Educação
Novo modelo tiraria a autonomia das sete universidades estaduais
Outro ponto questionado em relação ao Sigerfi diz respeito à perda de autonomia das sete universidades estaduais, que está garantida na legislação brasileira. Isso porque o decreto que regulamentou a conta única coloca todo o poder de gestão dos recursos nas mãos do secretário da Fazenda, Luiz Carlos Hauly. Para ter acesso aos seus próprios recursos, as universidades precisarão fazer uma solicitação prévia à pasta com um dia de antecedência.
Para Cesar Caggiano Santos, ex-reitor da UEL e professor de Física da instituição, esse procedimento vai dificultar a gestão das estruturas do estado, ao torná-la mais lenta. "A conta única não dá a fluidez necessária para que os recursos públicos sejam bem gastos. Ao contrário, torna a coisa muito mais lenta, torna o processo mais difícil para que se consigam as coisas", avalia. "Corre-se ainda o risco de o estado não gastar o que precisa ser gasto em cada área. É uma estratégia de alto risco", disse.
A opinião é compartilhada pelo advogado Luciano Elias Reis, especialista em Direito Administrativo. "O que diferencia uma entidade descentralizada das secretarias, por exemplo, é a autonomia administrativa e financeira. A partir do momento em que se retira isso, a figura da entidade descentralizada se enfraquece; antes fosse um órgão como os outros."
15 fundos especiais fazem parte do sistema de conta única do governo do estado e, por lei, precisam receber uma porcentagem mínima das receitas estaduais. A dúvida dos críticos é como isso será fiscalizado a partir de agora.
O histórico da execução orçamentária do governo do Paraná mostra que um dos maiores riscos apontados pelos críticos ao recém-criado Sistema de Gestão Integrada dos Recursos Financeiros do Estado (Sigerfi) o caixa único estadual pode de fato já estar ocorrendo. Desde 2005, o Tribunal de Contas do Estado (TC) alerta que nem toda verba do Executivo com destinação específica prevista em lei é aplicada onde deveria. Com a conta única, em que todo o dinheiro estará "misturado", esses recursos poderão ser gastos da forma como o governo quiser e não serem repostos. Isso ocorre no Rio Grande do Sul há 14 anos, a ponto de o déficit nas contas públicas gaúchas ter atingido R$ 2 bilhões.
Regulamentado na última terça-feira, o Sigerfi vai gerir todas as receitas e despesas do Executivo estadual numa única superconta bancária. Integrantes do próprio governo admitiram que, diante das dificuldades financeiras do estado, essa foi a forma encontrada para permitir o remanejamento de dinheiro dentro do caixa. A regulamentação da lei, porém, não cita em nenhum momento como se dará a garantia de que recursos com destinação específica como verbas destinadas à saúde, educação, segurança pública e meio ambiente, por exemplo não serão usados em outras áreas. E, se isso ocorrer, como serão repostos.
Nos relatórios de análise das contas do governo desde 2005, o TC aponta reiteradamente irregularidades na gestão dos fundos especiais, que, por lei, "se vinculam à realização de determinados objetivos ou serviços". Classificando como "sofrível" o desempenho dos fundos em 2011, já na gestão Beto Richa (PSDB), o tribunal afirma que o Executivo não realiza "o repasse integral dos recursos que compõem as receitas previstas nas respectivas leis" que criaram os fundos a média histórica é de 70%. Alertando para o "descaso" com que são tratados os fundos especiais, a corte determinou que o governo reavalie a utilização desses recursos.
Críticas
Presidente da Comissão de Gestão Pública e Controle da Administração da OAB do Paraná, o advogado Luciano Elias Reis diz ter uma enorme preocupação em relação ao modo como o caixa único vai gerir as verbas dos fundos especiais. Segundo ele, desvirtuar a finalidade do dinheiro público atrelado a um fim específico é uma falha gravíssima. "A conta única deixa uma probabilidade para que isso ocorra, além de criar o risco de os recursos não serem devolvidos", alerta.
Já a representante da OAB estadual no Fundo Penitenciário (Fupen) um dos 15 que compõem o Sigerfi , a advogada Isabel Kügler Mendes classifica a criação do Sigerfi como absurda e diz que levará o debate sobre a legalidade da medida à próxima reunião do grupo. Ela questiona, por exemplo, como passará a ser feita a prestação de contas dos cerca de R$ 3 milhões mensais administrados pelo Fupen, que é "rigorosa ao ponto de detalhar gastos de alguns centavos apenas". "Como vamos aprovar essas contas? E se o dinheiro do fundo for autorizado para outro fim?", compara.
Outro lado
Richa defende método e cita exemplo do governo federal
Na última quarta-feira, o governador Beto Richa (PSDB) defendeu a criação do caixa único estadual e afirmou que o mesmo modelo é adotado pelo governo federal desde 1987. Segundo ele, o sistema vai "otimizar" e dar mais "transparência e racionalidade" aos gastos públicos. "As acusações [contra a conta única] são indevidas, sem sentido. O governo federal utiliza esse modelo há 20 anos, e nunca houve problema. Pelo contrário, é um avanço", afirmou. "Não há o que temer. Qualquer erro, o governo e eu, pessoalmente será responsabilizado por isso."
No entanto, o desvio de finalidade apontado pelo TC desde 2005 em relação ao uso dos recursos dos fundos especiais paranaenses, por exemplo, não teve qualquer implicação efetiva ao gestor. Isso porque o tribunal nunca reprovou as contas do Executivo em sua história. Via de regra, a corte aprova os números com algumas ressalvas e determinações.
Já o secretário Luiz Carlos Hauly, em entrevistas à Gazeta do Povo, defendeu que o novo sistema vai servir para modernizar e tornar mais transparentes as contas públicas de todo o Paraná com relação às prestações que devem ser feitas ao governo federal.
Outro argumento é que, ao centralizar todas as verbas numa única conta, é possível negociar com os bancos uma remuneração de juros maior.
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