O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva avalia que as manifestações brasileiras são resultado do sucesso econômico e social sem paralelo do Brasil na última década, de jovens de famílias pobres que, pela primeira vez, conseguiram entrar em uma universidade, comprar carro e voar de avião e agora querem participar mais da vida política e melhores serviços públicos, diz em um artigo no jornal norte-americano The New York Times, no qual argumenta ainda que o PT precisa passar por uma renovação profunda para lidar com estes novos tempos.
Lula começa seu artigo falando que parece mais fácil explicar os protestos populares quando eles acontecem em países não democráticos, como o Egito e a Tunísia, em 2011, ou em nações em que a crise econômica aumentou o desemprego entre os jovens, como na Grécia e na Espanha, do que no Brasil, que passa por níveis historicamente baixos de desemprego e experimenta uma expansão econômica e social sem paralelos.
"As demonstrações são resultado dos sucessos econômico, político e social do País", avalia o ex-presidente. Lula cita que na última década o Brasil dobrou o número de estudantes universitários, muitos vindos de famílias pobres. "Reduzimos nitidamente a pobreza e a desigualdade."
O ex-presidente vê como um processo natural que esses jovens, que estão obtendo coisas que seus pais não tiveram condições de ter, queiram ainda mais. Esses jovens, ressalta Lula, não experimentaram a repressão da ditadura militar nos anos 60 e 70 e nem a inflação galopante dos anos 80. "Eles se lembram muito pouco dos anos 90, quando a estagnação e o desemprego deprimiram a economia. Eles querem mais."
Muitos jovens e famílias conseguiram nos últimos anos comprar seus primeiros carros e fazer a primeira viagem de avião. É compreensível que neste contexto eles queiram serviços públicos melhores, sobretudo nas grandes cidades, avalia Lula.
Além da necessidade de melhora material dos serviços públicos, Lula diz que os jovens que protestam nas ruas também querem instituições políticas mais transparentes e claras, sem as distorções do sistema político e eleitoral anacrônico brasileiro. "A legitimidade destas demandas não pode ser negada, mesmo sendo difícil atendê-las rapidamente. Primeiro é necessário achar os recursos, estabelecer objetivos e um cronograma."
Uma sociedade democrática, diz Lula, está sempre em fluxo, debatendo e definindo prioridades e desafios. Só uma democracia poderia eleger um índio para presidente da república, como na Bolívia, ou um afro-americano, como nos Estados Unidos, ou ainda um metalúrgico e em seguida uma mulher, como no Brasil.
No artigo, Lula defende a existência dos partidos políticos, muito criticados durante as manifestações. "A história mostra que quando os partidos são silenciados e as soluções são buscadas à força, os resultados são desastrosos, como guerras, ditaduras e perseguições de minorias", diz Lula. "Sem partidos não pode existir uma democracia verdadeira." Mas as pessoas, diz ele, não querem apenas votar a cada quatro anos, elas querem participar e interagir diariamente nos governos, locais e federais. "Elas querem ser ouvidas. E isto cria um tremendo desafio para os líderes políticos."
Para Lula, os líderes políticos têm que ter melhores formas de engajamento e interação neste novo cenário, seja nas redes sociais, nas fábricas ou nas universidades. Se as instituições democráticas usarem as novas ferramentas tecnológicas para, não apenas fazer propaganda, mas também para dialogar com a sociedade, elas estarão respirando um ar novo, avalia.
Renovação
O ex-presidente diz que mesmo o PT, partido que ajudou a fundar em uma época que a classe operária não tinha representantes, precisa de uma "renovação profunda". O PT precisa recuperar a ligação diária com os movimentos sociais e oferecer novas soluções para novos problemas.
"A boa notícia é que os jovens não são conformistas apáticos ou indiferentes à vida pública." Mesmo aqueles que odeiam a política, estão começando a participar.
Lula finaliza seu artigo falando que outra boa notícia é que a presidente Dilma Rousseff propôs um plebiscito para decidir a reforma política, que é tão necessária. Este é o segundo artigo que Lula escreve para o The New York Times. O primeiro foi no começo de maio, logo após a morte do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, no qual Lula falava do cenário para a América Latina pós-falecimento do líder venezuelano.
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