O corte de quase 30% no orçamento de custeio da Justiça do Trabalho levou a Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra) a ajuizar uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF). De acordo com a associação, as reduções orçamentárias são maiores que as de outros órgãos, e seriam uma forma de retaliação ao trabalho desenvolvido neste ramo do Judiciário.
“Justiça do Trabalho é caça-níquel”, diz Barros
O Deputado Ricardo Barros argumenta que o porcentual do corte no orçamento da Justiça do Trabalho foi fruto de um acordo com representantes da Justiça do Trabalho, incluindo os presidentes da Anamatra e do Coleprecor – a proposta do relatório inicial era de que o corte do orçamento de custeio fosse de 50%. No acordo, que manteve o corte dessa verba em cerca de 24%, ficou combinado que, após a posse do novo presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Ives Gandra Martins Filho, parlamentares e representantes da Justiça do Trabalho se reuniriam para discutir alterações na legislação trabalhista (veja o box abaixo).
Barros diz ainda que o corte total de recursos para a Justiça do Trabalho ficou em cerca de 5,5% - mas para os representantes da Justiça do Trabalho o que compromete seus serviços mesmo é o corte das verbas para custeio. O deputado argumenta que o ramo do Judiciário que se dedica às causas trabalhistas totaliza hoje 50 mil servidores em todo o país, o que acabaria por comprometer grande parte do orçamento.
“A Justiça do Trabalho é um caça-níquel onde as pessoas [que ajuizam ação] jogam sem comprar ficha. Se não ganham,também não perdem”, critica o deputado. Mas ele diz que suas críticas não são para a atuação da Justiça, mas para a lei, que é de 1943.
Barros ressalta que, na época em que a CLT foi criada, a maioria das pessoas eram analfabetas. “Hoje, pessoas graduadas, pós-graduadas não podem ser tratadas do mesmo modo, como hipossuficientes.”
Sobre as críticas de que seu procedimento ao relatar o orçamento teria sido antidemocrático, o deputado diz que o relatório foi aprovado por unanimidade. “Não sou o dono do Congresso, não tem nada de antidemocrático. O que foi proposto foi negociado. Eu queria cortar ”, argumenta.
A ADI 5468, apresentada pela Anamatra, aponta que o corte das dotações para custeio foi de 20% ou, na prática, 29%, por ter incluído despesas obrigatórias como auxílio-moradia, auxílio-saúde e auxílio-alimentação. A média de cortes para outras áreas do Legislativo e o Judiciário, segundo a ação da Anamatra, ficou em 15%.
O relator do orçamento, deputado Ricardo Barros (PP-PR), apresentou entre os argumentos para os cortes o excesso de litigância com assuntos trabalhistas. “As regras atuais estimulam a judicialização dos conflitos trabalhistas, na medida em que são extremamente condescendentes com o trabalhador”, diz o relatório.
O texto afirma ainda que um dos objetivos dos cortes é promover mudanças na legislação trabalhista. “Tais medidas implicam alterações na legislação, mas é preciso que seja dado início a esse debate imediatamente”, diz Barros no documento. “Nesse sentido, estamos propondo cancelamentos de despesas de maneira substancial, com forma de estimular uma reflexão sobre a necessidade e urgência de tais mudanças.”, acrescenta o deputado.
Para o presidente da Anamatra, Germano Siqueira, Barros “usou a máquina legislativa para interferir no Judiciário”. Segundo ele, a ação apresentada ao STF tem o objetivo de discutir o abuso de poder e o desvio de finalidade o orçamento proposto do deputado aprovada pelo Congresso.
“Isso não existe em matéria democrática. Em qualquer país democrático, isso não seria menos que um escândalo: um deputado achar que pode sufocar um poder porque acha que ele julga bem ou mal”, critica Siqueira.
Alterações propostas
Confira as mudanças na legislação trabalhista que o deputado Ricardo Barros pretende debater com a magistratura do trabalho:
Sucumbência proporcional;
- Justiça gratuita só com assistência sindical;
- Proibição de honorários por fora;
- Limite de indenização de 12 vezes o último salário;
- Não comparecimento do empregador não representará a perda do processo;
- Em caso de não comparecimento, o empregado não pode reapresentar ação e pagará sucumbência, igual aos empregadores;
- Venda de causa proibida. O depósito deve ser feito em conta no nome do interessado, sem procuradores;
- Acordo no sindicato valerá como quitação;
- Arbitragem e mediação com quitação;
- Honorários periciais pagos pelo empregado em caso de não vencer a ação;
- Condenação por litigância de má fé proporcional ao que pediu;
- Custas mais altas para empregados e patrões;
- Condenação por conluio entre advogado e a parte;
Impacto
A verba de custeio é o que faz a máquina funcionar, como explica Lourival Ferreira dos Santos, presidente do Colégio de Presidentes e Corregedores dos Tribunais Regionais do Trabalho (Coleprecor). Desse montante saem recursos para o pagamento, por exemplo, de aluguéis, terceirizados e energia.
Santos ressalta que, com a crise econômica, a demanda da Justiça do Trabalho aumenta ainda mais. “O trabalhador perde seu patrimônio maior, que é o emprego, e temos que responder a essa expectativa”, adverte o presidente do Coleprecor.
O processo judicial eletrônico também estaria em risco, segundo os presidentes das duas associações, já que o corte para tecnologia da informação chega a 79%. “Daqui a pouco vamos ter que voltar para o papel”, lamenta Siqueira.
Readequação
Com a ADI, a Anamatra requer que o STF declara inconstitucional a proposta orçamentária para 2016 e mantenha 100% das verbas inicialmente previstas para esse ramo do Judiciário.
O presidente da Anamatra espera que, se a decisão do STF for favorável, o Executivo faça as adequações orçamentárias cumprindo a ordem judicial.
O relator da ação é o ministro Luiz Fux.
Confira a nota pública do Coleprecor sobre o corte no orçamento da Justiça do Trabalho.
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