Anna Hazare, líder do movimento: 12 dias de greve de fome não bastaram para que agência anticorrupção fosse criada| Foto: Raveedran/ AFP

Sistema de castas ainda interfere na política

Em 2009, os brasileiros ficaram mais familiarizados com o sistema de castas indiano por meio da novela Caminho das Índias, da Rede Globo. A produção mostrava as dificuldades enfrentadas pelos "dálits", membros de castas inferiores considerados "intocáveis". Durante a trama, uma das personagens da casta inferior entrou para a política e conseguiu se eleger concorrendo contra um adversário de uma linhagem superior.

"Apesar de a questão das castas ser vedada pela Constituição da Índia, ela ainda é uma prática comum, inclusive na política. Há exceções mais recentes, mas o sistema exclui politicamente centenas de milhões de indianos", diz o professor de Direito Internacional Cláudio Lopes Preza Júnior, da PUCRS.

Nem a luta contra o preconceito, porém, afasta os escândalos políticos. No ano passado, foi revelado que a primeira mulher dálit a se tornar ministra-chefe de um dos 28 estados indianos (Uttar Pradesh), Mayawati Kumari, usou um jato público para buscar um par de sandálias na maior cidade do país, Mumbai. De acordo com o vazamento de mensagens diplomáticas feito pelo site Wikileaks, o avião viajava sozinho apenas para buscar o calçado da marca que agradava Mayawati.

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Ao mesmo tempo em que o Brasil discutia a Lei da Ficha Limpa e a de Acesso à Informação Pública, em 2011, a Índia foi palco das maiores manifestações populares desde a independência, em 1947. Milhões de pessoas se mobilizaram pela criação de uma agência de combate à corrupção no poder público. O grupo tinha como líder o ativista Anna Hazare, 75 anos, que ficou 12 dias em greve de fome, em agosto.

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Ele só interrompeu o jejum após o Congresso indiano colocar a proposta em pauta. Inspirado no pacifismo de Mahatma Ghandi, Hazare articulou o trabalho de organizações não governamentais para colocar os parlamentares contra a parede. Virou herói nacional, mas nem toda notoriedade e comoção social gerada encerrou o assunto.

Após ser aprovado pela Lok Sahba (Câmara dos Deputados), em dezembro, a tramitação do projeto emperrou na Rajya Sahba (equivalente ao Senado). Hazare começou uma nova greve de fome, mas teve de suspendê-la depois de um dia por problemas de pressão e nos rins. Na época, 150 seguidores estavam preparados para acompanhar o ativista em um jejum coletivo.

Na proposta defendida por ele, a Lokpal (agência de combate à corrupção) seria comandada por um ouvidor nacional. O órgão seria totalmente independente do governo e os membros seriam nomeados pela Justiça. Todas as investigações de corrupção durariam no máximo um ano e quem fosse considerado culpado deveria ressarcir os cofres públicos imediatamente após a condenação.

A criação da Lokpal é discutida na Índia desde 1968 e passou por oito tramitações distintas no Congresso. De acordo com o cientista político David Fleischer, membro da Transparência Brasil, uma estrutura idêntica já foi discutida no Brasil no começo da década passada. "Quando era candidato, em 2002, Lula prometeu que implantaria a agência por conta própria."

Na mesma linha, a lei de Acesso à Informação só foi aprovada no Brasil no ano passado e vai passar a vigorar a partir de maio. Na Índia, a lei foi aprovada pelo Congresso em 2005 e passou a valer no ano seguinte.

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