| Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo

O presidente do Tri­­bunal Ambiental de Santiago, no Chile, Jose Ignácio Vasquez Marquez, visitou o Brasil pela segunda vez para participar da 10ª edição do Congresso de Direito Socioambiental e Sus­­ten­­tabilidade, promovido na Uni­­versidade Positivo. Apesar das diferenças culturais, ele afirma que prefere o clima brasileiro – mais quente – e confessa ser um apaixonado por Bossa Nova. Nesta entrevista, ele conta como o recém-criado Tribunal Ambiental já proporcionou evoluções na questão ambiental do país, que possui muitos conflitos na área de energia e mineração, e explica como os países devem encontrar maneiras de integrar desenvolvimento com sustentabilidade. "Não há desenvolvimento que não contemple a sustentabilidade da própria sociedade. Tem que haver necessariamente uma harmonia entre desenvolvimento e meio ambiente e um equilíbrio a favor do meio ambiente", avalia. Marquez acredita, ainda, que o Brasil está avançado nessa área e ajudou, inclusive, outros países. "De certa maneira, o país formou um modelo para o nosso ordenamento jurídico por termos conflitos muito similares", diz.

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O direito ambiental ainda é pouco discutido e conhecido entre os profissionais do Direito? Há um interesse maior hoje ou isso ainda é pequeno?

No Chile, o interesse por Direito Ambiental tem crescido substancialmente há 20 anos. Fundamentalmente porque, há 20 anos, o Chile tem uma direção, um ordenamento legal ambiental, e, como consequência disso, um aperfeiçoamento do ordenamento jurídico ambiental. Especialmente no âmbito jurídico, temos aumentado muito o interesse nesse tema e muitas universidades têm programas de estudos em Direito Ambiental. Essa é uma área que está crescendo substancialmente com o interesse dos novos advogados e estudantes de Direito. Além disso, há um efeito da criação do Tribunal Ambiental, no Chile.

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O que essas evoluções já conquistaram no Chile?

No país, o direito ambiental está centrado fundamentalmente nos conflitos ambientais que estavam crescendo na área mineradora, elétrica e, em menor medida, em outros recursos. Basicamente, é forte o conflito com esses meios.

As constituições moder­nas têm incorporado a questão ambiental. Po­­de­­mos citar a Cons­­ti­­tui­­ção do Equador, que inclui direitos à na­­tu­­­reza. Garantir isso na Constituição tem efetividade?

Sim. A Constituição do Chile, por exemplo, consagra os direitos ao meio ambiente livre de contaminação. Porém esse direito é amparado por outros mecanismos de proteção, como novas instituições ambientais e o novo tribunal ambiental, que se dirigem precisamente a ampliar as garantias judiciais para esse meio ambiente livre de contaminação.

Ou seja, devem se garantir outros meios, além da Constituição, para efetivação dos direitos ambientais...

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Sim, o recurso da proteção tem uma ação constitucional, mas devem existir essas outras ações para garantir punibilidade aos danos ambientais, como reclamações a órgãos administrativos de competência ambiental. Não somente a Constituição, mas também as vias legais e regulamentais judiciais devem ser fortalecidas para garantir esse direito.

Como o senhor vê o direito ambiental aqui no Brasil?

O Brasil tem muitos anos de desenvolvimento em direito ambiental, muito mais anos do que nós, inclusive. De certa maneira, o país formou um modelo para o nosso ordenamento jurídico por termos conflitos muito similares, como os que envolvem energia e mineração e outros recursos que precisam de controle de jurisprudência e doutrina. Isso nos ajudou muito, já que todos os países possuem debilidades.

Qual a importância de se discutir isso principalmente agora com a Copa do Mundo que exige várias obras?

Qualquer obra urbanística, não só os estádios, que têm função de espetáculo ou de evento desportivo, não pode ficar a margem da proteção ambiental. É preciso pensar em desenvolvimento sustentável. A sustentabilidade é um princípio e, por consequência, a segurança desse princípio deve ser pensada em função da proteção do meio ambiente. O cumprimento dessas normas e do ordenamento jurídico é um conhecimento sem exceção.

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Hoje, há muito mais exigências ambientais do que anos atrás para construção de grandes empreendimentos, como uma usina hidrelétrica. O empresário tem acompanhado esse desenvolvimento ou ainda falta conhecimento na área de direito ambiental?

Ainda falta. Mas isso muda na medida em que há organismos públicos que velam pela natureza e que exigem o cumprimento das normas ambientais. Qualquer projeto afeta o meio ambiente e deve haver medidas de mitigação que compensem, de alguma maneira, o efeito que pode produzir. Nesse sentido, é importante a existência de compensações na realização de qualquer obra de desenvolvimento urbano e imobiliário, mesmo os de pequena natureza.

Isso não pode travar o desenvolvimento?

A cada dia mais vamos adquirindo a consciência da importância da natureza no desenvolvimento. Não há desenvolvimento que não contemple a sustentabilidade da própria sociedade. Tem que haver necessariamente uma harmonia entre desenvolvimento e meio ambiente e um equilíbrio a favor do meio ambiente. Não somente um simples equilíbrio, mas é necessário um desequilíbrio em função do desenvolvimento sustentável, que é um dos princípios ambientais fundamentais.

Isso pode até incentivar a produção de métodos alternativos de desenvolvimento...

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Os projetos devem contemplar a necessidade de mecanismos de energia renováveis e deve haver políticas públicas orientadas a fomentar a incorporação dessas energias alternativas, como energias solar e eólica, que são fundamentais.

O senhor também foi árbitro da Câmara Comercial do Chile. Essa é uma ferramenta que está sendo incorporada no Brasil. O que poderíamos tomar como exemplos do Chile para incorporar aqui no Brasil?

No Chile, a Câmara de Comér­­cio existe há muito anos como via judicial alternativa. É um método que tem se mostrado bastante eficaz, ou seja, tem aumentado significativamente frente ao número de processos judiciais que se elevam nos tribunais. A via da arbitragem pode ser uma via muito mais rápida para fazer acordos e superar conflitos.

O senhor já veio ao Brasil mais vezes?

Vim somente uma vez, há 15 anos, com minha esposa, para um resort no Rio de Janeiro.

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Qual a sua impressão do país?

O Brasil me encanta muito, principalmente a natureza. Também sou fanático por Bossa Nova: Vinícius [de Moraes] e Toquinho.

O senhor sente alguma diferença cultural mais forte?

Sim, aqui as pessoas são alegres [risos] e há um clima muito bom. Temos [no Chile] um clima um pouco mais frio e as pessoas são mais opacas e tristes. Outro aspecto é o desenvolvimento urbanístico interessante que há no Brasil, principalmente porque há muito verde. No Chile, as cidades carecem muito de verde e uma cidade sem verde é uma cidade extremamente estressante. O Brasil é uma grande potência, mas com todos os defeitos que todos os países latino-americanos têm. Baixar o nível de desigualdade econômica é fundamental para que a América Latina seja um continente desenvolvido e para termos um desenvolvimento sustentável.