O Exame de Ordem, inicialmente previsto no artigo 48, inciso III, da Lei nº 4.215/63 e, desde o advento do atual Estatuto da Advocacia (Lei nº 8.906/1994), presente no seu artigo 8º, vem sendo exigido e aplicado pela Ordem dos Advogados do Brasil como forma de medir a capacidade técnica (teórica e prática) dos bacharéis em Direito que pretendem ingressar na advocacia. Desde então, se avolumaram discussões sobre os diversos aspectos que compõem o Exame, desde a sua formulação até a análise da sua constitucionalidade, gerando intenso debate e mobilizando opiniões de diversos setores do mundo jurídico, onde a imensa maioria defende a sua manutenção.
E porque novamente vem à tona este tema se o STF já bem esclareceu que o Exame de Ordem é constitucional e presta um papel de absoluta relevância para a sociedade brasileira?
Novamente, ao pretender recolocar em discussão a proposta - já rechaçada em outros momentos - de extinção do Exame de Ordem, a Câmara dos Deputados contraria a opinião de juristas de todo o país, da Ordem dos Advogados do Brasil, dos próprios advogados brasileiros e do Poder Judiciário. A tentativa de extinção do Exame de Ordem se mostra verdadeiro atentado contra a sociedade e a tal proposta em nada contribui para a melhora do ensino jurídico no Brasil.
Não interessa a ninguém, muito menos ao legislador, deixar a sociedade desprotegida e permitir que profissionais despreparados para o exercício profissional da advocacia (em alguns casos “formados” em cursos de final de semana) conquistem a capacidade postulatória e a possibilidade de cuidar de interesses e direitos tão importantes para as pessoas. Muitas vezes, as causas que estão sob a responsabilidade do profissional da advocacia versam sobre a própria liberdade e/ou sobre a sua família, não podendo haver espaço para o erro. O advogado exerce uma atividade tão relevante que possui proteção constitucional, pois o “advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei” (Art. 133, da CF/88).
O Exame de Ordem é uma conquista da sociedade brasileira, uma forma de auferir quais os bacharéis possuem condições de exercer a advocacia. De fato, em 2012, o Supremo Tribunal Federal analisou a questão e aniquilou todas as alegações de que o Exame de Ordem pudesse ser inconstitucional ou violar qualquer direito. No julgamento pelo STF do RE 603.583 / RS, da lavra do eminente Relator Ministro Marco Aurélio Mello, bem expôs um dos maiores problemas que se verifica em nosso país que é a proliferação descabida de cursos de Direito, alguns sem qualquer condição de funcionamento.
“No mais, a permissividade com que se consegue abrir os cursos de Direito de baixo custo, porquanto restritos ao “cuspe e giz”, decorrente de uma ideologia fiada no adágio “quanto mais, melhor”, merece severas críticas. Vende-se o sonho e entrega-se o pesadelo: após cinco anos de faculdade, o bacharel se vê incapaz de ser aprovado no exame de conhecimentos mínimos da Ordem, condição imposta para que possa exercer a advocacia e, com esta, prover a própria subsistência. A alegria do momento transmuda-se em drama pessoal. A reflexão sobre essa realidade cabe não só ao Supremo, mas também à sociedade brasileira.”
O Supremo Tribunal Federal, que empossará o paranaense LUIZ EDSON FACHIN no próximo dia 16 de junho, um dos grandes defensores da qualidade do ensino jurídico em nosso país, no julgamento que encerrou a discussão constitucional sobre o tema deixou claro que o Exame de Ordem constitui uma das melhores ferramentas de verificação profissional, reconhecendo que:
“Quando, por outro lado, o risco é suportado pela coletividade, então cabe limitar o acesso à profissão e o respectivo exercício, exatamente em função do interesse coletivo. Daí a cláusula constante da parte final do inciso XIII do artigo 5º da Carta Federal, de ressalva das qualificações legais exigidas pela lei. Ela é a salvaguarda de que as profissões que representam riscos à coletividade serão limitadas, serão exercidas somente por aqueles indivíduos conhecedores da técnica.”
A análise ampla da decisão do Supremo Tribunal Federal deveria servir de norte para que o Congresso Nacional se debruçasse em outros assuntos de relevo, que aguardam pauta e são tão importantes para a sociedade brasileira, não sendo crível que o Exame de Ordem pudesse novamente ocupar a agenda dos parlamentares.
