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Entre crimes e contravenções

Especialista em Direito Penal, o professor da Universidade Federal do Paraná Carlos Roberto Bacila, também delegado de Polícia Federal, cita crimes e contravenções mais recorrentes entre os foliões durante os dias de carnaval. Nesse período, alerta ele, podem ocorrer tanto delitos mais leves como os mais pesados. Veja qual a punição prevista para os cidadãos autuados:

1 - Entrar em vias de fato: prisão simples, de 15 dias a três meses, ou multa (art. 21 da Lei de Contravenções Penais);

2 - Praticar ato obsceno em local público ou exposto ao público, como urinar na rua: detenção de três meses a um ano ou multa (art. 233 do Código Penal);

3 - Arremessar ou derramar em via pública coisa que possa ofender, sujar ou molestar alguém: multa (art. 37 da Lei de Contravenções Penais);

4 - Importunar alguém em local público ou dentro de local de acesso ao público, de modo ofensivo ao pudor: multa (art. 61 da Lei de Contravenções Penais);

5 - Apresentar-se publicamente em estado de embriaguez, de modo que possa causar escândalo ou coloque em risco a segurança própria ou alheia: prisão simples, de 15 dias a três meses ou multa (art. 62 da Lei de Contravenções Penais);

6 - Servir bebida alcoólica a menor de idade ou a quem já se encontra em estado de embriaguez: prisão simples, de dois meses a um ano ou multa (art. 63 da Lei de Contravenções Penais);

7 - Pichar edificação ou monumento urbano: detenção de três meses a um ano e multa (art. 43 da Lei 9.605/98);

8 - Perturbar o sossego com gritaria ou algazarra ou ainda abuso de instrumentos sonoros ou sinais acústicos: prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa (art. 42 da Lei de Contravenções Penais);

9 - Submeter, induzir ou atrair para prostituição ou outra forma de exploração sexual menores de 18 anos: reclusão de quatro a dez anos (art. 218 B do Código Penal);

10 - Constranger alguém a ter qualquer tipo de relação sexual com outrem, mediante a ameaça ou violência: pena de 6 a 10 anos. Caso a vítima tenha até 14 anos, o enquadramento é por estupro de vulnerável, com pena prevista de 8 a 15 anos de reclusão (artigos 213 e 217 do Código Penal).

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Nem tudo é alegria durante o carnaval. Pode até não parecer, mas foliões e o poder público têm deveres a zelar durante as comemorações da maior manifestação cultural brasileira. Para garantir o bem-estar coletivo, é preciso respeitar limites previstos em lei e ponderar até onde a folia pode ir. O som alto do trio elétrico pode entrar madrugada adentro? Há estrutura suficiente para atender todos que comparecerem a uma festa de rua? Qual a punição para depredação do patrimônio público e do meio ambiente?

Especialista em Direito Constitucional, o professor Ricardo Schier, do curso de direito da UniBrasil, diz que, a rigor, não existe legislação que verse especificamente sobre o que é permitido ou proibido nas festividades carnavalescas, mas que o evento, em si, é tutelado por dispositivo presente na Constituição Federal. Com isso, o que se vê nesta época do ano são leis municipais sendo relativizadas no que diz respeito ao limite de decibéis e de horário para o ruído provocado pela folia. "Os contornos de até onde pode ir a festa não ficam claros e também não dizem que não pode haver festa. Algumas pessoas gostam de usar a fórmula da vedação do abuso do direito. O problema é estabelecer o que seria o abuso nesse caso", observa.

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Schier salienta que é evidente que se promove carnaval de rua com música alta, mas, quando isso ocorre em locais considerados dentro de uma normalidade, como em uma propriedade rural, a noção de abusividade é derrubada. A visão, pontua ele, é conservadora, mas ajuda a balizar o que pode ser ou não feito. "O abusivo é o que não está na forma habitual da comunidade exercer seu direito. Um trio nas ruas de Salvador e no Rio é uma coisa, mas no Centro Cívico de Curitiba é outra", define. Abusiva, ressalta o professor, também pode ser a postura de cidadãos que praticam contravenções no espaço público. É o caso dos que urinam nas ruas e de bêbados em meio ao público que colocam em risco a segurança própria e até a de terceiros. Para tudo isso, pode haver punição.

Meio ambiente

O presidente da Comissão de Meio Ambiente da subseção do Paraná da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), José Gustavo de Oliveira Franco, argumenta que toda a festa realizada em espaços públicos demanda autorização prévia do poder público. Ao utilizar essas áreas, a folia também precisa respeitá-las, o que inclui evitar a geração de resíduos e a depredação ambiental do entorno. Quem desrespeitar esse princípio pode ser multado. "A limpeza é função do município, mas os blocos envolvidos também têm responsabilidade de não gerar lixo em locais inadequados. Isso pode caracterizar infração ambiental, apesar da incidência da notificação não ser tão comum e ser lavrada apenas por agentes de fiscalização ambiental", observa.

Segundo Franco, quem for pego danificando a flora natural de áreas de restinga, por exemplo, pode levar multa de R$ 5 mil a R$ 50 mil por hectare. O folião que "brincar" com plantas de ornamentação de logradouros públicos também pode sentir a sanção administrativa no bolso. Para cada muda arrancada, está prevista multa de R$ 100 a R$ 1 mil.

Ele observa, contudo, que mesmo a legislação que trata dos limites para o barulho apresenta brechas quando se trata de carnaval e festas populares semelhantes. Em Curitiba, por exemplo, a Lei Municipal 10.625/02 estabelece parâmetros para emissão de decibéis durante os períodos diurno e noturno, embora haja exceção expressa para o carnaval. O que não pode haver, alerta Franco, é uma poluição sonora que represente danos à saúde humana. Nesse caso, pode haver a aplicação do disposto no artigo 61 do Decreto 6.514/08: multa de R$ 5 mil a R$ 50 milhões.

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Estrutura e organização são fundamentais

Na teoria, enquanto os foliões se divertem, o poder público oferece estrutura adequada para que a festa transcorra adequadamente. Isso inclui a instalação de lixeiras e banheiros químicos pela área das comemorações, serviço de emergência de saúde a postos, segurança, fiscalização e orientação ao público presente no evento de massa. "Quando se usa o espaço público, isso precisa ser gerido pelo poder público", define a decana-adjunta da Escola de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), professora Marilena Winter. Em casos de eventos em espaços privados, a infraestrutura deve ser responsabilidade dos organizadores.

Para o presidente da Comissão de Meio Ambiente da subseção do Paraná da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), José Gustavo de Oliveira Franco, quando bem conduzida, uma festa de carnaval pode ser realizada sem afetar o direito de terceiros. Mas para isso, reforça, há que se dar atenção à organização. A prática deve passar tanto pelo isolamento de áreas com vegetação mais sensível nos logradouros públicos, como pela limpeza imediata dos resíduos após o fim da folia. Isso pode evitar que o lixo seja levado, na próxima chuva, para bueiros e galerias do sistema de esgoto da cidade.

Também é importante divulgar informações sobre como será o carnaval de rua. "As pessoas precisam ser orientadas, até para se organizarem para sair daquela região se não quiserem participar da festa naqueles dias. O que deve prevalecer é a informação", diz Franco.