Cidade dos EUA abre processo contra Petrobras e Graça Foster e 15 bancos
O município de Providence, capital do Estado americano de Rhode Island, entrou na véspera de Natal com um processo contra a Petrobras, sua administração, duas subsidiárias e bancos envolvidos na emissão de papéis da companhia. A notícia chega depois de a empresa ter sido alvo de outras três ações nos Estados Unidos em dezembro, movidas por fundos e grupos de investidores individuais. A ação inclui 13 executivos da administração, duas subsidiárias no exterior e 15 bancos envolvidos na emissão de papéis da companhia. Aparecem como réus a presidente da empresa, Graça Foster, e o diretor financeiro Almir Barbassa, de acordo com cópia do documento de 70 páginas.
Parte das empreiteiras envolvidas no escândalo da Petrobras deverá ser julgada com base nas regras mais duras da nova Lei Anticorrupção, que entrou em vigor em 29 de janeiro deste ano. Notas fiscais apreendidas pela Polícia Federal comprovam que a construtora Engevix continuou pagando propinas ao esquema operado pelo doleiro Alberto Youssef e por Paulo Roberto Costa, ex-diretor da estatal, em fevereiro de 2014, quando a Lei Anticorrupção já estava valendo. Integrantes da força-tarefa da Operação Lava-Jato agora devem enquadrar outras construtoras na mesma situação.
Entre as sanções previstas na Lei Anticorrupção estão até a dissolução compulsória das empresas ou a suspensão de suas atividades, a perda de bens e a aplicação de multas milionárias, entre outras medidas.
Uma das notas fiscais apreendidas prova que a Engevix Engenharia, que integra o grupo Engevix, fez em 25 de fevereiro deste ano um pagamento de R$ 213,2 mil à GFD Investimentos, empresa usada pelo doleiro Alberto Youssef no esquema que desviou recursos da Petrobras. A nota da Secretaria Municipal de Finanças de São Paulo discrimina como suposto serviço prestado "assessoria ou consultoria de qualquer natureza".
Outro documento produzido pela PF após a apreensão de papéis da Operação Lava-Jato aponta que, em 13 de fevereiro, houve um repasse de R$ 35 mil à Costa Global. Essa empresa de consultoria foi usada pelo ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa para movimentar o dinheiro do esquema.
A Lei Anticorrupção, sancionada pela presidente Dilma Rousseff em agosto de 2013, começou a valer 180 dias depois, em 29 de janeiro deste ano. A proposta foi uma iniciativa do governo federal e chegou ao Congresso Nacional em 2010, onde sofreu forte resistência e ficou bastante tempo parada, por conta do lobby contrário feito por empreiteiras. O projeto entrou na pauta da votação dentro de um pacote de bondades oferecido pelo Congresso diante dos megaprotestos de junho de 2013.
A lei passou a punir pessoas jurídicas em razão da prática de suborno, tanto na esfera cível quanto na administrativa, e não somente as pessoas físicas responsáveis pelos atos de corrupção, como ocorria até então. Uma das sanções mais pesadas é a multa de 0,1% a 20% do faturamento bruto da empresa. Se o critério do faturamento não for possível de ser aplicado, essa multa tem valor máximo de R$ 60 milhões.
Procuradores da República que integram a força-tarefa montada pelo Ministério Público Federal para acompanhar a Operação Lava-Jato têm um entendimento comum: fatos posteriores ao início de validade da lei podem levar ao enquadramento nas sanções que passaram a existir. Até agora, em meio à grande quantidade de provas produzidas sobre a participação das empreiteiras no esquema, os investigadores identificaram poucos elementos sobre a atuação da organização criminosa após janeiro deste ano. À medida em que essas provas surgirem, como as notas fiscais da GFD e da Costa Global para a Engevix, novas ações na área cível poderão ser propostas à Justiça.
Improbidade administrativa
Segundo procuradores, a responsabilização administrativa no âmbito da Controladoria Geral da União (CGU) não afasta a possibilidade de responsabilização judicial. Conforme esses procuradores, o principal mérito da lei foi prever as punições das empresas na esfera administrativa.
A reportagem consultou a CGU para saber se provas como as notas fiscais identificadas pela reportagem podem ser usadas para enquadrar a Engevix na Lei Anticorrupção. Segundo o órgão, "qualquer fato novo pode ser incluído no processo administrativo e levar ao enquadramento na lei". Fatos anteriores a janeiro deste ano são analisados sob a luz de outro arcabouço legal, em especial a Lei de Litações.
O ministro da CGU, Jorge Hage, já havia declarado no início do mês que essa é uma possibilidade real. O órgão abriu processos administrativos contra oito empreiteiras envolvidas no esquema da Lava-Jato, entre elas a Engevix.
A força-tarefa do MPF prepara ações de improbidade administrativa, paralelamente às denúncias criminais já ofertadas à Justiça, para enquadrar as empreiteiras em sanções que podem levar ao impedimento de novas contratações com o poder público. Conforme o texto da Lei Anticorrupção, as ações do Ministério Público com base nesta lei devem seguir os mesmos ritos das ações civis públicas. Essas ações não afetam processos por improbidade nem por crime de licitação.
Até agora, o MPF denunciou à Justiça (na área criminal) o sócio e vice-presidente da Engevix, Gerson de Mello Almada; os diretores técnicos da empreiteira Carlos Eduardo Albero e Newton Prado Junior; e o engenheiro Luiz Roberto Pereira, que também trabalhava para a empresa. Almada continua preso em Curitiba. Na mesma denúncia, também foram incluídos o doleiro Youssef e o ex-diretor Costa, além de operadores do esquema de propinas e lavagem de dinheiro, entre eles dois gestores da GFD Investimentos: Enivaldo Quadrado e Carlos Alberto Pereira da Costa.
Os crimes citados na denúncia são formação de organização criminosa, corrupção, lavagem de dinheiro, prática de cartel, fraude a licitações e contra a ordem tributária. Os três últimos ainda serão objeto de denúncias futuras. Por enquanto, não houve menção nas denúncias à Lei Anticorrupção, até por se tratar de uma ação penal as sanções da nova lei são na esfera cível e administrativa.
Engevix e GFD
A ação do MPF chega a citar o contrato entre a Engevix e a GFD Investimentos, com validade até 15 de dezembro deste ano. Seriam dez parcelas, no valor total de R$ 2,13 milhões, para "prestação de serviços de apoio administrativo para o desenvolvimento de atividades do Consórcio Rnest O.C Edificações e administração de contrato", conforme a denúncia. A nota fiscal identificada na reportagem é a de número 49 e, conforme o MPF, foi providenciada por Enivaldo Quadrado, a pedido de Youssef.
Teria havido ainda a emissão de uma nota em 1º de abril, quando já havia sido deflagrada a primeira etapa da Operação Lava-Jato, com as prisões de Youssef e Costa. Os empreiteiros e executivos só foram presos em 14 de novembro.
O contrato com a Costa Global, por sua vez, atingiria o valor de R$ 700 mil, dos quais R$ 385 mil foram efetivamente pagos. "Todos estavam plenamente cientes de que o objeto do contrato era absolutamente fictício, já que a Costa Global era utilizada por Paulo Roberto Costa para o recebimento dos valores indevidos de forma direta, sem que houvesse a intermediação de Alberto Youssef", afirma o MPF na denúncia.
A reportagem não conseguiu contato com a Engevix. A empresa, sempre que procurada, tem uma resposta padrão: "A Engevix prestará os esclarecimentos necessários à Justiça".