Com origem sueca, a figura do ombudsman foi criada em 1809 como sendo um órgão de controle parlamentar, atuando essencialmente em prol do público para coibir abusos praticados pela Administração Pública, pelo Poder Judiciário e pelos Militares.
Em linhas gerais, a figura do ombudsman consiste no profissional responsável pelo recebimento de críticas, sugestões e reclamações de usuários e consumidores insatisfeitos com serviços prestados por fornecedores, agindo de maneira imparcial para mediar eventuais conflitos entre as partes, elaborando um parecer fundamentado e direcionado ao caso concreto.
No Brasil, o setor privado mais uma vez saiu na frente, sendo o Grupo Rodhia, em 1981, a primeira empresa privada a criar esse cargo.
Já na esfera pública, a primeira ouvidoria foi criada em Curitiba, no ano de 1986, através do Decreto 215/1986, como resultado da participação da sociedade civil, cujos anseios culminaram, progressivamente, para um novo relacionamento entre o cidadão-usuário de serviços públicos e o próprio Estado.
Embora não haja no ordenamento jurídico brasileiro regulamentação expressa da função pública do ombudsman, verifica-se a evolução de resoluções, decretos e leis esparsas que versam sobre a ouvidoria pública, de acordo com a legislação de cada Estado da Federação.
Assim, enquanto a ouvidoria se preocupa com os consumidores de uma forma coletiva, a atuação do ombudsman é direta e direcionada ao caso concreto, humanizando, portanto, a relação de consumo.
A Associação Brasileira de Ouvidores (ABO), criada em 1995, aprovou em 1997 o seu Código de Ética, expressando valores para nortear a atuação dos Ouvidores/Ombudsman, conscientizando os cidadãos sobre o alcance desta função e as suas obrigações junto à comunidade. Essa regulamentação aumentou a credibilidade dos resultados alcançados pelo ombudsman/ouvidor, na medida em que diminuiu riscos de empresas utilizarem essa função apenas em benefício próprio.
As empresas do setor privado estão ficando cada vez mais atentas às vantagens de contarem com ombudsman em sua estrutura.
Pesquisas realizadas pela USP no ano passado concluíram que a cada 100 consumidores insatisfeitos, apenas 4 manifestam sua opinião ou reclamam. O restante simplesmente não volta mais a contar com os serviços daquela empresa.
As pesquisas revelaram, ainda, que a ausência de eficácia para resolver os conflitos internamente é um reflexo desses dados e um problema para qualquer empresa, diante do aumento do contencioso passivo.
No mesmo sentido, o Banco Central do Brasil também editou uma resolução (n.º 3477/2007) no sentido de que: “Art. 1º - As instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil devem instituir componente organizacional de ouvidoria, com a atribuição de assegurar a estrita observância das normas legais e regulamentares relativas aos direitos do consumidor e de atuar como canal de comunicação entre essas instituições e os clientes e usuários de seus produtos e serviços, inclusive na mediação de conflitos.”
A figura do ombudsman, todavia, é muito mais relevante do que dos serviços de call center ou ouvidorias formadas por profissionais que se limitam a seguir manuais de procedimentos pré-prontos. O ombudsman tem qualificação e foco diferentes do mediador, por exemplo, já que o primeiro é um profissional da própria empresa, e o segundo um terceiro alheio à relação de consumo.
A alta taxa de ações judiciais, envolvendo clientes e todos os tipos de fornecedores de produtos e serviços, dentre eles os bancos, as empresas de telefonia, e até os meios de comunicação, acabaram por sobrecarregar o Poder Judiciário, contribuindo também para a insegurança jurídica no mercado de crédito, quando o assunto é bancário.
Isso porque grande parte da insurgência dos consumidores reside na ausência de compreensão por parte do fornecedor, quanto às críticas recebidas através dos procedimentos internos de ouvidoria como, restrita aos chamados “SAC”, o que acaba desgastando a relação de consumo e a imagem da empresa, além de aumentar seu passivo judicial.
A atuação do ombudsman funciona da seguinte forma: primeiramente, o consumidor preenche um formulário com a reclamação e, caso o atendimento ao cliente não seja suficiente para resolvê-la, encaminha-se o formulário ao ombudsman, e este elabora uma primeira manifestação sobre o caso.
Num segundo momento, o consumidor e o fornecedor apresentam seus argumentos amparados pelos documentos que possuírem. Após uma análise de toda a documentação apresentada, o ombudsman elabora um parecer para solucionar a demanda.
A decisão do ombudsman, dependendo do valor – ou se envolver uma obrigação - pode vincular o fornecedor. Já o consumidor, caso não fique satisfeito, ou se o acordo vier a ser descumprido, pode normalmente acionar o Judiciário e demonstrar sua pretensão.
Assim, enquanto a ouvidoria se preocupa com os consumidores de uma forma coletiva, a atuação do ombudsman é direta e direcionada ao caso concreto, humanizando, portanto, a relação de consumo. Tal procedimento diferenciado evita, ou ao menos, reduz a quantidade de litígios e os valores que as empresas provisionam de seu capital para pagamento de eventuais condenações ou acordos judiciais.
A imparcialidade e a informalidade dos atos do ombudsman permitem maior proximidade entre os envolvidos. Esse tipo de serviço tem reflexo na diminuição de demandas judiciais e no aumento da qualidade do serviço prestado.
Dados do Conselho Nacional de Justiça demonstram que no ano de 2015, as ações envolvendo direito contratual e o código de defesa do consumidor foram os temas mais recorrentes, totalizando 4.866.579 processos, representando 9,57% das ações propostas naquele ano. A posição deste tipo de conflito fica atrás apenas das demandas envolvendo direito trabalhista.
Com a criação e regularização do ombudsman bancário haverá agilização, desburocratização da solução de demandas de menor complexidade, com redução de custos para a empresa.
Claramente, também desafoga o Poder Judiciário, que será chamado a intervir apenas nas situações mais complexas, viabilizando maior qualidade às decisões judiciais.
Diante disso, o desenvolvimento da função do ombudsman, mesmo que dentro da ouvidoria, mostra-se uma alternativa válida como forma de redução de provisionamento e de custo com litígios.
*Priscila Sennes Dias e Thiago de Mello Bahls são advogados em Rücker Curi Advocacia e Consultoria Jurídica