Aprovada há seis meses pelo Congresso Nacional, em meios aos protestos populares, a chamada Lei Anticorrupção Empresarial (Lei nº 12.846/2013) acaba de entrar em vigor e ganhar notoriedade nacional. A paternidade da lei deve ser atribuída à Controladoria Geral da União (CGU), que elaborou o Projeto de Lei enviado pela Presidenta ao Congresso, onde teve sua redação discutida por Comissão Especial Presidida pelo Deputado João Arruda, da qual tivemos a oportunidade de participar e colaborar. Um dos motivos determinantes da rapidez no trâmite e aprovação da lei foram as pressões internacionais por uma norma que desse maiores garantias de transparência aos eventos internacionais que o Brasil irá sediar. Aliás, um dos pontos de inovação da lei é justamente a proteção que o direito brasileiro passa dar à administração pública estrangeira e internacional.

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Até então, as empresas que corrompessem gestores públicos com vistas à obtenção de vantagens dificilmente seriam punidas, a não ser após longos e demorados processos judiciais, de modo que seu patrimônio remanescia intocado por anos, favorecendo à "cultura da impunidade". A partir de agora, a própria Administração pode punir diretamente as empresas (e seu patrimônio) por atos de corrupção praticados por quaisquer de seus funcionários – como o oferecimento de propinas, a fraude e os conluios em licitações, além da manipulação de contratos ou a criação de empresas "laranjas", só para tratarmos de alguns exemplos. E o mais interessante é que isso irá ocorrer independentemente da comprovação de culpa. Havendo lesão, a responsabilidade passa a ser objetiva, o que torna o assunto muito controvertido. Será difícil prever como ser comportará a Administração, o Ministério Público (que deterá competência subsidiária para a apuração) e o Judiciário, frente à esta nova racionalidade jurídica.

O risco para as empresas é grande. As sanções administrativas aplicáveis são muito severas. A empresa condenada, além de ter de reparar integralmente o dano, pode ter de pagar uma multa no valor de 0,1 a 20% de seu faturamento anual bruto, ou, na impossibilidade de utilização deste critério, de valor estipulado entre R$ 6 mil a R$ 60 milhões. Para os casos mais graves, com a intervenção da Justiça, a empresa pode ter suas atividades suspensas ou interditadas, ou ser até mesmo dissolvida. O nome da empresa será inscrito em um Cadastro Nacional de Empresas Punidas, que equivalerá a um cadastro de empresas "ficha suja".

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Por outro lado, a lei oferece benefícios para as empresas que adotarem efetivos programas de compliance (controle interno de ética e obediência às leis) e que colaborarem através da confissão da prática de atos de corrupção, desde que cessem a prática e delatem os demais envolvidos, sendo seus termos pactuados através de um acordo de leniência.

Falta, contudo, a regulamentação de aspectos centrais da lei, para que sua aplicação possa ocorrer com segurança jurídica. Por exemplo, a delimitação do rito processual, com a especificação das fases de contraditório, prazos e recursos cabíveis; o estabelecimento de parâmetros objetivos para dosimetria da pena; e, principalmente, o detalhamento dos acordos de leniência e dos benefícios às empresas delatoras. Particularmente, quanto à multa, o nível de liberdade que a lei deixou para a fixação do quantum pode tornar-se mais um foco de corrupção do que de controle. É preciso que a discricionariedade seja reduzida ao máximo, tornando o critério de estabelecimento das penalidades o mais objetivo possível. Do jeito que está, esta "superlei" é perigosa e de difícil aplicação. O que pode fazer com que ela "não pegue".

No exterior, tal estratégia tem funcionado, como pode ser observado no caso da Alston, um dos mais notórios do momento. No Brasil, é difícil acreditar que alguma empresa terá interesse na colaboração e delação, considerando o complexo sistema de responsabilização existente, inclusive penal. A primeira impressão é a de que os benefícios da lei não serão muito atrativos no sentido de fomentar confissões. Os ônus ainda são muito maiores do que os bônus.

De qualquer forma, é importantíssima a regulamentação a ser realizada pelo decreto federal que ainda não foi editado, a fim utilizá-lo como base para que os demais entes federativos estabeleçam seus próprios decretos, de acordo com suas peculiaridades. Aparentemente, o Estado do Tocantins é o único Estado que já regulamentou a lei, e o Paraná declarou que a regulamentará brevemente. O importante é destacar que a lei já está em vigor e, em pouco tempo, terá aplicabilidade plena, quem sabe mudando os rumos da gestão empresarial e eu relacionamento com o Poder Público no Brasil.

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