O fato de a Lei da Ficha Limpa ter sido aprovada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) não vai fazer com que deixem de ser necessários julgamentos caso a caso. Tampouco a nova lei traz grandes novidades, uma vez que a inelegibilidade sempre existiu. Mas, por outro lado, o país experimenta uma nova sensação de equilíbrio. Essa é a opinião do ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Henrique Neves. De passagem por Curitiba para o lançamento do III Congresso Brasileiro de Direito Eleitoral, que acontece em maio, Neves concedeu uma entrevista exclusiva à Gazeta do Povo.
A Ficha Limpa pode ser considerada uma revolução no Direito Eleitoral brasileiro?
A lei da inelegibilidade, na verdade, sempre existiu, a não ser em alguns períodos com eleição indireta para presidência no período militar.
Como será a aplicação prática da nova regra?
O meu sonho é que a Ficha Limpa não seja aplicável porque os partidos terão escolhido candidatos que não tenham nenhuma incidência em nenhuma hipótese.
O texto da lei deixa margem para dúvidas?
O STF já eliminou várias, mas há muitas ainda. Um exemplo é o das pessoas que se separam, porque o cônjuge fica inelegível para um terceiro mandato. Havia uma separação fraudulenta, para efeito cível, e com isso o cônjuge tentava ser candidato. Sempre se examinou em cada caso se deveria ser considerada a separação e a elegibilidade. A Ficha Limpa trouxe a inelegibilidade para aqueles que tenham sido condenados por fraude em separação. Mas esse é um processo dificílimo. A não ser que eu tenha um crime de falsidade ideológica ou atuação por alguma outra razão do Ministério Público, é pouco provável que essa ação seja iniciada. O próprio Supremo interpretou isso e falou que a justiça continua examinando caso a caso.
O STF entendeu que esfera penal é diferente da eleitoral, por isso não se aplicaria o princípio da presunção de inocência. O que o sr. acha desta posição?
A questão não é nova. Em um dos votos dos ministros, foi dito que na década de 1970, em plena ditadura militar, já era inelegível quem tivesse apenas uma denúncia promovida pelo Ministério Público.
Este tipo de entendimento conflitaria com a Constituição atual...
Nós temos um pêndulo. Aquilo que era extremamente rigoroso se soltou e rumou para o extremo oposto, com a Constituição de 1988 e a condenação apenas com trânsito em julgado. O pêndulo agora começou a voltar para a posição de equilíbrio, em que muitos casos poderão ser julgados apenas por um colegiado.
O que é essencial mudar na reforma do Código Eleitoral?
Nós temos um código eleitoral de 1965, baseado numa constituição de 1946. Depois temos várias leis, uma anulando a outra. Há também muitas ações para o mesmo fato. Hoje é possível que um fato gere quatro ou cinco ações, cada uma com uma consequência. Uma multa, outra cassa registro, outra declara inelegível.
O que a reforma deveria trazer?
Uma simplificação do processo, com, no máximo, dois tipos de ação: uma sumaríssima para problemas de propaganda e outra de rito ordinário para todas as demais questões. De uma forma compacta, com menos entraves. Quando começamos a especializar demais, o objetivo de preservar a legitimidade e normalidade das eleições é prejudicado.
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