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Alessandra Back com o filho Zion no Parque Bacacheri: ela agradece por poder usar o espaço verde como “quintal de casa” para criar o filho “solto” e torce para que a prefeitura aumente a área do parque | Jonathan Campos/ Gazeta do Povo
Alessandra Back com o filho Zion no Parque Bacacheri: ela agradece por poder usar o espaço verde como “quintal de casa” para criar o filho “solto” e torce para que a prefeitura aumente a área do parque| Foto: Jonathan Campos/ Gazeta do Povo

Rios poluídos

Para especialistas, salvar as águas deveria ser missão do futuro prefeito

A experiência agradável da visi­­ta aos parques por ve­­zes é prejudicada por uma "ver­­dade inconveniente": as águas de Curitiba estão doen­­tes devido ao esgoto lançado­­ nos rios – o que se evidencia pe­­la mau cheiro dos lagos de vá­­rias unidades de conservação.

"Quem vier a administrar a cidade tem de olhar para as águas. Elas são o termômetro da qualidade de vida, da saúde da cidade", diz o urbanista­­ João Suplicy Neto. "É preciso investimento pesado em saneamento", complementa o arquiteto Key Imaguire. Ele cita o exemplo de Londres, que conseguiu limpar­­ o Tâmisa, dado como morto em 1950. O desafio de Curitiba passa pela revitalização do Belém, o rio que corta a cidade e percorre alguns dos principais parques, como o São Lourenço, o Bosque do Papa e o Passeio Público. Ressuscitá-lo é uma missão a que o professor Carlos Mello Garcias, do doutorado em Gestão Urbana da PUCPR, tem dedicado a vida acadêmica. "A cidade se formou em torno do Belém, mas hoje ele é o símbolo da falência da gestão das águas. Não dá para admitir que um rio nobre como esse vire um valetão", diz Garcias. "Salvar o Belém e fazer um parque linear ao redor dele: esse seria um presente que a próxima administração poderia dar para a cidade." Ele destaca que a prefeitura e a Sanepar têm projetos "interessantes" para revitalização dos rios de Curitiba. Mas são insuficientes. "Tem de investir mais. E toda a população precisa entrar no esforço. O lixo mal colocado, o óleo pingando dos carros, a sujeira das milhares de obras: tudo isso vai para os rios."

Ele defende que uma campanha para salvar as águas deveria aproveitar o gosto dos curitibanos pelos parques. "Parques com água despertam a melhor experiência sensorial. A pessoa se sente bem porque toca a árvore, sente o cheiro da grama e vê a lâmina d’água, que atenua o estresse do dia a dia. É neste momento que devemos conscientizá-la."

Ideias para uma Curitiba melhor

Confira algumas sugestões para melhorar os espaços públicos de convívio do curitibano:

Praças

• Equipar as praças com equipamentos de lazer, esporte, cultura e entretenimento. E promover atividades rotineiras que atraiam os moradores da vizinhança.

• Reformar praças para que sejam mais "aconchegantes" para o convívio social.

Centro

• Estimular a ocupação do Centro por moradias. Para isso, será preciso construir estacionamentos públicos subterrâneos, que ficariam disponíveis para os moradores. Desse modo, prédios sem garagem voltarão a ter interesse imobiliário.

• Reformar prédios desocupados da região e destiná-los a famílias de baixa renda.

• Transformar os miolos das quadras centrais em espaços públicos ou "semiprivados", pequenas praças.

• Reforçar a segurança e a iluminação da região central.

Parques

• Criar bicicletários e aumentar as vagas de estacionamento de automóveis nos principais parques.

• Criar fontes de renda alternativas para os "flanelinhas" dos estacionamentos dos parques, capacitando-os para que se tornem condutores de visitas guiadas ou auxiliares nas atividades de recreação.

• Valorizar a experiência da visita ao parque, além da contemplação da natureza. Proporcionar atividades de recreação, esportivas, culturais e educativas.

• Criar atividades noturnas, com segurança e iluminação reforçadas.

• Modernizar ou criar centros de visitantes, que reúnam informações sobre a fauna, flora e a história do parque.

• Usar o espaço para espetáculos de música e cinema ao ar livre.

• Aproveitar a grande fre­­quência aos parques da cidade para transformá-los em cen­­tros de "inteligência", onde as pessoas possam dar sugestões, fazer críticas e ter acesso a serviços públicos.

• Ampliar o número de parques, evitando que as poucas áreas verdes da cidade que sobraram sejam "perdidas" para especulação imobiliária.

• Repensar linhas de ônibus que levem as pessoas dos bairros aos parques.

• Criar uma campanha de despoluição e revitalização dos rios urbanos da cidade, aproveitando os parques para conscientizar a população.

