Cargo: Juiz substituto
Disciplina: Direito Penal
Analise as situações abaixo sobre a teoria do erro e marque a correta:
I) Kelston, empresário do ramo de produtos odontológicos, conhece uma garota em uma festa. A garota tinha uma compleição física avantajada e disse ter 18 anos de idade, além disso se demonstrou muito desinibida sexualmente, o que levou Kelston a acreditar na idade da menina. Nesta mesma noite, resolveram ir a um local reservado onde praticaram atos libidinosos diversos da conjunção carnal, quando foram detidos por policiais que, ao solicitarem a identidade da garota, perceberam que ela tinha 13 anos de idade e prenderam Kelson por estupro de vulnerável. Kelston ficou assustado com a situação, já que acreditou verdadeiramente que a garota tinha 18 anos de idade.
II) Todo erro sobre causa de justificação é erro de proibição que, se escusável, isenta o sujeito ativo de pena e, se inescusável, pode ser diminuída de 1/6 a 1/3.
III) Quando o erro recai sobre a existência de uma causa de justificação é erro de proibição, agora se o erro recai sobre os pressupostos fáticos de uma causa de justificação é erro de tipo.
IV) Jango, policial federal, ao tentar prender traficante de drogas, é recebido a tiros. Jango reage à injusta agressão do traficante, entretanto um dos disparos de Jango atinge Flor, criança de 2 anos de idade que estava brincando no quintal de sua casa, próximo de onde ocorreu a troca de tiros.
V) Aparício, sujeito movido por ódio de Jandira, proprietária de uma loja de roupas, ao saber que a moça se encontrava em frente do estabelecimento comercial, adentra em seu veículo e se dirige até o local e, ao visualizar Jandira, com dolo de lesão corporal, atira com ela um objeto cortante. Entretanto, Aparício ao arremessar o objeto erra o alvo (Jandira), mas acaba acertando a vitrine da loja por inobservar dever de cuidado objetivo, provocando danos de grande monta.
a) A situação "II" é atribuída ao entendimento da teoria extremada da culpabilidade, a situação "III" é atribuída ao entendimento da teoria limitada da culpabilidade e a situação "I" trata de exemplo de erro de tipo incriminador e independentemente de ser vencível ou invencível, Kelston não será responsabilizado pelo ato.
b) A situação "V" é chamado de erro diverso do pretendido ou aberratio criminis, já que Aparício deseja um crime (lesão corporal), mas acabou resultando em outro crime (dano). Na situação "I" Kelston está em erro de tipo incriminador e independentemente de ser vencível ou invencível não será responsabilizado pelo ato.
c) A situação "IV" é exemplo de aberratio ictus ou erro na execução em legítima defesa e neste caso Jango se amparado pela excludente de ilicitude em relação a morte de Flor. A situação "I" é exemplo de erro de tipo incriminador e, no caso de o magistrado entender ser invencível, será excluído o dolo e a culpa de Kelston, entretanto, se entender ser o caso de erro vencível, Kelston será punido pelo delito sexual na sua forma culposa.
d) A situção "V" é exemplo de erro na execução ou aberratio ictus, já que Aparício errou na execução de sua conduta, ou seja, desejava lesão corporal, mas acabou praticando crime de dano. A situação "I" é exemplo de erro de proibição, já que Kelston desconhecia a idade da garota com quem manteve atos libidinosos.
e) A situação "III" é atribuída ao entendimento da teoria extremada da culpabilidade; a situação "I" trata de exemplo de erro de tipo incriminador e, independentemente de ser vencível ou invencível, Kelston não será responsabilizado pelo ato; A situação "V" não é caso de erro diverso do pretendido e na situação "IV" o entendimento majoritário da doutrina inclina-se pela punição de Jango por homicídio culposo de Flor.
Resposta: A
O "X" da questão
Solon Cicero Linhares, professor de Direito Penal dos cursos de graduação e pós graduação da PUCPR e do Curso Professor Luiz Carlos, é mestre e doutorando em Direito pela PUCPR. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Penal Econômico.
Trata de questão envolvendo a teoria do erro em direito penal. Em quase 90% dos concursos públicos para área jurídica, a teoria do erro é tema recorrente.
Na questão acima, o examinador dispõe de várias situações. No item I trata do erro de tipo essencial incriminador. Como é sabido, esta modalidade de erro quando inevitável, exclui o dolo e a culpa e, portanto, não há que se falar em tipicidade. No caso do erro ser evitável por Kelston, há a exclusão do dolo de sua conduta e abre-se a possibilidade de punição por tipo culposo, caso haja previsão legal nesse sentido. Como a acusação é de estupro de vulnerável e, considerando que não há modalidade culposa deste delito, não há que se falar em tipicidade. Assim, independentemente do erro de Kelston ser evitável ou inevitável, não será responsabilizado pelo ato.
Os itens II e III tratam das teorias extremada e limitada da culpabilidade, respectivamente, ou seja, segundo a primeira, todo erro sobre causa de justificação é erro de proibição (teoria adotada pelo Código Penal Militar), entretanto, se o erro recai sobre os pressupostos fáticos de uma causa de justificação, será erro de tipo e no caso de recair sobre a existência ou limites da causa de justificação será erro de proibição. É certo que, neste último caso, pode-se falar em erro de tipo permissivo e erro de proibição indireto, respectivamente. Segundo a maioria da doutrina pátria, a teoria limitada da culpabilidade foi adotada pelo Código Penal Brasileiro.
O item IV trata da modalidade de erro de tipo acidental, aberratio ictus que, no caso concreto trazido pelo examinador, envolve a legitima defesa. Assim se fala em aberratio ictus em legitima defesa e, segundo entendimento majoritário dos nossos tribunais, não há responsabilização criminal por parte de Jango.
Por fim, o item V trata de fato típico consistente em tentativa de lesão corporal apenas. É certo que não se trata de aberratio criminis, como inicialmente poderia se pensar, já que não houve erro de crimes, mas sim um crime apenas. Registre-se que o segundo ato (quebra da vitrine por inobservância de dever de cuidado) nada mais é do que dano patrimonial, resolvível na esfera cível e não criminal (não há dano culposo em direito penal).
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