Ficha técnica
Natural de: Lima Duarte (MG)
Currículo: Graduado pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Doutor em direito e mestre em ciência política pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Ministro do Tribunal Superior do Trabalho. Foi juiz e desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª região (MG).
Jurista que admira: Amauri Mascaro Nascimento e Alice Monteiro de Barros
Leu recentemente: O Capital no século XXI, de Thomas Piketty
Nas horas vagas: faz caminhadas e assiste a jogos de futebol pela televisão
Autor de renome da doutrina nacional no que diz respeito ao Direito do Trabalho, Mauricio Godinho Delgado acredita que a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) é uma lei enxuta e que alterações nas suas disposições não devem retirar direitos trabalhistas. O ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) também expressou sua preocupação com as mudanças nos recursos trabalhistas introduzidas pela Lei 13.015/2014, especialmente quanto à celeridade da prestação jurisdicional. Godinho concedeu entrevista ao Justiça & Direito durante passagem por Curitiba para palestra no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 9.ª Região. Ele também comentou sobre o ensino jurídico no país, que, segundo ele, cresceu de forma exagerada nos últimos 20 anos, o que levou à perda da qualidade em várias instituições.
Qual o impacto da Lei 13.015/2014 sobre o processo trabalhista?
Essas alterações feitas pelo legislador, que entraram em vigor em setembro, efetivamente são mudanças muito fortes nos procedimentos dos recursos de revistas, dos embargos ao TST e também envolvem alterações significativas nos TRTs. A minha impressão é que a profundidade das alterações exigiria um tempo maior para adaptação. O TST formulou uma resolução para tentar colaborar com a adequação do sistema a essa mudança legal [trata-se do Ato 491/2014, publicado em 23 de setembro de 2014]. Esse ato procura fazer alguns ajustes, mas, como as mudanças envolvem também os TRTs, o seu impacto nos fluxos dos processos pode ser muito grande. Nós esperamos que a celeridade e a efetividade da prestação jurisdicional não sejam prejudicadas, porque esse é o objetivo maior do funcionamento do sistema judicial em uma democracia.
Haverá dificuldades na adaptação a essas novas disposições?
Naturalmente que todos nós, magistrados, servidores e advogados, deveremos agir com o máximo de boa vontade para que o objetivo do legislador seja alcançado sem prejuízo na prestação da jurisdição. O objetivo do legislador foi incentivar a uniformização jurisprudencial no Brasil. Isso é muito positivo, porque somos uma federação, o direito é nacional e é bom que ele seja o mais transparente e harmônico possível. Contudo as mudanças para esse objetivo foram muito grandes e muito minuciosas, envolvendo o dia a dia do TST e de todos os tribunais regionais, o que nos coloca em forte expectativa quanto a esse processo de adaptação.
Há críticas quanto ao excesso de súmulas e orientações jurisprudenciais por parte do TST. O senhor concorda com esse pensamento?
Os tribunais superiores, tanto o TST quanto o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF), somente se justificam se exercerem o papel de uniformizadores da jurisprudência. Eles não são e nem podem ser uma terceira instância para examinar o caso concreto e trazer uma solução diferente para o que é levado ao seu exame. O TST recebe mais de 100 mil recursos por ano. É evidente que não é razoável, nem racional, nem constitucional que esse tribunal se torne uma instância revisora das decisões dos TRTs. A prestação jurisdicional está muito bem feita, desde que conte com a participação de um juiz singular em primeiro grau e uma corte coletiva em segundo grau. Não é necessária uma instância revisora de terceiro grau. Por isso os tribunais superiores têm de uniformizar jurisprudência, sendo as súmulas e as orientações jurisprudenciais meros instrumentos para isso. Se o TST não editar súmulas, não vai exercer seu papel. Me parece que a criação de súmulas é um resultado natural do exercício da função constitucional das cortes superiores.
É preciso alterar a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT)?
A CLT é um diploma que tem sido atualizada intensamente ao longo dos anos pelo legislador e pela jurisprudência. Como a CLT é muito enxuta, dentro dela você tem direito individual do trabalho, direito coletivo, direito processual do trabalho e até a estrutura da Justiça do Trabalho. Isso apenas em 900 artigos, o que é uma demonstração de que é um diploma sintético. Isso é uma vantagem, porque permite a atuação da jurisprudência para atualizar o texto jurídico. A jurisprudência trabalhista tem cumprido seu papel. Qualquer melhora em qualquer diploma será bem-vinda, mas fazer uma reforma para retirar direitos trabalhistas é andar no sentido contrário do que determina a Constituição. A reforma pela reforma não se justifica. Se houver alguma mudança, deve ser para aperfeiçoar e melhorar as condições de vida e de trabalho dos brasileiros. Esse é o projeto constitucional.
Como o senhor enxerga o ensino jurídico no país?
O ensino jurídico brasileiro nos últimos 20 anos cresceu muito. Houve um crescimento exagerado até de cursos. Naturalmente esse crescimento desmesurado leva à perda da qualidade do ensino em várias instituições, e isso deve ser objeto de análise e acompanhamento pelas instituições competentes para isso, em particular o Ministério da Educação. É bom que haja expansão do ensino superior, mas preservada a qualidade de ensino. Superada essa questão da qualidade, me parece que é importante um reforço curricular nas disciplinas que traduzem o projeto constitucional de um Estado Democrático de Direito. As disciplinas que enfatizam a centralidade da pessoa humana na vida social. Algum aperfeiçoamento em busca de uma melhor perspectiva e maior peso para as disciplinas voltadas ao Estado Democrático de Direito e à dimensão social e humanística da Constituição são aperfeiçoamentos que devem ser feitos nas grades curriculares.
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