Dinheiro
Financiamento menor desde o governo Itamar
A União tem diminuído a participação no financiamento da saúde pública desde a gestão Itamar Franco (1992-1994). Na época, a área ficava com 30% do orçamento destinado à seguridade social. Hoje a fatia caiu pela metade.
Segundo cálculos de Januário Montone, ex-presidente da Agência Nacional de Saúde, nos países com predominância do sistema público de saúde, os gastos ficam acima dos 6,5% do Produto Interno Bruto. Nessa comparação, os recursos do Brasil para o setor deveriam ter atingido R$ 166 bilhões em 2007 ou seja, 75% a mais do que os R$ 94,43 bilhões efetivamente aplicados.
Uma promessa, dois consensos e várias dúvidas cercam o debate sobre saúde pública entre os três principais pré-candidatos a presidente. Dilma Rousseff (PT), José Serra (PSDB) e Marina Silva (PV) são unânimes em defender mais dinheiro para a área. Os três apoiam a regulamentação da Emenda Constitucional n.º 29 o que garantiria mais verbas para o setor. Mas, ao mesmo tempo, rejeitam a criação de um novo imposto nos moldes da extinta Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) para financiar a saúde. Nenhum deles, porém, apresenta propostas objetivas para colocar as ideias em prática.Remetidas ao passado, as sugestões colocam o trio em xeque. Aprovada em 2000, a Emenda 29 fixou os porcentuais mínimos do orçamento que devem ser gastos com saúde pela União (10%), estados (12%) e municípios (15%). Há dez anos, contudo, a aplicação efetiva do texto espera pela aprovação de uma lei complementar, emperrada no Congresso.Nesse período, os governos Lula (PT) e Fernando Henrique (PSDB) nunca se empenharam a favor da votação. Já a CPMF, criada na gestão tucana, em 1997, sobreviveu a todo primeiro mandato de Lula e só deixou de ser cobrada porque teve a renovação barrada pelo Senado em 2007. Ministro da Saúde entre 1998 e 2002, Serra não se opôs ao imposto do cheque, assim como os também ministros petistas Dilma (Minas e Energia e Casa Civil, entre 2003 e 2010) e Marina (Meio Ambiente, entre 2003 e 2008)."Por que nenhum dos dois governos e seus ministros não defenderam o fim da CPMF? [Dizer que são contra] É muito mais um discurso para consumo externo do que aquilo que eles propriamente acreditam", diz o presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), Francisco Batista Júnior. Ele é um dos defensores da Contribuição Social para a Saúde (CSS), tributo parecido com a CPMF e embutido na lei complementar de regulamentação da Emenda 29, aprovada pela Câmara dos Deputados em 2008 e que ainda precisa passar pelo Senado.
Se aprovada, a CSS terá a alíquota de 0,1% sobre as movimentações financeiras, ficando isento o assalariado com renda mensal inferior a R$ 3.080. O plano é arrecadar cerca de R$ 10 bilhões ao ano, destinados integralmente à saúde. A CPMF tinha alíquota de 0,38%, gerava cerca de R$ 40 bilhões ao ano e era destinada a outras duas áreas, previdência e assistência social.
"O problema é que a população ficou contra a CPMF porque comprou a ideia de que já se paga muito imposto no Brasil. Mas não há economista no mundo que comprove o impacto ruim de uma alíquota de 0,1% sobre movimentação financeira", diz Batista Júnior. Ele admite, no entanto, que o problema da saúde não será resolvido apenas com mais dinheiro ou com a regulamentação da Emenda 29.
Em março, o CNS apresentou ao Ministério da Saúde um estudo com oito ideias para melhorar o sistema. Elas nasceram de uma caravana promovida pelo conselho que durou oito meses e visitou 24 estados no ano passado.
As propostas priorizam a prevenção de doenças, a profissionalização da gestão dos serviços, a criação de uma carreira única para todos os profissionais da saúde e do "serviço civil" em saúde. A novidade funcionaria nos moldes do serviço militar e aproveitaria os profissionais da área formados por universidades públicas para trabalhar por dois anos no Sistema Único de Saúde (SUS).
O ex-ministro da Saúde e atual deputado federal Alceni Guerra (DEM) concorda que o modelo precisa ser aprimorado. "É um modelo velho e burro." Segundo ele, é preciso encontrar formas de valorizar a qualidade do atendimento. Ele sugere a adoção do modelo de contratos de gestão já utilizados em Minas Gerais e em Curitiba. "Quem trabalha mais e melhor tem de ser recompensado", explica.
Batista Júnior e Alceni dizem ainda que a solução para o financiamento da saúde seria alterar a política monetária e reduzir o valor destinado para pagamento dos juros da dívida externa. "Não estou aqui defendendo o calote, mas uma nova forma de pensar as contas. Em três meses, o governo gasta com os juros tudo o que gasta em um ano na saúde", afirma o presidente da CNS. A mudança nessas contas não foi defendida por nenhum dos candidatos até agora.