Fontes: Redação da Gazeta do Povo, Irã Dudeque, Key Imaguire, Joel Souza e Silva, Carlos Mello Garcias, Jéferson Navolar.

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  • Rua das Flores: cidade nasceu no Centro, mas região entrou em processo de desvalorização quando as famílias foram morar em outros bairros. Falta de estacionamentos foi uma das causas.
  • Praça da Espanha: exemplo de espaço público que foi

Curitiba não tem mar. "Mas tem bar", emendou o boêmio poeta Paulo Leminski. Uma boa rima. Mas não uma solução para a maioria dos curitibanos. Aqui, o papel do espaço de convívio e lazer cabe principalmente aos parques.

INFOGRÁFICO: Confira o lugar de preferência dos curitibanos e o que acham dos parques

As áreas verdes estão definitivamente no coração dos curitibanos. Uma enquete com 410 moradores, encomendada pela Gazeta do Povo ao Instituto Paraná Pesquisas, revela que passear nos parques é o que 35% dos moradores da cidade mais gostam de fazer em Curitiba – o programa preferido do curitibano. Para 31%, os parques também são aquilo de que mais gostam na capital. Nenhuma outra característica da cidade foi mais citada. E 18% dizem que eles são o local em que se sentem melhor – o segundo espaço preferido (veja infográfico no fim da página).

"O parque é um espaço de lazer gratuito; de qualidade de vida ao ar livre. Não troco este lugar por nada", diz a advogada e professora universitária Alessandra Back. Vizinha do Parque Bacacheri há oito anos, ela agradece a sorte de ter conseguido criar o filho Zion "solto", tendo a área verde como quintal de casa.

Alessandra observa, porém, que o adensamento populacional está deixando o parque "pequeno". Nos fins de semana, fica superlotado – algo que também tem ocorrido com outros espaços da cidade. "A gente torce para que a prefeitura consiga comprar áreas vizinhas para ampliar o nosso parque", diz a advogada.

O sonho de Alessandra – garantir que o crescimento populacional não "congestione" os parques – impõe um desafio ao futuro prefeito: agir rapidamente para criar mais unidades de conservação e lazer. Afinal, a cidade já não tem mais tantas áreas verdes grandes o suficiente para a criação de parques. E as que sobraram são alvo constante do apetite do mercado imobiliário.

Decisão estratégica

Curitiba tem hoje 30 parques. Somados à cobertura vegetal mantida por particulares, eles garantem a cada curitibano 51 metros quadrados de área verde.

Esse invejável índice de verde per capita foi possível porque, na virada dos anos 60 para os 70, a prefeitura tomou uma decisão estratégica: preservar em vez de deixar que áreas de fundo de vale sujeitas a alagamentos fossem loteadas ou ocupadas irregularmente. Nelas foi implantada, a partir de 1972, a imensa maioria dos parques da cidade. Antes disso, Curitiba tinha apenas o velho Passeio Público, de 1886. Com essa política, a cidade promoveu um casamento de sucesso entre conservação ambiental, lazer e proteção social.

Mais de 40 anos depois, a cidade não tem apenas o desafio de criar mais áreas verdes. Há também a necessidade de cuidar melhor das que já existem. Principalmente da qualidade de suas águas. Lagos de diversos parques de Curitiba costumam ficar sujos e malcheirosos, devido ao esgoto lançado nos rios.

Sem resolver esse problema, a cidade acaba por depreciar um dos principais orgulho dos moradores. "Os parques são a representação imagética de Curitiba para o cidadão e também para o visitante", diz Letícia Peret Antunes Hardt, professora do mestrado em Gestão Urbana da PUCPR. A enquete da Paraná Pesquisas corrobora a constatação de Letícia: 62% dos curitibanos disseram que o primeiro lugar ao qual levariam um parente ou amigo que nunca esteve na cidade seria um parque.

Poder do afeto

O afeto do curitibano pelas áreas verdes também poderia ser aproveitado pela prefeitura para se aproximar da população. "Por que não usar estes grandes equipamentos públicos, que são largamente visitados, para fazer a sociedade participar da vida da cidade?", questiona o presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Paraná, Jéferson Navolar.

Ele sugere que os parques sejam usados pela prefeitura para "conversar" com os moradores. Ou seja, que haja nos parques espaços para o curitibano informar demandas, fazer sugestões e críticas à prefeitura. O poder público também poderia usá-los para ofertar serviços e promover cultura e campanhas educativas.

Atrair moradores é solução para o Centro

Cenário de crimes e paixões nos contos de Dalton Trevisan. De comícios e passeatas políticas. De polêmicas e bravatas de anônimos (ou não) da Boca Maldita. Lar da pequena multidão de desabrigados que lhe ocupam as ruas nas madrugadas. O Centro tem lugar cativo no imaginário e no coração de grande parte dos curitibanos.

