Um dos temas que vêm chamando atenção na reforma trabalhista é a possibilidade de se fixar via acordo coletivo uma jornada de 12 horas de trabalho. Se à primeira vista a proposta assusta, especialistas em direito do trabalho explicam que a medida não é tão novidade assim. Na prática, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) já prevê essa possibilidade e essa prática já é rotina em algumas profissões. A mudança que pode ocorrer é que esse tipo de jornada passe a ser adotado em mais áreas de atuação.
Atualmente, profissionais de áreas como saúde e segurança trabalham doze horas em escalas, como por exemplo, 12 por 36. O que o que o projeto de lei proposto pelo presidente Michel Temer traz é a alternativa de que outras profissões também distribuam a carga horária de maneira a se trabalhar mais em alguns dias e menos - ou folgar - em outros.
A CLT prevê que o limite de oito horas diárias de trabalho pode ser extrapolado diante de necessidade imperiosa ou para conclusão de serviços inadiáveis e que “o trabalho não poderá exceder de 12 (doze) horas, desde que a lei não fixe expressamente outro limite”.
Série
O Justiça & Direito está fazendo uma série de reportagens sobre os principais itens da reforma trabalhista. Leia o que já publicamos sobre férias. A próxima a matéria será sobre banco de horas .
O projeto de lei do governo prevê é um limite de 220 (duzentos e vinte) horas mensais de trabalho que pode ser cumprido conforme for definido em acordo. Para quem trabalha de segunda a sexta-feira, isso dá uma média de 10 horas por dia. O limite semanal seria de 48 horas. Ou seja, quando o trabalhador chegar a essa quantidade, terá de parar de trabalhar naquela semana.
Para o advogado trabalhista Wagner Gusmão, essa relativização da carga horária não traz muita novidade. “Já é algo que se pratica, isso já existe e está posto na Súmula 85 do Tribunal Superior do Trabalho (TST)”, explica Gusmão, que também é professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Faculdade Estácio de Sá.
José Lúcio Glomb, advogado trabalhista e ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no Paraná (OAB-PR), considera que a flexibilidade no cumprimento das horas extras “atende perfeitamente a situação atual”.
O PL também prevê que “as horas suplementares da jornada de trabalho normal poderão ser compensadas diretamente até a semana imediatamente posterior à da sua execução”. Se isso não ocorrer, elas devem ser pagas na folha de pagamento do mês subsequente.
Crítica
Izabela Rücker Curi, que advoga para o setor empresarial, avalia que a necessidade de compensação em uma semana acaba inviabilizando a flexibilização. “Nunca é na mesma semana que se vai poder compensar. Se há o limitador de compensar na mesma semana, essa é uma medida que vai cair no vazio”, diz a advogada. Ela explica que empresas que trabalham com picos sazonais muitas vezes precisam que os funcionários façam horas extras por diversos dias ou até semanas seguidos.
Nasser Ahmad Allan, advogado da Central Única dos Trabalhadores (CUT) do Paraná e doutor em direito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), critica as mudanças em sentido oposto. Na opinião dele, “trabalhar 12 horas em um dia é sobre-humano e parece ser excessivo”. Ele também afirma que o artigo 59 da CLT, que limita as horas suplementares a 10, já é suficiente.
Allan também ressalta que o projeto de lei apresentado pelo governo cita o limite de 220 horas mensais, mas não é explícito em relação ao limite de 48 horas semanais.
Veja a proposta de alteração
Art. 611-A - A Convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho tem força de lei quando dispuser sobre:
[...]
II- Pactuar a forma de cumprimento da jornada de trabalho, limitada a 220 (duzentos e vinte) horas mensais;
Conheça a lei atual
Art. 59 - A duração normal do trabalho poderá ser acrescida de horas suplementares, em número não excedente de 2 (duas), mediante acordo escrito entre empregador e empregado, ou mediante contrato coletivo de trabalho.
Art. 61 - Ocorrendo necessidade imperiosa, poderá a duração do trabalho exceder do limite legal ou convencionado, seja para fazer face a motivo de força maior, seja para atender à realização ou conclusão de serviços inadiáveis ou cuja inexecução possa acarretar prejuízo manifesto.
§ 1º - O excesso, nos casos deste artigo, poderá ser exigido independentemente de acordo ou contrato coletivo e deverá ser comunicado, dentro de 10 (dez) dias, à autoridade competente em matéria de trabalho, ou, antes desse prazo, justificado no momento da fiscalização sem prejuízo dessa comunicação.
§ 2º - Nos casos de excesso de horário por motivo de força maior, a remuneração da hora excedente não será inferior à da hora normal. Nos demais casos de excesso previstos neste artigo, a remuneração será, pelo menos, 25% (vinte e cinco por cento) superior à da hora normal, e o trabalho não poderá exceder de 12 (doze) horas, desde que a lei não fixe expressamente outro limite.
§ 3º - Sempre que ocorrer interrupção do trabalho, resultante de causas acidentais, ou de força maior, que determinem a impossibilidade de sua realização, a duração do trabalho poderá ser prorrogada pelo tempo necessário até o máximo de 2 (duas) horas, durante o número de dias indispensáveis à recuperação do tempo perdido, desde que não exceda de 10 (dez) horas diárias, em período não superior a 45 (quarenta e cinco) dias por ano, sujeita essa recuperação à prévia autorização da autoridade competente.