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A impenhorabilidade de bens vem prevista no artigo 649 do Código de Processo Civil (CPC), dizendo serem impenhoráveis, no que aqui interessa, "os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução."

O Estado assegura especial proteção à família (Constituição Federal, artigo 226). O direito à moradia é considerado um dos direitos de personalidade inerente à pessoa humana. Nesta direção, o imóvel ocupado pela família detém características peculiares, dentre elas a impenhorabilidade prevista no artigo 3º da Lei 8.009/90, que estabelece ser impenhorável o bem de família (instituição de origem norte-americana).

O artigo 1º da referida lei, dispõe que:

"O imóvel residencial próprio do casal, ou de entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges, ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta Lei".

O legislador pátrio trouxe assim, por intermédio da referida Lei 8.009/90, proteção ao devedor e, consequentemente, à sua família, inspirado fundamentalmente no princípio da dignidade da pessoa humana, instituído por cláusula pétrea em nossa Constituição Federal. O espírito da norma foi conferir ao devedor e seus familiares o mínimo de dignidade, ao tomar como impenhorável sua moradia.

Em síntese, para que se constitua bem de família é necessário que o imóvel seja de propriedade do casal ou da entidade familiar e que a família nele resida. Não é imprescindível, contudo, seja o único bem do devedor, mas que seja o único destinado à moradia familiar. Preenchidos estes requisitos, impõe-se o reconhecimento da impenhorabilidade do bem, e por consequência, o levantamento do gravame judicial (penhora). A impenhorabilidade prevista na lei seria então estendida contra débitos trabalhistas, fiscais e de execução civil.

Aliás, a jurisprudência, em especial advinda de decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ), vem entendendo, por analogia, pela extensão desta proteção também ao imóvel objeto de aval dado em garantia de determinada dívida, desde que se trate de imóvel único e destinado à moradia do casal ou de entidade familiar (e ainda que a moradia seja destinada a uma única pessoa).

Pois bem, estes sucintos comentários trazem à reflexão se essa impenhorabilidade seria absoluta, a ponto de sempre, em quaisquer circunstâncias, salvaguardar tal bem de eventuais penhoras ou encargos. A nosso ver, nem sempre. Ocorrendo porventura esvaziamento do patrimônio do devedor, com indicativo de ofensa ao princípio da boa-fé, o bem de família pode vir a ter a impenhorabilidade afastada.

A propósito, assim recentemente se posicionou a terceira turma do STJ, no julgamento do recurso especial nº 1299580.

O caso, em apertado resumo, tratou de processo de execução ocasionado por um consumidor contra determinada construtora. No processo, o consumidor alegou que adquiriu o imóvel ainda na planta e pagou parte substancial do valor do apartamento, não tendo a construtora, no entanto, dado início às obras.

No curso do processo verificou-se que a construtora havia alienado seu patrimônio e não teria como cumprir o contrato.

Em razão deste fato, o juiz decidiu pela desconsideração da personalidade jurídica da empresa, ou seja, fez com que a obrigação passasse a alcançar também o patrimônio pessoal dos sócios da construtora.

A consequência foi a realização de penhora do imóvel residencial de um dos sócios, impugnada por este sob argumento de se tratar de bem de família, único que teria para residir.

O Superior Tribunal de Justiça, no entanto, indicando que o sócio da construtora havia alienado todos os seus bens durante o curso do processo, exceto o imóvel em que residia, entendeu ter havido fraude à execução e violação à Lei 8.009/90, abuso de direito que deveria ser reprimido. Ou seja, o tribunal considerou que houve esvaziamento patrimonial proposital, com a intenção de evitar a quitação do débito.

A relatora do processo, ministra Nancy Andrighi, destacou que o consumidor tentou adquirir sua moradia de boa-fé e mais de 15 anos depois, ainda não havia recuperado o valor investido. Também observou que o consumidor estaria inadimplente e, correndo risco de perder o imóvel em que reside com sua família. "Há, portanto o interesse de duas famílias em conflito, não sendo razoável que se proteja a do devedor que vem obrando contra o direito, de má-fé", asseverou.

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