualitativas: primeiro, pela essencialidade evidente, para a educação, de despesas como as efetuadas com livros, material, uniformes e transporte escolar; segundo, pela banalidade de muitas dessas despesas, tão corriqueiras no quotidiano da vida atual como as realizadas com informática, idiomas, cursos pré-vestibulares e para concursos; terceiro, pela nítida adequação de muitas delas a uma educação que visa "...ao pleno desenvolvimento da pessoa..." (art. 205), como as efetivadas com música, dança, pintura etc. Esses embaraços reduzem drasticamente a individualização do IR, operando, por óbvio, contra a capacidade contributiva e a igualdade!

E a prosseguir pela restrição quantitativa: R$ 3.230,46, por ano e por pessoa, é um limite que, mais do que merecer crítica, por ser acanhado, irrisório e miserável, encontra-se a distâncias incomensuráveis da nossa realidade. Se considerarmos, por exemplo, um dependente universitário, que estuda numa boa instituição privada de ensino, tal limite, apto a cobrir de duas a, talvez, com sorte, três mensalidades, raia pela esfera do mesquinho e do grotesco! E não se diga que o ensino particular é apenas mais uma alternativa, de livre opção do contribuinte, porque, quando o Estado se mostra incapaz de oferecer o ensino gratuito e de boa qualidade, que é devido a todos os cidadãos, resta o ensino privado como única e exclusiva alternativa.

Recente decisão do TRF da 3ª Região confirma a inconstitucionalidade dessas restrições e a flagrante contradição que delas resulta! Ora, enquanto o texto constitucional honra, prestigia, enaltece e exalta o valor educação, a legislação ordinária do IR – aqui, duplamente "ordinária" – desdenha, deprecia, desabona e menospreza esse mesmo valor!

Se a história da humanidade, como registrou H. G. WELLS, o escritor britânico do século XX, "...é, cada vez mais, a disputa de uma corrida entre a educação e a catástrofe", então, quando o desventurado legislador infraconstitucional do IR não nos encaminha à primeira, condena-nos, inapelavelmente, à segunda!

José Roberto Vieira, professor de Direito Tributário da UFPR e do IBET, é mestre e doutor em Direito do Estado (PUC/SP); estudos pós-graduados no Instituto de Estudios Fiscales (Espanha); ex-membro julgador do CARF; ex-auditor da Receita Federal; parecerista.

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