O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), condenou a multa de um salário mínimo, por litigância de má-fé, os advogados Melina Girardi Fachin, Marcos Alberto Rocha Gonçalves e Carlos Eduardo Pianovski, do escritório Fachin Advogados Associados. Melina é uma das duas filhas do ministro Edson Fachin, colega de Barroso no STF.
Gonçalves é casado com Melina. Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, por telefone, ele disse que achou “errada” a decisão de Barroso, e que “faria tudo de novo”. Disse, também, que Melina não iria falar a respeito. Dois dias depois, mandou uma nota: “Nosso escritório é tratado no STF e em todas as cortes como qualquer outro. Sem privilégio ou preconceito e é assim que deve ser. Decisões favoráveis e desfavoráveis fazem parte do trabalho de todo advogado”. Procurados, os ministros Edson Fachin e Luis Roberto Barroso preferiram não se manifestar.
A decisão do ministro Barroso foi tomada na Reclamação 23959/Paraná, em 24 de maio do ano passado. Representando a Itaipu Binacional, cliente do escritório, os três advogados reclamaram ao Supremo de um acórdão do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Este acórdão rejeitou um recurso especial dos advogados (número 1.239.899, também em defesa da Itaipu Binacional). Eles alegaram ao STF, entre outras razões, que o STJ “usurpara competência do Supremo”.
Barroso arguiu, em sua decisão, a “manifesta inviabilidade” da reclamação. Primeiro, explicou, pela perda do prazo. E, segundo, por não terem juntado aos autos peças essenciais, como o acórdão recorrido. São erros primários no exercício da advocacia. Depois de negar seguimento à reclamação, Barroso considerou “que o uso de meios processuais manifestamente inadmissíveis gera efeitos danosos à prestação jurisdicional, tomando tempo e recursos escassos desta Corte, causando, ainda, prejuízos à parte contrária”. Então, condenou os reclamantes ao pagamento de multa por litigância de má-fé. Não houve recurso por parte dos advogados, e o caso transitou em julgado em 21 de junho do ano passado.
Na nota enviada à reportagem, Marcos Gonçalves, o genro de Fachin, afirma que “a parte reclamante condenada (a Itaipu Binacional) não se confunde com a esfera subjetiva dos advogados que a defendem”. Diz, ainda, que “a aplicação da multa é imposta pela lei, diante do entendimento de que o meio processual intentado é inadmissível; não se confunde com juízo de valor comportamental”. Diz, ainda, que o texto da decisão de Barroso é idêntico a “dezenas de decisões” de sua relatoria.
O Fachin Advogados Associados, escritório com sede em Curitiba, foi fundado há dez anos pelo advogado Luiz Edson Fachin. Quando entrou para o Supremo, em junho de 2015, o ministro se desincompatibilizou e passou-o à filha. Mesmo assim, continua a figurar no site como ministro-propaganda do escritório: “Criado em 2006 pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Edson Fachin, o bureau Fachin Advogados Associados preserva em seu DNA os princípios do seu fundador: ‘independentemente das posições pessoais, ter respeito ao sistema de regras, de princípios e de restrições, e a defender as garantias e os direitos individuais’”.
Paraguai
Uma pesquisa no site do STF mostra que a advogada Melina Girardi Fachin e seus sócios do Fachin Advogados Associados têm alguns outros processos no STF, além da reclamação 23959. Em três deles – as Ações Originárias 1905, 1907 e 1957, do Ministério Público Federal, todas relatadas pelo ministro Marco Aurélio –, representam a ré República do Paraguai, na condição de assistente, como sócia, da ré principal Itaipu Binacional, esta representada pelo advogado Tiago Cedraz Leite Oliveira.
Filho do ex-presidente do TCU Aroldo Cedraz, Oliveira está sendo investigado pela Operação Lava Jato – relatada, no Supremo, justamente pelo ministro Edson Fachin. “Não existe nenhuma conexão entre nós e ele”, disse o advogado e genro Marcos Gonçalves. “Advogamos para a República do Paraguai, que é sócia da Itaipu Binacional, e portanto interessada no resultado da causa. Nunca houve e não há qualquer relação com o outro advogado”. Tiago Cedraz foi procurado, mas não deu retorno.
O Fachin Advogados Associados atua na causa, pelo governo do Paraguai, sócio da Itaipu Binacional, desde 2003. É um caso complexo em que se discute se a hidrelétrica, com sócio estrangeiro, deve ou não ser fiscalizada pelo TCU. Foi a atuação de Edson Fachin, lá atrás, que conseguiu levar o caso para o STF, muito antes que ele pensasse que um dia chegaria lá.
Quando foi indicado, em 2015, surgiu a denúncia de que não poderia ter atuado no caso por ser servidor federal concursado. O candidato a ministro provou, então, que uma lei federal validava sua atuação. Quando assumiu o Supremo, o caso, como os demais em que atuava, foi herdado pelo Fachin Advogados Associados e até hoje tramita por lá.