O ministro do STF Ricardo Lewandowski, que presidiu a sessão de julgamento, alertou os senadores ao dizer que tema era controvertido, mas disse que a decisão era deles.| Foto: Pedro França/Agência Senado

A decisão de votar no Senado separadamente a cassação do mandato de presidente e a perda dos direitos políticos de Dilma Rousseff pegou a todos de surpresa. Isso porque a própria Constituição Federal prevê no art. 52, parágrafo único, a condenação (...) à perda do cargo, “com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis”.

CARREGANDO :)

Os senadores se apoiaram na Lei do Impeachment, de 1950, que dispõe no art. 33 que, no caso de condenação, “o Senado (...) fixará o prazo de inabilitação do condenado para o exercício de qualquer função pública”. A interpretação dos senadores a esse dispositivo legal foi a de que eles poderiam votar se caberia a pena da inabilitação ou não.

Publicidade

Essa forma de realizar o julgamento é nova, por isso poderá ensejar discussão no Supremo Tribunal Federal (STF), mas os juristas consultados pela reportagem afirmaram que, a princípio, não há problemas na forma escolhida. “O tema é altamente controvertido. Tendo a dizer que sim [que a forma escolhida foi válida]. A lei do impeachment fazia essa diferença [das penas] e a Constituição Federal alterou apenas o prazo de inabilitação, que passou de cinco para oito anos”, explica o advogado e professor de Direito Eleitoral Luiz Fernando Pereira.

O advogado e professor de Direito Constitucional e Direito Processual Penal, Nourmírio Bittencourt Tesseroli Filho segue essa mesma linha: “O presidente do STF não poderia interferir nisso [na escolha dos senadores]. A Lei do Impeachment dá essa alternativa. Primeiro faz a votação pela perda do mandato e depois pela inabilitação a cargos públicos”.

Questionamento

Pereira explica que os senadores que se sintam lesados com a decisão podem impetrar um mandado de segurança no STF. “Qualquer senador pode questionar a cisão da votação. E já há quem defenda que não se possa cindir. O próprio ministro [presidente do Supremo, que presidiu a sessão de julgamento] Ricardo Lewandowski disse que o tema é controvertido”, explica.

Caso o STF não reveja essa decisão, ao contrário do senador Fernando Collor de Mello, que ficou inabilitado por 8 anos para exercer qualquer função pública após sofrer o impeachment como presidente da República em 1992, Dilma Rousseff poderá exercer qualquer cargo público, inclusive se eleger nas eleições de 2018, porque a Lei da Ficha Limpa não se aplica a presidentes. Ela só não poderá concorrer à Presidência da República nas eleições de 2018 porque, se ganhar, seria seu terceiro mandato consecutivo, o que é vedado pela Constituição Federal.

Foro privilegiado

Outra dúvida que cerca a decisão desta quarta-feira é se Dilma terá ou não foro privilegiado. Por ter perdido o mandato como presidente, ela passa a responder possíveis acusações por crimes comuns como todo cidadão, ou seja, no primeiro grau de jurisdição. Agora, se ela vier a ocupar um cargo que possua foro privilegiado, ela automaticamente passa a ter direito a ser julgada por um órgão colegiado – depende de qual cargo ou função ela passe a exercer.

Publicidade

O que diz a lei

Constituição Federal

Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:

I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles;

Parágrafo único. Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis.

Lei do Impeachment Lei 1.079/50

Publicidade

Art. 2º Os crimes definidos nesta lei, ainda quando simplesmente tentados, são passíveis da pena de perda do cargo, com inabilitação, até cinco anos, para o exercício de qualquer função pública, imposta pelo Senado Federal nos processos contra o Presidente da República ou Ministros de Estado, contra os Ministros do Supremo Tribunal Federal ou contra o Procurador Geral da República.

Art. 33. No caso de condenação, o Senado por iniciativa do presidente fixará o prazo de inabilitação do condenado para o exercício de qualquer função pública; e no caso de haver crime comum deliberará ainda sobre se o Presidente o deverá submeter à justiça ordinária, independentemente da ação de qualquer interessado.