ADI N. 4.274-DF

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RELATOR: MIN. AYRES BRITTO

EMENTA: ACÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PEDIDO DE "INTERPRETAÇÃO CONFORME À CONSTITUIÇÃO" DO § 2º DO ART. 33 DA LEI Nº 11.343/2006, CRIMINALIZADOR DAS CONDUTAS DE "INDUZIR, INSTIGAR OU AUXILIAR ALGUÉM AO USO INDEVIDO DE DROGA".

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1. Cabível o pedido de "interpretação conforme à Constituição" de preceito legal portador de mais de um sentido, dando-se que ao menos um deles é contrário à Constituição Federal.

2. A utilização do § 3º do art. 33 da Lei 11.343/2006 como fundamento para a proibição judicial de eventos públicos de defesa da legalização ou da descriminalização do uso de entorpecentes ofende o direito fundamental de reunião, expressamente outorgado pelo inciso XVI do art. 5º da Carta Magna. Regular exercício das liberdades constitucionais de manifestação de pensamento e expressão, em sentido lato, além do direito de acesso à informação (incisos IV, IX e XIV do art. 5º da Constituição Republicana, respectivamente).

3. Nenhuma lei, seja ela civil ou penal, pode blindar-se contra a discussão do seu próprio conteúdo. Nem mesmo a Constituição está a salvo da ampla, livre e aberta discussão dos seus defeitos e das suas virtudes, desde que sejam obedecidas as condicionantes ao direito constitucional de reunião, tal como a prévia comunicação às autoridades competentes.

4. Impossibilidade de restrição ao direito fundamental de reunião que não se contenha nas duas situações excepcionais que a própria Constituição prevê: o estado de defesa e o estado de sítio (art. 136, § 1º, inciso I, alínea "a", e art. 139, inciso IV).

5. Ação direta julgada procedente para dar ao § 2º do art. 33 da Lei 11.343/2006 "interpretação conforme à Constituição" e dele excluir qualquer significado que enseje a proibição de manifestações e debates públicos acerca da descriminalização ou legalização do uso de drogas ou de qualquer substância que leve o ser humano ao entorpecimento episódico, ou então viciado, das suas faculdades psicofísicas.

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AnáliseA maconha e o direito à liberdade de expressão

O Supremo Tribunal Federal (STF), acertadamente, conferiu interpretação conforme à Constituição ao §2º, do artigo 33, da Lei nº 11.343/2006, para dele excluir qualquer significado que enseje a proibição de manifestações e debates públicos acerca da descriminalização ou legalização do uso de drogas.

A ação direta de inconstitucionalidade foi proposta pela procuradora-geral da República Débora Druprat, no ano de 2011, com a finalidade de excluir qualquer exegese que pudesse ensejar a criminalização da defesa da legalização das drogas ou de qualquer sustância entorpecente específica, inclusive através de manifestações e eventos públicos, em virtude da discussão travada em âmbito nacional acerca da chamada "marcha da maconha".

Como é de conhecimento geral, naquele ano diversas mobilizações públicas de apoio à descriminalização do uso das drogas foram vetadas em alguns estados da federação sob o argumento de que tal evento implicaria em crime de indução ao uso indevido de drogas, inclusive com prisões e deflagrações de ações penais.

Lamentável constatar que em pleno Estado Democrático de Direito, consolidado – ainda que formalmente – já há 23 anos, cidadãos foram impedidos de expressarem seus pensamentos, em autêntica ofensa ao disposto no artigo 5º, incisos IX e XVI, da Carta Magna.

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Nesta conjuntura, de forma louvável salientou Sua Excelência, ministro Ayres Britto, relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) ora analisada: "não se pode confundir a criminalização da conduta com o debate da própria criminalização. Noutras palavras, quem quer que seja pode se reunir para o que quer que seja, nesse plano dos direitos fundamentais, desde que, óbvio, o faça de forma pacífica."

Aliás, tais debates e manifestações públicas sobre criminalização e descriminalização de condutas assumem crucial papel numa sociedade democrática e plural que, em sua essência, é dinâmica.

Destarte e como brilhantemente posto pelo representante do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM) em sua manifestação como amicus curiae na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 187, "definitivamente já foi o tempo das Constituições de 1937, de 1967 e da Emenda de 1969, em que a livre expressão, por não ser de fato livre, estava submetida ao juízo censório dos detentores do poder."

João Rafael de Oliveira, advogado criminalista, pós-graduado em Direito e Processo Penal, professor de Direito Processual Penal na UniBrasil.