A maioria da população brasileira é contrária à legalização das drogas e rejeita a ideia defendida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Roberto Barroso de que essa seria uma alternativa para combater o tráfico e a superlotação dos presídios. Uma pesquisa exclusiva feita pelo Paraná Pesquisas para a Gazeta do Povo mostra que 70,9% da população é contra a legalização da maconha e 84,3% contra a da cocaína.
INFOGRÁFICO: Veja os números do levantamento do Paraná Pesquisas sobre as drogas.
Em fevereiro, diante da crise no sistema carcerário, com mortes em presídios do Amazonas e de Roraima, Barroso defendeu que a legalização das drogas seria um caminho para conter o tráfico e reduzir a população carcerária. “A primeira etapa, ao meu ver, deve ser a descriminalização da maconha. Mas não é descriminalizar o consumo pessoal, é mais profundo do que isso. A gente deve legalizar a maconha. Produção, distribuição e consumo. Tratar como se trata o cigarro, uma atividade comercial. Ou seja: paga imposto, tem regulação, não pode fazer publicidade, tem contrapropaganda, tem controle”, disse o ministro.
Para Barroso, a legalização quebraria o poder o tráfico, pois seria a ilegalidade que dá poder aos traficantes. O ministro do STF defendeu que, em prazo maior, até a cocaína possa ser legalizada: “E, se der certo com a maconha, aí eu acho que deve passar para a cocaína e quebrar o tráfico mesmo.”
Mas a proposta de Barroso não está em consonância com o que a população brasileira pensa sobre o assunto. Em todas as regiões do país, faixas etárias e níveis de instrução prevalecem os que são contra à legalização das drogas.
O levantamento feito com 2.020 pessoas em todos os estados do Brasil e no Distrito Federal aponta, porém, a Região Sul como a que tem a população que mais concorda com a legalização das drogas. Nessa região, 29% dos entrevistados são a favor no caso da maconha – e 72,8% contra –; para a cocaína são 13,5% a favor – e 78,1% contra. As regiões Norte e Centro-Oeste são as que têm população que mais discorda da proposta, com 72,8% contra legalização da maconha, e 87,3% à da cocaína.
Na análise a partir da faixa etária, as pessoas de meia idade – entre 35 e 44 anos – são as que se mostram mais contrárias à legalização, com 78,3% de rejeição à proposta no caso da maconha. Entre os jovens de 16 a 24 anos, a resistência é a menor: 57,7% são contra a legalização e 39,8% favoráveis.
A pesquisa também aponta que, quanto maior o nível de instrução, mais as pessoas tendem a ser favoráveis à legalização das drogas. Mesmo assim, em todos os níveis de formação, o índice maior é o de pessoas contrárias à proposta de Barroso. 74,1% das pessoas com formação até o ensino fundamental rejeitam a sugestão do ministro. Entre os que têm curso superior, essa discordância cai para 63,6%.
Entre mulheres e homens há uma pequena variação no índice de aprovação da ideia. Entre os homens, 68,3% discordam da legalização; enquanto as mulheres chegam a 73,4% contra. A população economicamente ativa também é mais resistente (71,6%); e a menos ativa tem 69,4% contra.
Medo do desconhecido
Para o jurista Luiz Flávio Gomes, o alto índice de rejeição à legalização das drogas reflete o medo da população em relação ao assunto. Ele observa que as experiências com a medida, como as de alguns estados dos Estados Unidos e do Uruguai, ainda são muito recentes e é preciso aguardar para ver qual resultado terão. “Enquanto não se mostra como uma alternativa concreta, a população morre de medo de que as coisas piorem. Nem todo mundo rejeita a proposta por razões moralistas, alguns o fazem por desconhecerem [o que pode acontecer]”, analisa Gomes.
O penalista Cezar Bitencourt defende que qualquer mudança na legislação sobre drogas deve ser feita gradualmente e ressalta que o debate deve ocorrer em nível internacional. Ele é contra a legalização das drogas para que se tornem atividade comercial. “Isso quebraria o país, seria uma ilha de legalização no meio da América Latina. Na Holanda isso foi um fracasso.” Na opinião dele, o que precisa ser debatida é a descriminalização do consumo da maconha.
O advogado também defende um trabalho das autoridades para se distinguir usuários de pequenos traficantes, pois a confusão entre os dois seria um dos motivos para a superlotação dos presídios.
No STF
Uma ação que discute a descriminalização do porte da maconha para consumo próprio tramita no STF sob a relatoria do ministro Gilmar Mendes. Até agora, três votos foram favoráveis à mudança: o do relator e os dos ministros Luiz Roberto Barroso e Edson Fachin. A votação foi interrompida em setembro de 2015 quando o ministro Teori Zavascki pediu vista. Como ele não devolveu o processo, seu substituto Alexandre de Moraes é que deve reencaminhar o processo para análise do plenário do Supremo.
Atualmente, o artigo 28 da Lei 11.343/2006, chamada de Nova Lei de Drogas, prevê sansões administrativas para quem estiver portando drogas para uso pessoal, como advertência, prestação de serviços à comunidade ou comparecimento a programa ou curso educativo. Em seu voto, Mendes propôs a extinção dessas sanções para quem estiver portando drogas, o que faria com que o porte deixe de ser crime.