A vivência como ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) leva o jurista Fernando Neves a afirmar que a Justiça Eleitoral é o ramo mais ágil do Judiciário. Em 2004, ele fez parte da comissão criada pelo ministro Carlos Mário Velloso, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), para elaboração da Lei da Ficha Limpa. Quando esteve em Curitiba para participar do III Congresso Brasileiro de Direito Eleitoral, em maio, Neves conversou com a reportagem da Gazeta do Povo. Confira os principais trechos da entrevista.
O senhor acredita que a lei da Ficha Limpa será completamente aplicada? Há estrutura para isso? Há tempo hábil?
Os candidatos têm tempo hábil. Eles vasculham a vida dos adversários para procurar obstáculos que possam opor ao registro deles. O tempo é mais do que suficiente. Mas evidentemente, há um número grande de processos. E a Justiça Eleitoral tem de se aparelhar para julgar isso, no menor espaço de tempo.
Da experiência no período que o senhor esteve no TSE até agora, acredita que houve mudanças na maneira da Justiça Eleitoral intervir no processo eleitoral?
Eu acho que não. O que há é uma quantidade maior de questões levadas à Justiça Eleitoral. Quando eu estive no TSE, recebíamos pouco mais de mil processos numa eleição. Hoje, recebe-se cinco mil, seis mil, talvez até mais de 10 mil.
A partir da Constituição de 1988, o cidadão passou a ter, no Poder Judiciário, um interlocutor mais presente e que, portanto, passou a ser mais demandado. E isso também tem reflexo na Justiça Eleitoral.
E quanto à crítica de excessiva judicialização do pleito?
A definição de regras é fundamental num processo eleitoral tranquilo, e as regras devem ser fixadas com antecedência. A eleição ideal é a aquela que não tenha nenhum processo depois que ela termina. Mas, claro, isto é utopia. Todo derrotado propõe uma ação contra o vencedor, para satisfação dos advogados. Mas a Justiça Eleitoral deve ter muita consciência no exame desses processos, para atribuir também um valor à vontade popular. Porque democracia é manifestação da vontade popular.
Quais são suas preferências, além do Direito?
Há muito tempo deixei de ser juiz, e me dedico à advocacia. Tenho uma advocacia muito intensa, que não permite muito tempo de lazer. Mas me divirto fundamentalmente nas minhas viagens, refeições, um bom copo de vinho... E brincando com os netos tenho dois. Gosto muito de ir ao Rio de Janeiro, aos Estados Unidos, Europa. Todo lugar é bom para viajar.
Atualmente, há algumas críticas sobre o fato de o Supremo Tribunal Federal (STF) estar legislando. O Judiciário está mesmo assumindo este papel?
O STF está dando solução a demandas que lhe são postas. Quando se apresenta um caso ao STF, o dever dele é dar uma solução. E alguém pode até não concordar com essa solução, mas o Poder Judiciário age demandado. Ele parte dos princípios constitucionais devidamente estabelecidos e, a partir daí, fica com a responsabilidade de dar a cada um o que é seu. Quem bate às portas da Justiça tem o direito de obter uma resposta.
É comum, no meio jurídico, dizer que a Justiça Eleitoral no Brasil é algo que deu certo. O senhor concorda com isso?
Não tenho dúvida. As pesquisas indicam que é o ramo do Poder Judiciário que com mais agilidade deu respostas às demandas que lhe foram apresentadas. Isto é pela própria estrutura da Justiça Eleitoral, porque as questões postas têm prazo para terminar. O processo eleitoral é mais ágil.
Não é curioso que, justamente no Brasil, onde vemos tantos casos de corrupção, a Justiça Eleitoral seja tão eficaz?
Quanto à corrupção, não sei se estamos acima da média. Acho que no Brasil existem tantos desvios de conduta quanto em outras partes do mundo. Mas nós temos uma percepção maior dessas irregularidades nos últimos anos, em razão da democratização do país, do papel importante da imprensa, de fiscalizar e denunciar. Temos um grau de percepção muito melhor, e buscamos soluções para os casos que são apresentados.
A imprensa deve ter limite diferente na época eleitoral?
Na eleição, é preciso garantir uma certa igualdade. Nós estamos falando de eventos que não são de jornalismo. Embora o debate tenha uma característica de informação, é um momento de exposição dos candidatos. Você tem que garantir uma certa igualdade de oportunidade a todos, para mostrar os que têm e os que não têm algo a dizer.
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