Luís Roberto Barroso é advogado de causas polêmicas. No currículo estão a defesa de Cesare Battisti, da união homoafetiva, do aborto de anencéfalos, entre outros. Barosso diz não procurar esse tipo de causa. São elas, na verdade, que o procuram. As defesas que faz por pura convicção, ele garante, não cobra.
Filho de um promotor de justiça e de uma advogada da Rede Ferroviária Federal, Barroso descreve a casa em que cresceu como um ambiente de livros e conversas sobre Direito. Por isso, a escolha da profissão foi natural. Livre-docente pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), mestre pela Yale Law School (EUA) e doutor pela UERJ, Barroso conversou por telefone com a reportagem da Gazeta do Povo. Leia os principais trechos da entrevista:
O senhor não tinha experiência com processos penais, por que assumiu o caso de Battisti?
Sem nem ter sido acusado de homicídio no primeiro julgamento na Itália, o Cesare foi condenado em um segundo julgamento, apenas com base em delações premiadas. Foi um filme de terror. Depois de ter conversado com ele, me convenci de que ele não havia participado dos homicídios. Fui contemporâneo desse clima de guerra civil que existia entre esquerda e direita, na década de 1970. Não havia sentido, 30 anos depois, o Brasil entrar nessa história no papel de carrasco e mandar esse homem de volta para Itália. Eu achei que a causa era justa e boa.
O senhor tem se envolvido em temas polêmicos. Escolhe por convicção?
Nenhuma dessas causas eu escolhi, todas elas vieram até mim. E essas questões faço por convicção, pro bono. Na do Cesare, eu recebi honorários módicos, que doei. O Millôr Fernandes tinha uma frase muito boa: "Sempre desconfie de alguém que ganhe dinheiro com a sua ideologia."
Sobre o aborto de anencéfalos, liberado pelo STF, na última semana, há pessoas que dizem que é como matar uma pessoa deficiente, tirar uma vida...
Tenho o maior respeito pelas pessoas que, por convicção religiosa, sejam contrárias ao aborto. Porém, na anencefalia, não existe uma potencialidade de vida. A anencefalia é 100% letal. Em mais ou menos 50% dos casos, a morte se dá ainda no útero e no restante entre segundos e minutos após o nascimento. É a mulher quem deve escolher como lidar com isso. O Estado não tem o direito de tomar essa decisão.
O STF não está legislando ao se posicionar assim?
O STF está aplicando a Constituição e ajudando a superar um imobilismo que, por vezes, ocorre no processo legislativo. Em algumas situações, o processo político majoritário não consegue atender a determinadas demandas sociais, e o Supremo faz muito bem ao atuar.
Quando foi autorizada a união estável entre casais homossexuais pelo STF, foi aberta uma brecha para que ela seja convertida em casamento?
O Supremo equiparou as uniões estáveis tradicionais às uniões homoafetivas e disse que devem produzir os mesmos efeitos. Um dos efeitos é a conversibilidade em casamento. Portanto, eu acho que está implícita a legitimidade do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Se nós achamos que o casamento é uma instituição boa, por que haveríamos de excluir um grupo por sua opção sexual?
O senhor tem um blog Direito, Música e Poesia. Como é sua relação com esses outros temas?
Eu gosto muito de música e poesia. Eram os caminhos que eu gostaria de ter seguido, se eu não tivesse sido advogado. Foi uma forma tardia de satisfazer essas minhas outras vocações na vida.
Colaborou Tatiane Salvatico, especial para a Gazeta do Povo.
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