O carinho dos moradores pela região em que a cidade nasceu aparece na enquete do Instituto Paraná Pesquisas. Para 9% dos moradores, o Centro é o lugar da cidade em que se sentem melhor. Pode parecer pouco. Mas é o quarto local mais lembrado pelos curitibanos, atrás apenas do bairro em que moram, dos parques e da residência dos entrevistados.

O urbanista e historiador Irã Dudeque diz que esse afeto se dá em razão de estarem no Centro os "monumentos significativos" da cidade. "O verdadeiro centro cívico de Curitiba é o calçadão da Rua das Flores. No sentido mais amplo da palavra: o local de encontro e discussão da cidade", diz ele. "Por mais que você faça um teatro, nenhum é o Guaíra. Existem muitas igrejas e templos, mas nenhuma é a Catedral. Você pode construir novas praças, mas nenhuma será a Tiradentes."

Apesar disso, diversos pontos da região central passam por um processo de degradação – ainda que haja algumas iniciativas para resgatá-los.

Dudeque afirma que a desvalorização do Centro veio junto com a valorização do carro na sociedade moderna. "Os primeiros prédio feitos na região da Praça Osório não têm garagens. Isso [moradias projetadas para famílias sem automóvel] funcionava a partir do momento em que houve uma opção política por expandir a cidade por meios de eixos [do transporte coletivo], pois os grandes edifícios se espalham ao longo deles", diz o arquiteto. Ou seja, tendo um bom sistema de ônibus ao lado de casa, não era preciso ter carro.

Mas, diz Dudeque, quando as pessoas passaram a depender mais do automóvel, o Centro se desvalorizou como local de moradia. Sem gente, algumas áreas se degradaram.

Para Dudeque, a solução para o Centro seria o retorno da população. "Não se trata apenas de criar uma política de atrações [ comerciais, culturais ou de lazer] na área central; é preciso atrair moradores", diz ele. Para isso, o fundamental seria criar estacionamentos, que poderiam ser subterrâneos. Ele também diz que é preciso ousar e confrontar "vacas sagradas" do planejamento curitibano. Reabrir algumas áreas do Calçadão da Rua XV para a passagem de carros seria algo a se pensar, diz Dudeque.

Praças têm bom "potencial afetivo"

Logradouro público por excelência, as praças surgiram no Brasil como um espaço "para ver a igreja da cidade e [para] as pessoas se encontrarem" – na definição do professor Murilo Marx, no livro Cidade Brasileira. Porém, aos poucos as praças como ponto de encontro estão sendo substituídas por outros locais – como parques e shoppings.

Na enquete do Instituto Paraná Pesquisas, apenas 2,7% dos curitibanos disseram que o que mais gostam de fazer em Curitiba é passear pelas praças. É um porcentual pequeno, mas supera as pessoas que disseram, por exemplo, que gostam de frequentar restaurantes. Isso indica que há um potencial de uso mais frequente das praças como espaço de convívio – desde que elas sejam seguras e tenham equipamentos ou atividades de lazer, esporte ou cultura.

Há alguns bons exemplos de praças curitibanas que foram "apropriadas" pela comunidade. A Praça da Espanha, no Batel, tem shows­­ musicais, feira de antiguidades e mostra de carros antigos nos sábados. A 29 de Março (Mercês) também é usada pelos moradores do entorno. A Ouvidor Pardinho (Rebouças) foi transformada em um bem-sucedido centro de convívio e saúde para idosos. A Praça da Colonização Menonita (Boqueirão) tem quadras esportivas disputadas pela vizinhança.

O arquiteto e urbanista João Virmond Suplicy Neto, professor da PUCPR, explica que uma praça funciona bem quando se torna a continuidade das calçadas das ruas próximas, sem barreiras, degraus ou outros obstáculos que a separem da rua. "Quando estão encaixadas no traçado urbano, elas se tornam pontos de socialização", diz ele.

Mas Suplicy Neto ressalta uma deficiência nas condições de mobiliário urbano em Curitiba: "Temos poucas praças boas como a 29 de Março, que atraem as pessoas. A Rui Barbosa, por exemplo, hoje é um terminal de ônibus e não um espaço de convívio".

Ele ainda sugere que a iniciativa privada contribua com o poder pode público para ampliar os espaços destinados à comunidade. Morador da região do Bigorrilho, Suplicy Neto lamenta que o terreno do antigo Clube Juventus tenha sido aproveitado para abrir ruas e construir imóveis. "Que praça fantástica poderia ter sido feita ali, inclusive com o apoio da iniciativa privada."

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