| Foto: Divulgação/DPU

A Defensoria Pública da União completou 18 anos no mês passado. Mesmo atingindo a maioridade, seu representante máximo, o defensor público-geral da União Haman Tabosa de Moraes e Córdova, no cargo desde 2011, acredita que a instituição ainda carece de profissionais e, principalmente, de autonomia administrativa e funcional. "[Antes] não tínhamos estrutura para brigar por nossos direitos, mas hoje estamos correndo para resgatar esse equilíbrio", diz.

CARREGANDO :)

Haman ficou mais conhecido do público depois de atuar como defensor de um dos réus do mensalão – o argentino Carlos Alberto Quaglia – no Supremo Tribunal Federal (STF). Ele foi o único que conseguiu que o processo de seu cliente fosse desmembrado e encaminhado para a primeira instância da Justiça Federal. "[Os defensores] atuam com todo aquele zelo que demonstrei no processo", avalia. Aos 37 anos, o defensor público sente o peso da responsabilidade do cargo, mas acredita que sua ascensão foi uma consequência natural da curta história da instituição.

Como o senhor resumiria seu trabalho como defensor público-geral da União?

Publicidade

É muito gratificante porque você consegue ver as coisas acontecendo de maneira gradual, mas constante. Ao mesmo tempo, há uma dificuldade porque se trata de um órgão nacional que precisa ser fortalecido em todos os estados.

Quando assumiu a DPU, em 2011, o senhor afirmou em uma entrevista que era quase insustentável administrar a Defensoria por conta da falta de pessoal, de estrutura e instrumentos. Como que está essa situação hoje?

A situação ainda é difícil, continuamos sem carreira de apoio e nos valemos das requisições de outros órgãos. Existem projetos no Ministério de Planejamento prevendo que a Advocacia-Geral da União [AGU] e a Defensoria Pública da União se juntem para criar uma carreira de apoio. Mas ainda falta quase tudo. Acima de tudo, precisamos de autonomia funcional e administrativa.

Por que a instituição ainda carece dessa autonomia?

Dentro da defensoria pública brasileira, a Defensoria da União é a única que não tem autonomia. É uma luta antiga, que vem desde que a PEC da Reforma Judiciária tramitava no Congresso [a proposta foi aprovada em 2000]. Naquele momento, não tínhamos estrutura para brigar por nossos direitos, mas hoje estamos correndo para resgatar esse equilíbrio.

Publicidade

Como fazer com que a população conheça melhor o trabalho da Defensoria Pública?

Como já conseguimos firmar nossa base nas capitais, começamos a fazer essa conscientização dentro dos estados. Temos um Ministério Público fortalecido e a Defensoria Pública tem que ter esse fortalecimento para que a deusa da Justiça, que simboliza o equilíbrio entre as partes, esteja realmente equilibrada.

Existe uma resistência da advocacia sobre a atuação da defensoria em outras áreas além da penal?

Não queremos prestar serviços para quem tem condições de pagar e entrar na esfera dos particulares. Nosso grande problema é justamente o contrário: não ter condições de atender todo mundo da forma como gostaríamos.

E sobre a proposição de ações civis públicas? Existe uma disputa entre a defensoria e o Ministério Público? Não há um risco de haver concorrências de ações?

Publicidade

Essa é outra questão sobre a qual se perde muita energia porque a população brasileira precisa de atores que possam manejar ações civis públicas com responsabilidade. Hoje, a Defensoria Pública e o Ministério Público [MP] têm condições de manejar essas ações, mas ainda é insuficiente. Não há porque a defensoria ficar brigando com o MP tendo em vista que ambos são essenciais.

E qual sua opinião sobre a atuação dos defensores dativos [designados pelo juiz quando o réu não tem condições de constituir defensor e não há na comarca defensores públicos para a tarefa]?

Precisamos dos dativos porque não temos defensores suficientes. Há uma verba no orçamento do Judiciário reservada para as despesas com os dativos, o que é um erro, pois o Estado já previu a defensoria para fazer isso. Na medida em que a Defensoria Pública for se implantando, a tendência é que se acabe com o trabalho do advogado dativo.

Um dos problemas encontrados em algumas cidades é a falta da Defensoria Pública. E, às vezes, em alguma cidade próxima existe o defensor, mas ele não pode atuar em outra comarca. Como o senhor avalia essa questão e como acha que ela poderia ser resolvida?

Hoje, no Brasil, precisaríamos de mais 5 mil defensores para cobrir a esfera estadual e mais 800 para cobrir a Justiça Federal. Ou seja, não temos condições de receber em um determinado município a demanda de outros municípios. Se o defensor abrir esse flanco, pode ficar sem condições mínimas de atender ao seu município. Entre atuar de forma ruim e não atuar, a defensoria acaba optando por não atuar.

Publicidade

A Defensoria Pública deveria contar com o apoio de psicólogos, assistentes sociais e outros profissionais. Existe o fortalecimento desse quadro?

A AGU e a DPU estão trabalhando juntas para ter profissionais. Temos 300 servidores espalhados pelo país e, até que se implante o quadro efetivo da defensoria, a lei concedeu ao defensorgeral o poder de requisitar servidores de outros órgãos. Mas qual o órgão que quer perder servidores? O cobertor é curto, por isso existe a necessidade da nossa carreira própria.

O senhor ficou conhecido pela atuação no caso do mensalão e foi o único defensor que conseguiu o desmembramento do processo do seu cliente. Isso ajudou no reconhecimento do trabalho do defensor público?

Talvez esse tenha sido o grande ganho da Defensoria Pública da União. Fomos muito elogiados pela capacidade técnica na argumentação e isso não é nada diferente do que os defensores fazem no país inteiro. Eles atuam com todo aquele zelo que demonstrei no processo. Quebramos o paradigma de que, para o pobre, qualquer profissional serve.

Foi o caso mais importante em que o senhor atuou?

Publicidade

Foi muito bom para dar visibilidade à instituição e para o meu crescimento profissional, mas existem outros casos de igual relevância e importância que a gente fica muito feliz quando consegue uma vitória, como casos de medicamentos de câncer obtidos na Justiça, pois você salva a vida de uma pessoa.

O senhor sente o peso de ocupar um cargo tão importante sendo uma pessoa jovem?

O cargo de defensor público-geral da União está a cada dia com mais atribuições, mais respeitabilidade e tenho de chefiar uma instituição de âmbito nacional. São mais de 3 mil pessoas que estão sob a minha coordenação e é uma responsabilidade muito grande. Mas ser um defensor jovem é uma consequência de a instituição ser muito jovem, ela completou apenas 18 anos.

Qual a origem do seu nome? É relacionado com alguma descendência?

É um nome de origem hebraica, mas não tenho nenhuma relação. Foi uma coisa familiar mesmo, minha mãe resolveu inventar e colocou esse nome [risos]. Tenho ascendência portuguesa e parte da minha família é do Norte, outra do Sul do país, então tem uma mistura.

Publicidade

O senhor já trabalhou no Rio de Janeiro também. Sente falta das praias ou prefere Brasília?

Sou brasiliense e estou no meu habitat natural, além de ficar mais próximo da família. O Rio de Janeiro é uma bela cidade e foi onde tive a minha primeira experiência como defensor. Lá, existe uma cultura muito forte na Defensoria Pública Estadual, então eu não poderia ter ido para um estado melhor para aprender.