Presidente da comissão de juristas que elaborou o novo Código de Processo Civil, em vigor desde a última sexta-feira (18), o ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF) aposta que o novo Código vai reduzir o excesso de formalidades no processo. Apesar de todas as dúvidas relacionadas à nova legislação, o ministro considera que houve tempo suficiente para que as pessoas que precisam lidar com a nova lei se preparassem. Fux veio a Curitiba para dar uma palestra a estudantes da Unibrasil sobre o novo CPC, e conversou com o Justiça & Direito.
Durante a entrevista, o ministro se mostrou incomodado em comentar o atual momento político pelo qual o país passa. Ele diz não querer fazer um juízo antecipado de casos que possa ter que vir a julgar. Sobre as críticas de Lula ao Supremo, que disse que a corte estaria “acovardada”, Fux comentou rapidamente e afirmou que são um fato passado e não cabe mais ao STF se pronunciar sobre isso.
Questionado sobre a recente posse de sua filha no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), ele também evitou o assunto, e disse que críticas de que ela teria sido favorecida por ter um pai ministro são “leviandades”.
O que muda com a chegada do novo código na avaliação do senhor?
Hoje [sexta-feira, 18] é um dia muito importante para a Justiça brasileira, porque o novo Código de Processo Civil tem um compromisso muito importante na celeridade da prestação da Justiça. Então ele muda o aspecto do excesso de formalidades do processo – que é o instrumento pelo qual o cidadão pede justiça, e o Estado presta justiça. Ele elimina essa prodigalidade do sistema judicial brasileiro que é muito recheado de recursos. E as pessoas, através destes recursos, delongam a prestação da Justiça e finalmente nós trazemos um instrumento novo para resolver de maneira mais ampla possível esse denominado contexto de massa. Por exemplo, há 800 mil ações iguais de recurso que veiculam a mesma tese jurídica, e esse novo Código vai permitir, através de um método criado – que é o incidente de resolução de demandas repetitivas, que uma vez decidido o incidente, esta tese jurídica fica resolvida em 800 mil ações.
O CPC já passou por mudanças no Congresso antes mesmo de entra em vigor. Essas mudanças alteram o impacto previsto quando essa lei foi criada?
Não. Na verdade, antes da entrada em vigor, houve um estudo sobre a capacidade funcional dos tribunais de assimilarem os novos instrumentos. Então, verificou-se que isso geraria muitas despesas, como a contratação de muito pessoal em uma época em que o país está passando por extremas dificuldades no âmbito econômico. Nós resolvemos, então, voltar ao regime anterior só em algumas partes dos recursos dirigidos aos tribunais superiores. Porque, na verdade, estabelecemos no início que os recursos não seriam mais interpostos no juízo de origem para o tribunal. Entendemos que os recursos deveriam ser interpostos diretamente do tribunal. Só que, quando um recurso é interposto, ele tem que passar por um exame da sua admissibilidade e, para que o tribunal superior faça isso, é preciso ter um corpo funcional maior e mais órgãos. Isso tudo geraria uma despesa incompatível com o momento econômico.
A ordem cronológica vai funcionar de fato?
A ideia é essa. A partir do momento que o Código promete uma duração razoável, nada mais lógico de dizer ao juiz que ele tem que julgar primeiro os processos mais antigos. Isto é uma norma de procedimento que vai ser aplicada dentro do possível, porque o juiz deve dar preferências aos processos mais antigos, mas pode ocorrer que ingresse em juízo um habeas corpus, um mandato de segurança – uma ação que tenha que ser julgada mais rapidamente. Por isso é que o Código teve uma pequena reforma no sentido de que o juiz tem que julgar preferencialmente os processos obedecendo à ordem cronológica de remessa dos autos para o juiz decidir. Por exemplo, o juiz tem uma pilha de processos. Qual foi primeiro processo que chegou para a decisão? Este? Então este vai ser o primeiro a ser decidido. Só que no meio disso pode surgir (em uma situação hipotética) algo como, por exemplo: então entrou agora aqui uma liminar urgente que precisa ser decidida. Então até por uma questão de lógica, o juiz vai ter que decidir primeiro a questão urgente, depois voltar à questão cronológica.
Ministro, o novo CPC entrou em vigor hoje e em uma notícia constava que o STJ estava trabalhando hoje com os prazos da antiga norma. Está correto?
Está absolutamente certo, porque só se aplica o CPC aos recursos interpostos a partir da sua vigência e não aos recursos anteriores. O recurso que foi interposto antes segue o regime anterior.
Houve por parte dos juristas uma grande ansiedade com o novo CPC. E o novo Código entra em vigor justamente em um momento de convulsão social no país, em que há uma série de processos inclusive chegando ao STF. Esse momento de alguma forma interfere na entrada em vigor do CPC, na aplicação que ele vai ter?
Não interfere, porque como em toda a nova legislação com essa densidade normativa, como é o Código de Processo Civil que tem mil e tantos artigos, a entrada em vigor dele é antecedida de um prazo de pré-aviso – que a gente chama de Vacatio Legis – muito grande. Então, as pessoas tiveram um ano para se preparar para entrada em vigor do novo Código, de modo que não pegou ninguém de surpresa. Já foram escritos muitos livros, já foram realizados inúmeros seminários, de tal maneira que hoje é algo que efetivamente vai se submeter a uma experimentação.
Como o senhor recebeu as críticas que o ex-presidente Lula fez ao STF, ao dizer que a corte estaria “acovardada”?
A única coisa que eu tenho para dizer é o seguinte: o ministro Celso de Mello se pronunciou refletindo o sentimento da corte, basicamente isso.
Na carta aberta que o presidente Lula divulgou diz “acreditar nas instituições e nas pessoas que as encarnam” e por “respeito à instituição do Judiciário”. Este tipo de declaração ameniza o que ele disse sobre a covardia do STF?
Nisso eu, sinceramente, não posso responder pela corte ou por mim, porque eu acho que isso é um fato passado. A corte se pronunciou num momento que isso se insurgiu contra ela. Agora, essa manifestação posterior [de Lula] foi uma manifestação voluntária e que o Supremo, sobre ela, não deve se manifestar.
O STF já definiu o rito de impeachment (agora o processo está no Congresso), mas o Supremo pode ainda de alguma forma ter uma posição determinante ou influenciar o processo de impeachment?
O rito em si já está estabelecido. O que pode haver no curso do procedimento, é surgir questões judicializáveis. No curso do processo podem surgir outras questões juducializáveis. Por exemplo, se surgir uma violação da regra da votação, mas quanto ao rito, não.
Não corre o risco de o Supremo ter que dar a palavra final?
A Constituição garante o acesso à Justiça. Mas existe um espaço de reserva política. Como os poderes são independentes, há coisas que são da competência do Parlamento e há coisas que são da competência do Judiciário. O judiciário não pode resolver tudo.
Sua filha tornou-se recentemente desembargadora do TJ-RJ. Houve críticas, como o fato de ela ter pouca experiência para o cargo, e que teria sido indicada e aprovada por ser sua filha. Como o senhor recebe essas críticas?
Eu não toco neste assunto, porque ele foi cercado de muitas leviandades. Não dá pra discutir leviandade.
Colaborou: Beatriz Peccin
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