O assalto do século, no Paraguai, tem sob suspeita organizações criminosas brasileiras – PCC e Comando Vermelho. Após o roubo de US$ 40 milhões (cerca de R$ 125 milhões), os criminosos teriam fugido para o Brasil. Mas, se o crime ocorreu no país vizinho, surge o questionamento sobre como a Justiça brasileira pode atuar nesse caso. A jurisdição para investigar e julgar esse delito é do local onde ele ocorreu, mas isso não significa que as autoridades brasileiras devam ficar de braços cruzados. Há definições na legislação do Brasil sobre como agir nessas circunstâncias, o desafio é o controle das fronteiras para investigação de crimes transnacionais.
Se o país de origem solicitar, o Brasil pode, após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), extraditar estrangeiros para que sejam julgados no país onde o crime foi cometido. Mas mandar criminosos brasileiros para serem julgados no Paraguai está descartado caso eles sejam realmente daqui. A Constituição Federal define que nenhum brasileiro nato será extraditado. E os naturalizados só poderão sofrer extradição em caso de crime comum antes da naturalização ou de envolvimento com o tráfico de drogas.
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Por outro lado, o Código Penal prevê, no artigo 7º, que brasileiros que cometerem crimes no exterior fiquem sujeitos à legislação brasileira. O professor de direito penal internacional do Unicuritiba José Carlos Portella Jr. explica que, uma vez que os suspeitos estejam no Brasil, cabe à polícia brasileira fazer sua própria investigação. O que pode ocorrer é uma cooperação jurídica internacional para que os países compartilhem provas. E as autoridades paraguaias só poderão vir ao Brasil com anuência das autoridades brasileiras, que provavelmente deverá acompanhá-las em uma diligência.
E, quando os suspeitos estiverem no Brasil, a definição da competência de quem será responsável pelo caso no Judiciário dependerá de algum fato específico. Um exemplo é que pelo menos nove suspeitos de participação no assalto foram presos no Oeste do Paraná. O advogado especialista em direito penal Daniel Bialski explica que, como a polícia e a Justiça do Paraná foram as primeiras a agir nesse caso, é provável que a jurisdição fique no estado. Ele relembra que a Lava Jato tem a maioria dos casos de primeiro grau enviados para a vara do juiz paranaense Sergio Moro porque foi em Curitiba que as investigações começaram.
Fronteiras
Não bastassem as cifras milionárias, a fronteira é um desafio para a prevenção a e a investigação do assalto. Bialski observa que o fato de Brasil e Paraguai serem membros do Mercosul facilita o trânsito de pessoas entre os dois países. Uma alternativa seria registrar a entrada de cada pessoa que cruza a fronteira, mas isso geraria filas imensas e tornaria o trabalho da imigração muito moroso.
Portella Jr. enfatiza a importância de os países aderirem a legislações internacionais de combate ao crime para evitar a impunidade, como por exemplo a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, também conhecida como Convenção de Palermo. Brasil e Paraguai são signatários desse documento desde 2004. Segundo ele, com legislações semelhantes, fica mais fácil fazer a apuração dos fatos e, caso se chegue a condenações, os criminosos sejam punidos.
Outra convenção internacional de combate ao crime da qual o Brasil é signatário é a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, conhecida como Convenção de Mérida.
“Legalmente, o Brasil está preparado para resolver essas questões. Vai depender de boa investigação feita aqui e se não haverá obstáculos para que as provas venham do Paraguai”, avalia o professor de direito penal internacional.
Conheça a lei
Artigo 5º LI - nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na forma da lei;
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
I - processar e julgar, originariamente:
g) a extradição solicitada por Estado estrangeiro;
Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro:
I - os crimes:
a)contra a vida ou a liberdade do Presidente da República;
b) b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público;
c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço;
d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil;
II - os crimes:
que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir;
a) b) praticados por brasileiro;
c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados.
§ 1º - Nos casos do inciso I, o agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro.
§ 2º - Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições:
a) entrar o agente no território nacional;
b) ser o fato punível também no país em que foi praticado;
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição;
d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena;
e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável.
§ 3º - A lei brasileira aplica-se também ao crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil, se, reunidas as condições previstas no parágrafo anterior: não foi pedida ou foi negada a extradição;
a) b) houve requisição do Ministro da Justiça.
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