• Carregando...
 |
| Foto:

Defensoria em números

Em 2011, no primeiro ano de mandato, o governador Beto Richa sancionou a Lei Orgânica da Defensoria Pública do Paraná. Desde então, um concurso para defensor público já foi realizado, mas até agora não houve nomeações. Veja como está a defensoria hoje:

• 10 defensores (ideal seriam 844)

• 1 defensor para cada 768 mil pessoas com renda mensal inferior a três salários mínimos (o ideal seria de um defensor a cada 10 mil pessoas nessa situação)

• 25 mil atendimentos anuais (sociais ou jurídicos)

• Desses 25 mil, 5 mil geram processos judiciais

• 137 assessores de estabelecimento penal

• 25 mil assistidos no sistema carcerário

Fonte: DPE-PR, Anadep e Ipea.

Dativos ajudam, mas custam caro

Na ausência de uma defensoria pública estruturada, resta à população carente recorrer ao trabalho dos advogados dativos, que são nomea­dos pelos juízes para atuar nos casos que a defensoria não consegue cobrir. No Paraná, essa atividade é estruturada por meio de um convênio entre a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR), o Tribunal de Justiça e a Procuradoria do Estado.

Os advogados privados que têm interesse em atuar como dativos são cadastrados pela OAB e nomeados pelo juiz quando necessário. Hoje, estão inscritos 3,72 mil advogados. Desse total, 782 já foram nomeados pelos juízes, alguns mais de uma vez, totalizando mais de 2,8 mil nomeações desde 2010. Esse cadastro é apenas um referencial para os magistrados, que também podem nomear advogados sem consultar a lista.

"Antes [do convênio] a atividade era esparsa, ou seja, o advogado era chamado para fazer apenas um dos atos processuais. Agora, o defensor fica vinculado ao processo trazendo maior segurança e melhor defesa dos interesses dos defendidos", aponta o presidente da Associação Paranaense dos Advogados Criminalistas (Apacrimi), Da­nilo Rodrigues Alves.

Apesar de ser considerado um serviço essencial, os especialistas apontam que o trabalho dos dativos acaba saindo muito mais caro aos cofres estaduais do que o investimento necessário para a estruturação da defensoria pública. "Um defensor atua em média em 80 casos por mês, se fosse cobrar pela tabela do OAB, como é o caso dos dativos, o estado teria de desembolsar quase R$ 100 mil para cada um", explica o coordenador da Associação Nacional dos Defensores Públicos da Região Sul, Rafael Português.

O número de presos no Paraná ultrapassa os 28,3 mil. Desses, 9,7 mil estão em delegacias cumprindo prisão temporária. Em contrapartida, há no estado apenas 10 defensores públicos e outros 137 assessores jurídicos que só podem atuar diretamente nas penitenciárias. Isso significa que cerca de 9,7 mil pessoas presas hoje nas delegacias, se não tiverem condições de pagar um advogado, não têm a quem recorrer, a não ser a esses 10 defensores, lotados apenas em Curitiba.

Um estudo da Associação Nacional dos Defensores Pú­blicos (Anadep) e do Instituto de Pesquisa Aplicada (Ipea) divulgado em março aponta que, levando em consideração a população com renda mensal inferior a três salários mínimos no Paraná, seriam necessários mais 834 profissionais para que o órgão funcionasse adequadamente.

Ao que tudo indica nem esse quadro desolador nem a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que obriga o estado a implantar a defensoria pública em até seis meses devem dar fim a essa novela. A Procuradoria-Geral recorreu da decisão na última sex­ta-feira com a justificativa de que o Paraná ultrapassou o limite prudencial da Lei de Responsabilidade Fiscal com funcionários e, por isso, não possui recursos para estruturar o órgão, que garante assistência judiciária gratuita à população de baixa renda.

Mas há críticas a esse argumento. "Se o MP e o TJ cada vez mais demandam pelo aumento das verbas orçamentárias respectivas, mesmo sendo órgãos razoavelmente estruturados, imagine a DP que está em fase de instalação?", diz a professora da Faculdade de Direito da Universidade Fe­­­­deral do Paraná Priscilla Placha Sá.

