Renan Calheiros e Lula apostam em plebiscito como alternativa.| Foto: Andressa Anholete/AFP

Diante da dificuldade para aprovar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que determine a realização de novas eleições, o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva e o presidente do Senado, Renan Calheiros, cogitam a realização de um plebiscito para a aprovação de um novo pleito presidencial. A ideia teria sido debatida em uma reunião realizada entre os dois na última terça-feira (26). O plebiscito poderia ser realizado nas eleições de outubro deste ano e as novas eleições ficariam para 2017. Mas a ideia está longe de ser uma via simples, pode aumentar o caos institucional e, para alguns juristas, desrespeita a Constituição.

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Por mais que seja identificado como forte indício de democracia, o plebiscito não tem o poder de cancelar direitos constitucionais ou alterar a constituição. Além disso, essa possibilidade também precisaria passar pelo crivo do Congresso Nacional e, ainda que não demande um quórum tão grande para aprovação, essa também não é uma tarefa fácil no atual contexto.

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Paulo Schier, professor de direito constitucional da Unibrasil, aponta o plebiscito como “um dos mecanismos mais claros de democracia, participação popular e manifestação direta do povo”. Para ele, “é muito complicado defender que plebiscito não é algo democrático”.

O ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) Vladimir Passos de Freitas considera que a Constituição permite a realização do plebiscito. Mas alerta que, neste caso, está “implícito desejo de criar nova situação de anormalidade”.

Segundo os dois juristas, a possibilidade de realização desse tipo de consulta popular está longe de ser uma solução que contribua para a ordem institucional ou que esteja livre de questionamentos jurídicos.

O artigo 14 da Constituição Federal estabelece que a soberania popular será estabelecida por meio do sufrágio universal e pelo voto direto e secreto e também por plebiscito, referendo ou ação popular. Mas, também de acordo com o texto constitucional, no artigo 49, é competência exclusiva do Congresso Nacional fazer a convocação de plebiscito. Aí estaria o primeiro desafio do governo.

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Ainda assim, a aprovação do plebiscito seria mais fácil que a de uma PEC. Para o plebiscito basta aprovação por maioria simples nas duas casas do Congresso. A PEC, por sua vez, precisa de aprovação com três quintos dos votos, em dois turnos, em cada uma das casas.

Mas mesmo precisando de menos votos, esse não é um contexto confortável para o governo.

“O governo só tem 127 deputados a seu favor. Não conseguiu ter um terço na Câmara para barrar o impeachment”, observa o jurista Ives Gandra Martins

PEC não fica descartada

Schier explica que, ainda que seja realizado um plebiscito e a população se manifeste majoritariamente favorável a novas eleições, a votação serviria apenas para dar autorização prévia ao Congresso para que a Emenda sobre novas eleições fosse votada.

A Constituição não prevê aprovação de emenda constitucional por meio de plebiscito. As emendas, segundo o artigo 60, só podem ser propostas mediante proposta de, no mínimo, um terço dos membros da Câmara ou do Senado; ou pelo presidente da República; ou por mais da metade das Assembleias Legislativas.

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O processo de aprovação do plesbicito no Congresso dá origem a uma lei ordinária [abaixo da Constituição]. “Essa lei não dá o texto constitucional, mas delega ao Congresso fazer a PEC”, explica Gandra Martins.

Trâmite

Caso chegasse a ser votado, um plebiscito não se resumiria à sentença “Você é a favor de novas eleições?”. Schier explica que seria necessário apresentar um texto provisório à população, resumindo as condições do processo. Isso já geraria um amplo debate no Congresso. Além disso, a discussão sobre a data de realização das novas eleições, a transição de governo e outros detalhes que poderiam ser questionados levariam o debate a se arrastar no Congresso.

A possibilidade de judicialização dos diversos detalhes também é grande. “Haveria uma enxurrada de ações”, aposta o professor da Unibrasil, que considera que a alternativa até poderia resolver crise de governabilidade, mas “institucionalmente geraria um caos”.

“Vai haver uma reação muito grande dos que se sentirão prejudicados, especialmente porque essa medida tem a intenção de afastar o vice-presidente”, avalia Freitas.

Constitucionalidade

Para Gandra Martins, a realização do plebiscito é, não só inviável politicamente, mas também inconstitucional. A insistência na realização de novas eleições e o surgimento da alternativa do plebiscito é considerada pelo advogado como “espernear dos derrotados”. Ele considera que a inconstitucionalidade estaria no fato de que a realização de novas eleições iria contra o que está previsto no inciso 36 do artigo 5º: “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.

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Para ele, no caso de eleições gerais, todos os outros eleitos poderiam reclamar seu direito adquirido de permanecer em seus cargos até 2018. E, no caso de novas eleições presidenciais, o vice-presidente Michel Temer, que também foi eleito pelo voto popular, poderia reclamar seu direito adquirido de assumir a presidência e nela permanecer até o fim do mandato.

A proposta contrariaria ainda o artigo 60, parágrafo 4º, do texto constitucional que define que o “Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir o voto direto, secreto, universal e periódico”.