No despacho em que suspende o sigilo das interceptações telefônicas que envolvem diálogos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o juiz Sergio Moro justifica que o sigilo absoluto só deve ser mantido “em relação a diálogos de conteúdo pessoal”, mas nunca sobre “diálogos relevantes para investigação de supostos crimes contra a administração pública”.
“Nos termos da Constituição, não há qualquer defesa de intimidade ou interesse social que justifiquem a manutenção do segredo em relação a elementos probatórios relacionados à investigação de crimes contra a Administração Pública”, escreve o magistrado. Os pedidos pelas interceptações e de suspensão do sigilo são do Ministério Público Federal (MPF).
No documento, Moro destaca que, pelo teor dos diálogos, é possível constatar que Lula “já sabia ou pelo menos desconfiava” de que estaria sendo interceptado, o que comprometeria a investigação, determinando a interrupção do grampo.
O magistrado observa ainda que, pelas conversas, é possível perceber que o ex-presidente tinha conhecimento antecipadamente da deflagração da operação do último dia 4, pela Polícia Federal, em sua casa e no Instituto Lula.
Ao final do despacho, Moro assinala que, como foi divulgado que Lula “teria aceito convite para ocupar o cargo de Ministro Chefe da Casa Civil”, com posse inicialmente marcada para a próxima terça-feira (22), mas antecipada para esta quinta (17), a partir de então, o conteúdo da investigação e seus conexos devem ser encaminhados ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Influência
Ainda no despacho, Moro indica que Lula tentou influenciar ou obter auxílio de autoridades do Ministério Público ou da magistratura. “Cumpre aqui ressalvar que não há nenhum indício nos diálogos ou fora deles de que estes citados teriam de fato procedido de forma inapropriada e, em alguns casos, sequer há informação se a intenção em influenciar ou obter intervenção chegou a ser efetivada”, ressalta o juiz.
O magistrado cita “alguma influência de caráter desconhecido” junto a Ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber, responsável por apreciar a competência de juízo para o caso de Lula. Também teria havido tentativas de influência sobre o presidente do Supremo, ministro Ricardo Lewandowski, contra “imaginária” prisão do ex-presidente.
Moro também escreve que há nas ligações referência ao recém-nomeado ministro da Justiça, Eugênio Aragão. Na gravação, Lula conversa com o ex-ministro de Direitos Humanos Paulo Vannuchi e diz que Aragão deve cumprir “papel de homem” como ministro. “Eu às vezes fico pensando até que o Aragão deveria cumprir um papel de homem (...), porque o Aragão parece nosso amigo, parece, parece, mas tá sempre dizendo ‘olha’”, afirma.
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