Estamos há 36 dias sem a deflagração de uma nova etapa da Lava Jato, completados nesta quarta-feira (18). A “calmaria” causa estranheza em quem está acostumado com o ritmo frenético das investigações do maior esquema de corrupção já descoberto no país – confira todas as fases da Lava Jato neste ano e o intervalo entre elas. Esse é o período mais longo de 2016 sem nenhuma fase ostensiva da Lava Jato, apesar de não ser o intervalo mais longo já registrado desde 2014, quando a operação foi deflagrada. E ocorre quase ao mesmo tempo em que integrantes da operação mostram sinais de cansaço.
Desde janeiro, quando a PF deu o pontapé inicial nas operações deste ano, com a deflagração da Triplo X – 22ª fase -, dando fim a uma espera de 62 dias desde a última fase deflagrada em 2015, não demorou mais de 30 dias para a chegada de novas deflagrações.
O período de calmaria nas operações, porém, serviu para a PF e o MPF analisarem o material coletado e para que o juiz Sergio Moro avançasse nos julgamentos – nesta quarta, por exemplo, Moro condenou José Dirceu a 23 anos de prisão. Até agora, com exceção das investigações que foram parar no Supremo Tribunal Federal (STF) por envolver pessoas com prerrogativa de foro, todos os presos deste ano já foram denunciados pelo Ministério Público Federal (MPF), o que significa que pelo menos grande parte do que foi apreendido já passou pela análise da PF e gerou ações penais que tramitam na 13ª Vara Federal, sob os cuidados do juiz federal Sergio Moro. As últimas denúncias foram aceitas na semana passada por Moro e eram referentes às fases Carbono 14 e Vitória de Pirro – últimas etapas deflagradas pela PF.
Maior intervalo é de 83 dias
O maior intervalo entre operações da Lava Jato foi de 83 dias. Foi o período entre a deflagração da 6ª fase, que realizou buscas em endereços ligados a Paulo Roberto Costa, e a 7ª fase – Juízo Final – que levou à prisão executivos de grandes empreiteiras do país. Já o menor intervalo foi entre a fase Polimento, primeira fase internacional da Lava Jato, e a Xepa. As operações ocorreram com um dia de diferença.
Crise política
A Operação Lava Jato não deu trégua nem durante a crise política provocada pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT). Com a deflagração da Operação Triplo X, em janeiro deste ano, a PF começou a se aproximar cada vez mais do ex-presidente Lula, agravando a crise. O ápice da interferência da Lava Jato na crise política foi a divulgação dos áudios de interceptações telefônicas do ex-presidente.
Em uma gravação, a presidente Dilma dizia que estava enviando a Lula o termo de posse como ministro da Casa Civil para que o ex-presidente usasse “em caso de necessidade”. O episódio foi interpretado como obstrução de Justiça, já que assumindo um ministério Lula passaria a ter prerrogativa de foro e as investigações sairiam das mãos de Moro.
Em entrevista ao programa Roda Viva na última segunda-feira (16), o ex-senador Delcídio Amaral, preso na Lava Jato que se tornou delator, disse que as investigações da PF foram o pano de fundo para o afastamento da presidente. “Se você olhar o impeachment, o que é o impeachment? É pedalada? Isso aí é um dos motivos. O pano de fundo é a Lava Jato”, afirmou Delcidio.
Depois da votação do impeachment na Câmara, no dia 17 de abril, nenhuma fase ostensiva da Lava Jato foi deflagrada pela Polícia Federal. Com o afastamento da presidente na semana passada, depois da primeira votação no Senado, começou a se especular qual seria a postura do presidente em exercício Michel Temer (PMDB) em relação à operação, já que ele mesmo é citado nas investigações.
Temer garantiu que não vai tentar interferir na Lava Jato e disse em seu primeiro pronunciamento que a operação deve ser preservada. Na força-tarefa, por enquanto os investigadores garantem que não há nenhum temor de que o presidente tente barrar a Lava Jato. Mesmo assim, a Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) anunciou nesta semana que vai montar uma lista tríplice com possíveis nomes para o cargo de diretor-geral da Polícia Federal, com o objetivo de proteger a operação de interferências políticas.
Etapas da operação em 2016
Veja quais foram as fases deflagradas neste ano e o intervalo entre elas:
- 22ª: Triplo X – deflagrada em 27 de janeiro, 62 dias depois da 21ª
- 23ª: Acarajé – deflagrada em 22 de fevereiro, 25 dias depois da 22ª
- 24ª: Aletheia – deflagrada em 4 de março, 10 dias depois da 23ª
- 25ª: Polimento – deflagrada em 21 de março, 16 dias depois da 24ª
- 26ª: Xepa – deflagrada em 22 de março, 1 dia depois da 25ª
- 27ª: Carbono 14 – deflagrada em 1ª de abril, 9 dias depois da 26ª
- 28ª: Vitória de Pirro – deflagrada em 12 de abril, 11 dias depois da 27ª
Integrantes da Lava Jato dão sinais de cansaço
A força-tarefa da Lava Jato já começa a dar sinais de cansaço depois de mais de dois anos de trabalho. Dois procuradores do Ministério Público Federal (MPF) foram substituídos depois de voltarem para seus estados de origem. O procurador Carlos Lima também chegou a pedir para deixar a operação, mas por enquanto continua na força-tarefa.
No mês passado, o delegado da Polícia Federal (PF) Filipe Pace fez um “desabafo” em um inquérito que investigava o operador João Henriques. Para ele, “a sucessiva deflagração de fases ostensivas da Operação Lava Jato impossibilita a conclusão célere da análise de todo o material apreendido em fases pretéritas”.
O juiz federal Sergio Moro (foto), que conduz as investigações em primeira instância, também já demonstrou cansaço. Há pouco mais de um mês, Moro disse a uma pessoa próxima que espera terminar sua parte na operação até dezembro. “Terminar até dezembro a parte da primeira instância é uma expectativa ou um desejo”, disse o juiz.
Vai longe
Por outro lado, procuradores e outros delegados da força-tarefa garantem que o trabalho ainda vai longe e tem muito o que avançar. A expectativa de alguns investigadores é de que a Lava Jato dure pelo menos mais dois anos. O procurador do MPF Paulo Galvão disse em janeiro que, caso a Lava Jato não deflagrasse mais nenhuma operação a partir dali, ainda restava material para pelo menos mais dois anos de trabalho.
Por parte do MPF, ainda são aguardadas a denúncia de cartel das empreiteiras e a responsabilização dos partidos políticos, além das ações de improbidade administrativa, que serão todas feitas pela equipe de Curitiba – inclusive dos investigados com prerrogativa de foro.
Em uma entrevista ao Fantástico, o coordenador da força-tarefa na PF, delegado Igor Romário de Paula, mostrou que há uma sala reservada para guardar o material apreendido na Lava Jato. As provas ficam em prateleiras, numeradas de acordo com a fase em que foram recolhidas. Até março deste ano, já havia 31 prateleiras para armazenamento, mas o delegado brincou dizendo que “tem mais estante, se for necessário”.
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