Menos burocracia e mais simplicidade nos procedimentos processuais é a promessa do novo Código de Processo Civil (CPC), que está indo para a reta final no Congresso Nacional. O projeto, de iniciativa do Senado, passou por alterações na Câmara dos Deputados e agora volta à Casa de origem para a última votação. O CPC que está em vigor é de 1973. O fato de ter passado por uma comissão com alguns dos juristas mais especializados em processo civil do país e de ter recebido a contribuição de parlamentares que contam com assessoria jurídica de profissionais do direito de diferentes origens faz com que o código surja, segundo o jurista José Miguel Garcia Medina, com uma "intensa característica democrática". Ele explica que este novo projeto não é uma negação ou abandono do Código de Processo Civil que está em vigor, mas um avanço e até uma adequação a algumas práticas atuais. "É um projeto do seu tempo, formulado com base nos princípios da nossa Constituição", explica Medina, que integrou a comissão que elaborou o anteprojeto. Segundo ele, quem está estudando a doutrina avançada da matéria não vai ser pego de surpresa com as inovações. Por outro lado, o CPC que está prestes a ser aprovado tem recebido algumas críticas, como a falta de conexão com a realidade de utilização do processo eletrônico e sobre a manutenção do efeito suspensivo do recurso de apelação.
Prazos
Para interpor recursos e respondê-los, os prazos foram unificados para 15 dias; a única exceção são os embargos de declaração, que têm prazo de cinco dias. A grande mudança está na contagem, que passa a ser feita apenas em dias úteis, o que não faz muito sentido, na opinião do advogado e doutor em direito Luis Guilherme Aidar Bondioli, já que, com o processo eletrônico, o acesso a informação é facilitado e não se limita a dias de semana. O projeto prevê também a suspensão do prazo no recesso entre 20 de dezembro e 20 de janeiro. Nesse caso, Bondioli é favorável, pois todo o Judiciário para nesses dias. Na opinião dele, "seria uma hipocrisia" não suspender os prazos nesse período.
Menos burocracia
Os procedimentos, de acordo com o novo CPC, vão ser simplificados. Segundo a advogada Teresa Arruda Alvim Wambier, que foi relatora geral da comissão que elaborou o anteprojeto apresentado ao Congresso, atualmente há um excesso de formalidade devido à preocupação com fraudes e, por isso, os processos precisam de tantos carimbos e assinaturas. "Às vezes as coisas no Brasil são emperradas por excesso de formalismo e burocracia. O novo código significa um voto de confiança para os operadores do direito. Suprimem-se formalidades, complicações", observa a jurista.
Ordem cronológica
Atualmente não há uma regra clara sobre a ordem em que os processos devem ser julgados. No projeto do novo CPC, o legislador procurou criar um mecanismo para evitar que uma ação possa ser esquecida e outras furem a fila. O texto prevê que os juízes sigam a ordem cronológica da conclusão para proferir uma sentença ou acórdão. Prioridades já previstas em lei, como para idosos e portadores de doenças graves, serão mantidas.
Advocacia pública
Os advogados públicos também foram contemplados com mudança na legislação. Quando o novo CPC entrar em vigor, conforme prevê o artigo 85, § 19, eles passarão a receber honorários de sucumbência, coisa que não acontece hoje.
Celeridade
Por mais que o novo CPC traga expectativa de celeridade, os juristas consultados reconhecem que a lentidão não pode ser resolvida apenas com mudanças na legislação, já que também estão envolvidas questões estruturais. José Miguel Garcia Medina ressalta que "a lei processual ajuda, mas não resolve problema de morosidade". O advogado João Francisco da Fonseca avalia que um dos maiores problemas é a gestão: "O problema está no carimbo, os processos passam muito tempo parados nos escaninhos dos cartórios". Para Teresa Wambier, "o que torna o sistema moroso é o excesso de trabalho do juiz".
Efeito suspensivo
A manutenção do efeito suspensivo da apelação foi um dos temas que mais gerou debate no projeto do novo CPC. O anteprojeto chegou a prever o fim desse mecanismo, mas o artigo foi excluído na Câmara dos Deputados e se manteve o que já existe hoje, ou seja, sentenças não produzem efeito imediato. "É uma regra mais sensata, mas está em descompasso com o desejo da comunidade jurídica em geral. O ideal seria inverter a regra: o normal seria as sentenças produzirem efeito imediato, cabendo à parte interessada tomar providências para evitar essa eficácia, com base em mecanismo seguro criado pela própria lei, para não se dar margem a discussões", analisa a jurista Teresa Wambier. José Miguel Medina também não concorda com a alteração da Câmara, mas diz que isso não compromete a nova lei. "Um código nunca vai atender a todo mundo. Mas, apesar de divergências pontuais, esse projeto contém o que há de mais importante na ciência processual moderna."
Processo eletrônico
Uma grande críticas ao projeto é que o novo CPC não estaria acompanhando as inovações feitas no Judiciário com o processo eletrônico. O advogado João Francisco Naves da Fonseca, doutorando em Direito Processual pela USP, considera que o "novo código não está adaptado à nova realidade". Ele observa que, apenas em dezembro de 2013, o CNJ determinou que todos os tribunais do país utilizem o Processo Judicial Eletrônico (PJe) e que eles ainda terão que passar por anos de adaptação. José Miguel Garcia Medina, que integrou a comissão que elaborou o anteprojeto, explica que, pelo fato de a instalação do processo eletrônico ainda estar ocorrendo no Brasil, o projeto prevê a utilização desse recurso, mas seria cedo para se fazerem algumas definições. "O projeto incorpora, tenta se ajustar ao processo eletrônico. Por outro lado, isso vai ser aplicado gradativamente", diz Medina.
Jurisprudência
Um dos aspectos que resultam em excesso de processos no Judiciário é a falta de uniformidade jurisprudencial. A advogada Teresa Wambier explica que as partes nunca desistem de uma ação porque determinado tribunal tem uma decisão pacificada sobre um tema. Sempre há a esperança de que um juiz decida de maneira diferente das decisões anteriores. "Além de discordarem, os juízes mudam muito rápido de opinião. Isso estimula a litigiosidade", diz. De acordo com ela, o novo código estimula a criação de uma jurisprudência uniforme e estável nos tribunais e o respeito às decisões dos tribunais superiores.
Ações coletivas
Demandas repetitivas, apresentadas individualmente, poderão ser reunidas para que se decida em uma única tese, o que poderá ser feito já na primeira instância (hoje existe o recurso repetitivo para causas de teses idênticas). Essa medida é apontada pelos juristas como uma das que poderiam contribuir para se desafogar um pouco o Judiciário, por evitar uma sobrecarga de trabalho desnecessário.
Conciliação
O projeto do novo CPC procura estimular a conciliação com medidas como a criação de uma audiência de conciliação antes da contestação. A advogada Teresa Wambier explica que, segundo estudos sobre o tema, se a parte já se deu ao trabalho de contratar advogado e contestar, a conciliação não sai. Por isso, tentar fazê-la antes pode gerar melhores resultados.
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