Todos os anos, milhares de brasileiros com hepatite B deixam de ser tratados por não saber que têm a doença, uma inflação no fígado provocada por vírus. Faltam testes certificados no país para medir a carga viral no organismo, e a sociedade é mal informada. Além disso, enquanto medicamentos modernos para o tipo C da doença já são encontradas na rede pública de saúde, o governo oferece apenas um tratamento ultrapassado para a hepatite B.
- Seguramente, estamos deixando de tratar muita gente que deveria ser tratada disse ao GLOBO ONLINE o hepatologista Raymundo Paraná, coordenador do X Simpósio Internacional de Terapêutica em Hepatite Viral, que começou na quinta-feira, em Salvador.
A hepatite B, segundo o especialista, vem diminuindo nas grandes cidades, onde é melhor o acesso aos tratamentos e há mais informação. Nas áreas rurais, porém, os índices de contágio chegam a 2% da população. No simpósio, são discutidas alternativas, como a combinação de medicamentos, e novas abordagens para a doença.
- Médico brasileiro que lida com hepatite B é um herói resume.
A hepatite B provoca menos mortes que o tipo C, mas atinge cronicamente ao menos dois milhões de pessoas no Brasil, e 400 milhões no mundo, de acordo com o Ministério da Saúde e a Organização Mundial de Saúde. No país, a doença é transmitida principalmente através de relações sexuais, em que as chances de contágio são 40% maiores que a do HIV. Muito resistente, o vírus da hepatite B é capaz de sobreviver a até sete dias de exposição ao ambiente, mas há vacina contra ele disponível na rede pública, segundo Paraná.
Déficit em investimentos é de R$ 5 bi
O secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, Gérson Pena, reconhece que o tratamento para a hepatite ainda não foi universalizado no Brasil. Ele critica a falta de investimentos, afirmando que o déficit de incorporação tecnológica no país subiu de R$ 500 milhões em 1996 para R$ 5 bilhões hoje.
- Nós estamos tratando parte dos pacientes e não estamos levando o tratamento a todos que merecem e precisam disse, na abertura do simpósio.
De acordo com o coordenador do congresso, que reúne mais de 400 especialistas brasileiros e estrangeiros, já é possível afirmar que a hepatite C tem cura, mas o tratamento do tipo B ainda precisa avançar e sofreu uma "mudança de paradigmas" nos últimos cinco anos. Um dos maiores problemas destacados por Paraná é a ausência de um teste registrado no Brasil para avaliar a carga viral dos pacientes.
Custos altos, métodos inválidos
O uso da tecnologia estrangeira em larga escala é inviável, segundo ele, já que cada exame custa US$ 200. Hoje os testes são feitos "in house" por instituições de pesquisa brasileiras, como o Instituto Adolfo Lutz e a Fundação Oswaldo Cruz, que ainda não conseguiram validar seus métodos junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária. A solução apontada pelo hepatologista seria o lançamento de um edital para que esses estudos fossem reunidos e, assim, padronizados de acordo com o sistema mundial.
- O ministério tem que tomar uma decisão política. Já existem testes validados assim afirma Paraná, para quem a avaliação dos pacientes no Brasil é prejudicada por ter que ser feita de forma "intuitiva".
O preço dos medicamentos mais modernos também é um entrave para a universalização do tratamento da hepatite B. O governo oferece apenas a lamivudina, produzida pelo laboratório Farmanguinhos ao custo de centavos por cada comprimido. Apesar de eficaz, a droga não é capaz de evitar o desenvolvimento de resistência do vírus e não é a primeira opção de tratamento em outros países. Entre os medicamentos mais potentes e com menos resistência Paraná lista o entecavir e a telbivudina, mas os comprimidos custam em torno de R$ 50.
O hepatologista não acredita que a melhor opção para aperfeiçoar o tratamento seja a solução adotada no caso da Aids, em que o Brasil aprovou a quebra de patentes de remédios. A medida, para ele, "não é boa para ninguém, muito menos para o país, que perde respeitabilidade e investimentos". Paraná acredita, porém, que o governo está no rumo certo:
- O Brasil tem negociado com sabedoria.
* A repórter Luisa Guedes viajou a convite da Bristol-Myers Squibb.
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