De acordo com dados da Receita Federal, em 2011 o fisco bateu novo recorde de arrecadação, chegando a R$ 993,6 bilhões de reais no período. A magnitude da cifra reforça a ideia de que a União é um gigante cuja fome de dinheiro justifica-se pelo maciço financiamento de políticas públicas em diversos setores, tudo com o intuito de alcançar os objetivos da República, previstos no artigo 3º da Constituição Federal.

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Não obstante a ânsia da União em financiar projetos de interesse público, tal voracidade não pode servir de mote para o esmagamento do contribuinte em débito com a Fazenda Pública para além dos limites previstos em lei. Referimo-nos ao protesto de certidão da dívida ativa, prática institucionalizada por meio da Portaria nº 321/2006 do Procurador-Geral da Fazenda Nacional.

A despeito das inúmeras críticas contrárias à prática em questão, a Fazenda Pública Federal insistiu em defender que a medida reduziria o número de execuções fiscais ajuizadas para cobrança da dívida ativa, como também seria benéfica ao devedor, pois evitaria a expropriação de bens para garantia do débito.

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No entanto, tais argumentos são frágeis, eis que o protesto de dívida ativa afigura-se como mais um privilégio do crédito tributário, de toda sorte abusivo e injustificado.

A certidão da dívida ativa é título que goza de presunção de certeza e liquidez, tal como consta no artigo 204 do Código Tributário Nacional. Por essas características, foi elevada à categoria de título executivo extrajudicial, constante do artigo 585, inciso VII, do Código de Processo Civil, cujo procedimento para execução é previsto em lei específica (nº 6.830/80), tudo de forma a dotar o crédito tributário de privilégios que tornem mais fácil e rápido seu recebimento pela Fazenda Pública.

O entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça sobre o tema confirma a tese em questão, no sentido de ausência de interesse no protesto da dívida ativa, que por si só possui presunção de liquidez e certeza.

Recorde-se ainda que a inscrição em dívida ativa impede a emissão de certidão negativa de débitos, tão necessária à prova de regularidade fiscal exigida nos mais diversos atos.

De outro lado, o protesto de títulos é instituto do Direito Comercial, previsto na Lei 9.492/97, cujo objetivo é dar publicidade ao inadimplemento da obrigação assumida pelo devedor, e destinado primordialmente às relações travadas entre particulares, para as quais se supõe sejam minimamente simétricas.

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O protesto é ainda requisito para que o credor possa constituir o título executivo, justificando-se, portanto, a sua existência no âmbito dos negócios entre particulares.

Considerando a natureza dos institutos, o protesto da dívida ativa mostra-se inicialmente despropositado, visto que o ordenamento jurídico pátrio já dispõe sobre procedimento específico para o recebimento da dívida pública, tal como previsto na Lei nº 6.830/80. Desse modo, obviamente, não há que se falar em protesto da Certidão de Dívida Ativa para constituição do título executivo.

Nesse sentido se pronunciou o eminente ministro Luiz Fux enquanto no Superior Tribunal de Justiça, asseverando que "por mais de uma vez ambas as Turmas que integram a Seção de Direito Público desta Corte examinaram a questão abordada nestes autos e em todas as oportunidades reiterou-se o entendimento de que é desnecessário o protesto da CDA, visto que, por força da dicção legal (CTN, art. 204), a dívida regularmente inscrita goza de presunção relativa de liquidez e certeza, com efeito de prova pré-constituída, a dispensar que por outros meios tenha a Administração de demonstrar a impontualidade e o inadimplemento do contribuinte, porquanto tais elementos são ínsitos à finalidade que a lei atribuiu ao referido documento" (AgRg no REsp 1.120.673/PR, DJE 21/02/2011).

Mais grave é o fato de que o protesto da dívida ativa não se coaduna àquele pressuposto de simetria na relação entre credor e devedor, evidentemente porque a Fazenda Pública já possui à sua disposição norma especial para cobrança do débito, assim como diversos privilégios processuais aptos a colocá-la em posição mais vantajosa que o contribuinte devedor.

Não bastasse o uso anômalo do instituto do protesto, tal ato contraria um dos princípios basilares da execução civil, previsto no artigo 620 do Código de Processo Civil, segundo o qual, na execução deve-se adotar a forma menos gravosa ao devedor. Nesse sentido, o protesto da dívida ativa afigura-se como medida excessiva para o recebimento do crédito tributário, um verdadeiro bis in idem nos meios para constranger o devedor ao pagamento, já que a inscrição produz praticamente os mesmos efeitos que o protesto.

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