Segundo a defensora-pública geral do estado, Josiane Fruet Lupion, há uma expectativa prévia de que apenas 87 profissionais devam ser nomea­dos até setembro. Até lá, a perspectiva é caótica. "Quando o delegado recebe uma prisão em flagrante de alguém carente, tem de informar o defensor em até 24 horas. Recebemos os pedidos, que chegam por e-mail ou correspondência de todo o estado, e o indivíduo continua preso, não há o que fazer", conta.

De acordo com levantamento da defensoria, existem presos provisórios em delegacias que já deveriam ter sido trans­feridos para penitenciárias ou já cumpriram a pena, mas não podem sair porque não têm acesso ao defensor público. "As lesões aos direitos têm impactos reais e visíveis, como a superlotação de presídios", aponta Priscilla.

Outras áreas

Apesar de agrupar a maioria dos atendimentos, não só na área penal a defensoria pública é fundamental para a população. Conforme Josiane, ao lado dos crimes estão os casos de família e, depois, o atendimento de adolescentes infratores e ações cíveis. Mas, sem a estruturação, a instituição não consegue chegar às comunidades afastadas. "Estão nascendo e morrendo crianças sem registro em ilhas no litoral, e a defensoria não consegue chegar lá para dar instruções."

"A defensoria é essencial porque, em um país absolutamente desigual como o nosso, em que há uma faixa muito significativa de pessoas pobres e abaixo da linha da pobreza, é imprescindível que exista uma instituição que possa demandar sobre os seus direitos", avalia a professora Priscilla. "As inúmeras insatisfações populares recentes, reclamando de saúde, educação, melhoria de transporte público, mostram o papel importante da defensoria, que é o de assegurar esses direitos no Judiciário", aponta o coordenador da Anadep na Região Sul, Rafael Português.

O SUS na Justiça

Infelizmente, a falta de atenção aos mais pobres não acontece apenas na esfera estadual. A Defensoria Pública da União (DPU) no estado, que advogada em favor de famílias de baixa renda em causas em que a União é parte, como previdenciário, também sofre com a falta de infraestrutura e de pessoal. Uma visita ao prédio do órgão em Curitiba passa a impressão de um local que está prestes a desabar. A instituição ocupa seis andares de um edifício alugado no Centro da capital, que conta com apenas um elevador sem acesso especial a quem chega de cadeira de rodas.

Justamente o órgão público responsável por propor ações que envolvem pedidos de auxílio-doença contra o INSS, além de demandas por tratamentos de saúde não atendidos pela União, tem funcionários trabalhando em condições precárias. "A necessidade da DPU reflete a falta ou a insuficiência do próprio serviço público", explica o defensor-público chefe, Gustavo de Oliveira Quandt.

A instituição conta com 23 defensores atuando em cinco cidades do Paraná. É mais que o dobro do quadro da defensoria estadual, mas ainda falta cobrir 13 municípios com sede da Justiça Federal no estado.

Apesar da demanda crescente, Quandt avalia que a população ainda não conhece a atuação da DPU de maneira satisfatória. Por isso, um dos projetos desenvolvidos pela instituição no Paraná é a visita mensal aos Centros de Referência de Assistência Social para informar a essas pessoas sobre os direitos que elas têm. "Tentamos descentralizar o atendimento e divulgar informações, mas, trazendo essas pessoas, não sei se teremos condições de atendê-las", avalia.

Há luz no fim do túnel

Dois projetos que tramitam no Congresso Nacional po­­deriam resolver pelo menos alguns dos problemas enfrentados pelas defensorias públicas estaduais e da União. Porém, em âm­bito local, a presidente Dilma Rousseff acabou ve­­tando o projeto que trata da adequação da Lei de Res­ponsabilidade Fiscal à autonomia administrativa, financeira e orçamentá­ria das de­fensorias. A As­sociação Na­­­cional dos Defensores Pú­­­blicos e outras enti­dades vêm lutando para que o Congresso derrube o veto presidencial.

No domínio da União, na semana passada, a Câmara dos Deputados aprovou em primeira discussão o Projeto de Emenda Constitucional que pretende conferir autonomia administrativa, funcional e financeira à DPU. "Em médio prazo, acreditamos que muitos dos problemas serão resolvidos ou amenizados. A autonomia vai conferir mais agilidade administrativa", aponta o defensor-público chefe da DPU em Curitiba, Gustavo de Oliveira Quandt, que é obrigado a ocupar um dos andares do prédio da instituição com lixo. "Para nos desfazermos de um grampeador quebrado é um trabalho hercúleo", diz.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]