Os ministros do STF, sob a orientação do voto do min. Relator Marco Aurélio, decidiram de forma cristalina que o Exame de Ordem não só é um indispensável mecanismo de avaliação das condições “mínimas” para aqueles que pretendem exercer a advocacia, mas que deveria ser seguido por outras categorias profissionais que exercem função que pode causar risco à sociedade se exercido por pessoas sem qualificação como, por exemplo, os médicos. Os julgadores alertaram que “o equívoco não está nas rígidas exigências para o exercício da advocacia, antes o contrário. Caberia ao legislador impor a obrigatoriedade de exame para o exercício daquela outra nobre atividade, o que estaria em total consonância com o texto constitucional.”
No caso, importante acrescentar que nenhuma outra categoria profissional recebeu tantos integrantes quanto a advocacia, demonstrando que inexiste qualquer possibilidade de reserva de mercado ou de negativa de acesso à profissão, bastando que o bacharel que pretenda exercer a advocacia se qualifique - com estudo e com prática profissional – garantindo as condições “mínimas” de bem exercer a advocacia.
Na detida análise dos números, em menos de cinco anos, somente no Paraná, ingressaram mais de 17.000 novos advogados, o que demonstra que houve significativa aprovação de bacharéis que efetivamente se qualificaram para exercer a profissão e mereceram – pelos seus méritos e estudo – ingressar nos quadros da OAB, evidenciando a importância do Exame de Ordem inclusive para que haja um constante aprimoramento do ensino jurídico.
Veja o número de advogados com menos de 5 cinco anos de inscrição nas subseções do Paraná:
Apucarana:154
Arapongas:155
Araucária: 119
Assis Chateaubriand: 38
Bandeirantes: 54
Campo Largo:147
Campo Mourão: 204
Cascavel: 687
Castro: 60
Cianorte:122
Cornélio Procópio:145
Cruzeiro do Oeste: 14
Curitiba (seccional): 7.890
Dois Vizinhos: 52
Foz do Iguaçu: 515
Francisco Beltrão: 261
Goioerê: 45
Guaíra: 40
Guarapuava: 227
Ibaiti: 40
Iporã: 20
Irati: 54
Ivaiporã: 78
Jacarezinho: 114
Lapa: 39
Laranjeiras do Sul: 54
Loanda: 33
Londrina:1.991
Marechal Cândido Rondon: 77
Maringá: 1.450
Medianeira:113
Nova Esperança: 57
Palmas: 44
Palotina: 26
Paranaguá:178
Paranavaí:142
Pato Branco:179
Pitanga: 45
Ponta Grossa: 640
Prudentópolis: 36
Rio Negro: 69
Santo Antônio da Platina: 83
São José dos Pinhais:365
Telêmaco Borba: 75
Toledo:124
Umuarama: 204
União da Vitória:150
Wenceslau Braz:47
Tota:l17.456
Fonte: OAB-PR
O Exame de Ordem pode e deve ser constantemente aperfeiçoado para propiciar a boa e eficiente avaliação dos bacharéis que desejam exercer a nobre função da advocacia, o que jamais poderá ser confundido com a sua extinção, pois como bem analisou o STF o “exame da Ordem serve perfeitamente ao propósito de avaliar se estão presentes as condições mínimas para o exercício escorreito da advocacia, almejando-se sempre oferecer à coletividade profissionais razoavelmente capacitados.”
A defesa do Exame de Ordem é uma missão de toda a sociedade brasileira na busca da valorização dos bons profissionais, dos professores, das instituições de ensino de qualidade e da própria advocacia. Na sociedade moderna, onde os processos são eletrônicos, as demandas são urgentes e a cada dia mais complexas, a dinâmica da vida contemporânea enseja que a cada dia os profissionais da advocacia sejam mais preparados, mais especializados e possam dar a resposta que a sociedade espera, buscando sempre uma justiça mais rápida e eficiente, razão pela qual o ingresso dos profissionais que desejam exercer a advocacia não pode prescindir do Exame de Ordem.
*José Augusto Araújo de Noronha: advogado e presidente da Caixa de Assistência dos Advogados do Paraná
** As opiniões expressas nas colunas apresentam o ponto de vista de seus autores e não refletem o posicionamento do caderno Justiça & Direito, nem do jornal Gazeta do Povo.
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