Os problemas cotidianos de locação imobiliária usualmente não encontram solução suficiente na lição, dita e repetida nos bancos escolares, que nas relações jurídicas obrigacionais os efeitos vinculariam apenas as partes, ao passo que nas relações jurídicas reais, como v.g. na transmissão da propriedade, ocorreria a expansão eficacial erga omnes.
A Lei 8.245/1991, que trata da locação de imóveis urbanos, indica diversas situações em que se pode atribuir eficácia erga omnes à locação. Uma delas em orientação oposta à fórmula latina “emptio tollit locatio” (a compra e venda rompe a locação).
O que deve predominar no caso de alienação, em hasta pública, de um imóvel previamente locado pela massa falida? A locação ou o direito do adquirente?
Em termos gerais, a Lei de Locações de Imóveis Urbanos permite que, sob certos pressupostos, o contrato de locação prevaleça e se imponha à transmissão imobiliária.
Pedimos atenção do leitor ao texto do art. 8.º da Lei 8.245/91: “Se o imóvel for alienado durante a locação, o adquirente poderá denunciar o contrato, com o prazo de noventa dias para a desocupação, salvo se a locação for por tempo determinado e o contrato contiver cláusula de vigência em caso de alienação e estiver averbado junto à matrícula do imóvel”.
A manutenção da locação e a sua oponibilidade ao adquirente do imóvel ocorrerá sob duas premissas: se o novo proprietário não denunciar, em noventa dias, a relação locatícia e, alternativamente, diante da chamada “cláusula de vigência em caso de alienação”, inserta em contrato adequadamente averbado na matrícula do imóvel.
Mas, no caso de execução judicial, com a aquisição em hasta pública do imóvel, essa eficácia predominaria? A resposta seria a mesma no caso de contratos de locação realizados pela massa falida?
Para a primeira questão, a resposta é afirmativa. O antes citado art. 8.º da Lei 8.245/1991 especifica situações de predomínio da locação em caso de alienação e, não simplesmente, de venda do imóvel.
O termo “alienação” é amplo para abranger os diversos meios pelos quais pode ocorrer a transmissão da propriedade, para além do cumprimento de um contrato de compra e venda. Em rigor técnico, há alienação quando um objeto é entregue em doação, em dação em pagamento, mediante cessão de créditos e noutros meios de transmissão da propriedade. A alienação, portanto, abrangeria também a transferência havida em hasta pública.
Este entendimento também seria aplicável às locações contratadas pela massa falida?
Tomando em conta a longa duração dos processos falimentares e, também, a deterioração dos bens durante este percurso, não é incomum que os síndicos realizem contratos de locação de imóveis da massa falida.
Também é comum que estas locações sejam contratadas por longos períodos, com vultosos investimentos pelo locatário, que pretende ser recompensado pelo tempo de uso, protegido pelas cláusulas de vigência em caso de alienação. A massa falida, por sua vez, além de preservar bens ameaçados pela decrepitude, encontra nessas locações uma importante fonte de recursos que, ao fim e ao cabo, também atenderão os interesses dos credores.
Nestes casos, a resposta não é tão simples. Tratando-se de locações realizadas pela massa falida sob o regime anterior à atual Lei de Falências e Recuperações (Lei n.º 11.101/2005), o contrato de locação deve prevalecer, observados os requisitos do antes citado art. 8.º da Lei 8.245/91.
Considerando a regra de direito intertemporal da Lei em vigor, isto seria aplicável “aos processos de falência ou de concordata ajuizados anteriormente ao início de sua vigência, que serão concluídos nos termos do Decreto-Lei no 7.661, de 21 de junho de 1945”.
A atual Lei de Falências e Recuperações, buscando trazer uma maior proteção aos adquirentes de bens em execuções falimentares, trouxe regra diversa: “Art. 114. O administrador judicial poderá alugar ou celebrar outro contrato referente aos bens da massa falida, com o objetivo de produzir renda para a massa falida, mediante autorização do Comitê. (...) § 2º. O bem objeto da contratação poderá ser alienado a qualquer tempo, independentemente do prazo contratado, rescindindo-se, sem direito a multa, o contrato realizado, salvo se houver anuência do adquirente”.
A aplicação dessa norma não aponta maiores dificuldades para os contratos de locação celebrados sem cláusula de vigência ou, ainda, não averbados na matrícula do imóvel. Nestas hipóteses, o legislador escolheu tutelar o interesse do novo proprietário em detrimento do locatário. Aí, portanto, “emptio tollit locatio”.
O eventual comportamento contraditório do locador, todavia, pode ensejar pretensões indenizatórias, agravada nos casos em que houver desproporção entre o tempo da locação e os investimentos realizados.
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