A indicação do atual ministro da Justiça Alexandre de Moraes para a cadeira deixada pelo ministro Teori Zavascki no Supremo Tribunal Federal (STF) pode causar desconforto em alguns julgamentos no Plenário da Corte. Se aprovado pelo Senado, Moraes assumirá a vaga de Zavascki, morto em um acidente de avião no último dia 19, mas não vai herdar os processos da Lava Jato na Corte – que já foram redistribuídos para Edson Fachin.
Moraes vai integrar a Primeira Turma do STF e só deverá ter contato com processos relacionados à Lava Jato que chegarem para apreciação no Plenário - onde será o revisor do caso. Mesmo assim, o nome dele pode causar desconforto, pois estaria impedido ou suspeito para julgar casos envolvendo principalmente o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB) e o presidente Michel Temer (PMDB).
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No final de 2014, Moraes atuou como advogado de Cunha em um processo no STF em que o ex-deputado era acusado de uso de documento falso. Por isso, pode não julgar casos relacionados à Cunha que cheguem ao Supremo. “A relação da advocacia é uma relação de confiança, que acaba gerando uma lógica de impedimento”, explica a professora de direito constitucional da PUCPR Vivian Valle.
Indicação política é apontada como problema
A professora da PUCPR Vivian Valle alerta para as desvantagens de uma indicação política como a de Moraes para vagas no STF. “Eu vejo com muito maus olhos uma indicação política no Supremo. Não me parece que o Supremo deva abrigar pessoas com trânsito na política e que tenham sido nomeadas por isso”, diz a professora.
A professora lembra que esse não é o único caso de indicação política para o Supremo. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), por exemplo, nomeou um ministro de Estado para a vaga: Gilmar Mendes. Já o ex-presidente Lula (PT) indicou um ex-advogado do PT: Dias Toffoli.
“São governos de partidos políticos diferentes, mas todos fizeram indicação política, o que vai fragilizando o Supremo como Corte Constitucional”, diz Vivian.
Em relação a indicação de Moraes para o STF, a professora destaca como ponto negativo o momento vivido pelo país e o andamento dos processos da Lava Jato. “É uma nomeação que está nitidamente carregada de uma opção politica, em um momento infeliz. É uma opção ruim, no mínimo, do ponto de vista do momento processual da Lava Jato”, afirma.
Caso o próprio Alexandre de Moraes não se declare impedido de julgar casos envolvendo Cunha, o pedido pode ser feito pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. “Não julgar causas em que o Eduardo Cunha esteja presente me parece óbvio. Se vê pela relação de confiança que ele [Moraes] não teria a devida isenção”, explica Vivian.
Temer
No caso de Temer, o desconforto pode ser ainda maior. De acordo com o regimento interno da Corte, Moraes seria o revisor da Lava Jato no Plenário, pois é o ministro mais novo no STF depois do relator - o ministro Edson Fachin.
São julgados no Plenário da Corte pedidos relacionados aos presidentes da República, Michel Temer (PMDB) - que indicou Moraes para a vaga -, do Senado, Eunício Oliveira (PMDB), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM). Os três já foram citados na Operação Lava Jato.
Moraes deveria se declarar suspeito para julgar causas envolvendo o presidente Temer no STF, pela relação de amizade entre os dois. “Há suspeição se for amigo íntimo ou inimigo das partes”, afirma Vivian.
A amizade com Temer, porém, pode não afetar o julgamento de Moraes, segundo a professora da PUCPR. “Não necessariamente estamos falando em uma atuação pró-Temer ou pró-amigos do Temer”, diz. “Há que se considerar uma situação, a Corte muda as pessoas”, explica Vivian.
Recentemente, por exemplo, o ministro Edson Fachin, indicado pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e com forte ligação com o PT, se posicionou contrário ao recurso de Dilma em relação ao processo de impeachment. O mesmo aconteceu na década de 1990, quando o ministro Celso de Mello, indicado pelo ex-presidente Fernando Collor (PTB), também foi contrário ao recurso contra a cassação do presidente.
Filiação partidária
O vínculo partidário de Moraes também pode gerar desconfortos na Corte. O ministro da Justiça solicitou nesta terça-feira (7) sua desfiliação do PSDB. Vale salientar que a Constituição não permite ministros do STF com atuação político-partidária.
Apesar de haver outros ministros no STF com histórico de vinculação a partidos políticos – Gilmar Mendes foi advogado-geral da União do governo Fernando Henrique Cardoso e Dias Toffoli atuou como advogado do PT – nenhum magistrado da Suprema Corte tinha filiação partidária no momento da indicação.
“É mais um motivo para demonstrar a opção pela política em detrimento da técnica”, critica a professora da PUCPR. Além de ter sido filiado ao PSDB, Moraes já pertenceu também ao PMDB e ao DEM. Os três partidos políticos têm membros citados na Operação Lava Jato.
No caso de Toffoli, o ministro ingressou no STF em 2007. A primeira denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) em relação ao mensalão foi de abril de 2006. A lista de réus atingia o núcleo duro do PT, como o ex-ministro José Dirceu, que já tinha saído do governo em 2005, quando o escândalo surgiu. Mesmo assim, no Plenário, Toffoli votou contra a condenação do ex-ministro da Casa Civil de Lula.
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