Nos últimos meses, duas novidades surgiram para os escritórios de advocacia que desejam firmar contratos com a administração pública: as súmulas quatro e cinco do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil que consolidaram o entendimento anterior do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmando não ser necessária licitação para contratar determinados serviços jurídicos.
Na justificativa, o ministro Carlos Velloso (que deixou o Supremo em 2006), do STF, argumenta: "A contratação de advogado dispensa licitação, dado que a matéria exige, inclusive, especialização, certo que se trata de trabalho intelectual, impossível de ser aferido em termos de preço mais baixo".
A súmula quatro atribui a decisão à singularidade da atividade, à notória especialização e à inviabilidade objetiva de competição.
O serviço singular é aquele que decorre de circunstâncias de caráter personalíssimo, geralmente ligadas a trabalhos intelectuais ou artísticos, realizados por pessoa isolada ou conjuntamente, que tornam a inviável a competição ou disputa.
Já a notória especialização é averiguada por meio da experiência anterior do particular ou empresa, classificada geralmente pelo conjunto de atividades realizadas (enquadramento, organização, técnica e resultado anterior), que possam garantir a plena satisfação do interesse público.
Assim, sempre que ficar caracterizada a singularidade do objeto e a notória especialização, haverá também inviabilidade de competição, conforme preceitua o artigo 25, inciso II, da Lei 8.666/93.
Em contrapartida, a súmula cinco prevê a não responsabilização civil ou criminal do advogado que, no regular exercício da profissão, emite parecer técnico opinando sobre dispensa ou inexigibilidade de licitação para a contratação pelo Poder Público.
Tal previsão decorre da interpretação do artigo 2.º, parágrafo 3.º, da Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e da OAB), segundo o qual o profissional da advocacia é inviolável nos seus atos e manifestações no exercício profissional.
O cenário atual das contratações públicas de serviços jurídicos vai de encontro aos princípios éticos priorizados pela profissão, diante da prática cada vez mais frequente de preços predatórios por parte dos escritórios de advocacia que se mobilizam para participar de licitações públicas. A preocupação do Conselho Federal da OAB é pertinente e tem como finalidade impedir que o trabalho do advogado seja equiparado a serviço comum, disponível em igual quantidade e qualidade no mercado.
A administração pública vem sofrendo amargas experiências, principalmente por priorizar cada vez mais o critério de "menor preço" como único fator para a aferição das propostas nas licitações de serviços jurídicos.
Isso porque a prestação adequada de serviços advocatícios envolve fatores como desempenho anterior, organização, estudos, técnica, confiança e, principalmente, conhecimento intelectual especializado.
Pensando na coletividade, é evidente que as licitações públicas têm o importante papel de evitar o superfaturamento das contratações de bens e serviços necessários à realização do interesse público. Contudo, em se tratando de contratação pública de profissionais ou escritórios de advocacia, a experiência nos mostra que a opção pelo menor preço não é a escolha mais adequada.
A atuação despreparada de advogados tem gerado, invariavelmente, prejuízos aos cofres públicos, porque a insuficiência técnica na prestação dos serviços pode ocasionar condenações desnecessárias, obrigando os órgãos responsáveis a despender valores muito mais significativos por falha, despreparo técnico jurídico, negligência ou imperícia dos profissionais.
Não é preciso de muito para saber que escritórios gabaritados e reconhecidos priorizam antes de tudo a eficiência e qualificação técnica. Em consequência, ficam excluídos do universo de competidores que mercantilizam a própria profissão com a prática de preços irrisórios.
Tão grande é a preocupação da OAB nesse sentido, que o artigo 41 do Estatuto da Advocacia e do órgão determina que "o advogado deve evitar o aviltamento de valores dos serviços profissionais, não os fixando de forma irrisória ou inferior ao mínimo fixado pela Tabela de Honorários, salvo por motivo plenamente justificável".
É recomendado, portanto, que a Administração Pública respeite aos parâmetros pré-estabelecidos na Tabela de Honorários da OAB, seja na fase interna da licitação, para previsão do orçamento básico, seja na fase externa, quando do julgamento das propostas comerciais.
Ressalta-se, entretanto, que nos casos em que o edital de licitação fizer menção expressa à Tabela de Honorários da OAB como critério para aferição das propostas comerciais, em respeito ao princípio do julgamento objeto, aquela ganhará força obrigatória.
Assim sendo, conclui-se que as súmulas quatro e cinco servem de alerta não apenas aos profissionais da advocacia, como também à própria Administração Pública. Uma vez que enaltecer os serviços jurídicos prestados por profissionais e escritórios renomados, seja por meio de dispensa de licitação ou de licitações do tipo melhor técnica ou técnica e preço, é também enaltecer e priorizar o interesse público.