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Advogado experiente na área médica, Ernesto Lippman embrenhou-se, após perder um parente em 2009, numa seara nova e polêmica, envolvendo o Direito e a Medicina: o testamento vital. Tema de livro lançado recentemente por Lippman, o documento permite que a pessoa escolha se deseja ou não ser submetida a tratamentos fúteis e dolorosos caso pereça de alguma enfermidade grave. Desde o ano passado, uma resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) determina que os médicos sigam as instruções do testamento vital caso ele exista. O não-cumprimento dessas determinações pode acarretar em falha ética do médico. Nesta entrevista, Lippman fala dos conflitos éticos que envolveram a discussão sobre o testamento vital.

A Resolução 1995 do CFM, que dispõe sobre o Testamento Vital, gerou debates éticos e jurídicos. Como foi a sequência desse processo?

Tumultuado. Houve uma Ação Civil Pública contra a resolução. Ela dizia que o CFM não tinha competência para decidir sobre o assunto, que deveria ser disciplinado por lei. Alegava-se que se estaria dando quase que uma licença ao médico para matar e que, portanto, não se coordenava com o ordenamento jurídico. O Ministério Público expediu uma liminar para suspender a resolução, mas ela foi rejeitada pelo juiz. Existe um trabalho de conscientização sobre o que é o testamento vital. Ele é apenas e exclusivamente a possibilidade de não prolongar artificialmente uma vida indefinidamente, em caso de sofrimento, se esse for o desejo da pessoa. Também pode ser a decisão de se submeter ao máximo de medidas possíveis para prolongar a vida. Esta outra possibilidade é pouco conhecida.

O testamento vital dá proteção jurídica ao médico?

Sim. Há três utilidades para o documento. Primeiro, assegurar que a vontade do paciente seja seguida pelo médico. Outra é evitar brigas na família sobre quais procedimentos adotar em casos de inconsciência do paciente e, por último, proteção e amparo legal ao médico.

O documento precisa ser registrado em cartório para ter validade?

Não. Embora existam algumas vantagens em fazê-lo, como a permanência do documento num lugar seguro.

Como é a discussão do tema no Brasil?

O direito caminha lentamente. Nos EUA, o testamento vital é amplamente aceito e há uma discussão madura, por exemplo, sobre suicídio assistido e eutanásia. Mas introduzir esses temas por aqui seria matar a ideia do testamento vital. Antes de a pessoa ser contra ou a favor, ela precisa saber um pouco do assunto. Vou a faculdades de direito e a hospitais de renome, e os profissionais não sabem o que é testamento vital.

Falar de morte é um assunto que incomoda?

Na maioria das culturas ocidentais, esconde-se o assunto, evita-se falar nele. Na faculdade de Direito há uma cultura do litígio. A classe profissional dos médicos sofre de um problema cultural. A cultura médica é de que o médico deve preservar a vida a qualquer preço. Alguns também têm uma restrição religiosa e não se sentiriam bem administrando cuidados paliativos, entre outros assuntos.

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