Um dos projetos prioritários da agenda do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o da lei que tipifica crimes de abusos de autoridades foi duramente criticado na noite desta quarta-feira pelo juiz Sergio Moro.
Em palestra na abertura do encontro nacional de procuradores jurídicos da Federação das Apaes, em Brasília, o juiz da operação Lava Jato fez um apelo para que os senadores rejeitem ou remodelem a redação atual que, segundo ele, é um retrocesso preocupante e pode ser usado para intimidar juízes, procuradores e autoridades policiais que investigam “poderosos”.
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Leia a matéria completaAo citar a importância de não só avançar além da Lava Jato no combate à corrupção sistêmica, com aprovação das dez medidas em análise na Câmara, Moro fez um alerta para o risco de se evitar retrocessos “que muitas vezes estão atrás da porta a nos surpreender”. Passou então a explicar do que se trata o projeto do abuso de autoridades que está na pauta de votações do Senado.
“É muito preocupante. Não que abusos de autoridades não devam ser punidos, ninguém é contra isso. A proposta inicial talvez fosse positiva, mas a redação atual da lei, na forma que está colocada sugere a possibilidade da sua utilização para intimidação de juízes, procuradores e autoridades policiais, não por praticarem abusos, mas por cumprirem seu dever com independência em processos envolvendo figuras poderosas”, alertou Moro.
Ao criticar o projeto, Moro fez um apelo para que os senadores tenham sensibilidade e o rejeitem ou remodelem a atual redação para evitar sua “utilização indevida”.
Para uma plateia formada por dirigentes e procuradores das Apaes , Moro anunciou que não tinha muita informação sobre o setor, mas que falaria sobre o que faz. A mestre de cerimônia era sua mulher, Rosângela Moro, procuradora jurídica da Federação das Apaes. Ele fez uma retrospectiva da operação Lava Jato desde a prisão do doleiro Alberto Yousseff, prisão dos diretores da Petrobras que levaram ao desmonte do Petrolão e a devolução de bilhões de recursos desviados.
Ao falar da enormidade dos valores devolvidos pelos diretores presos da Petrobras, Moro observou que a regra do jogo era o pagamento de propina e a “ganância” dos dirigentes da empresa. Sem citar nominalmente Pedro Barusco, citou o seu caso, em que chegou a devolver US$ 98 milhões.
“Isso leva a uma indagação: até quanto se acha necessário cobrar propina? A pessoa cobrava 10, 20 milhões e não parava. Um real de propina já é errado , mas talvez pelo instinto da ganância. A praxe era pagar e a regra do jogo receber”, disse Moro.
Ele citou o caso da compra de Pasadena, dizendo que talvez o prejuízo seja ainda maior que a propina paga. “Há um testemunho que diz que a refinaria foi adquirida propositalmente por ser velha, porque as obras de reforma gerariam ainda mais propina”, disse.
Moro citou o caso da prisão de um agente do Carf, ao tentar cobrar propina do Banco Itaú, como um indicativo “alvissareiro” de que a Lava Jato já esteja gerando uma mudança de comportamento na sociedade e nas empresas.
“Temos que continuar trabalhando. Não sei se essa conduta do Itaú foi um efeito colateral do que vem acontecendo no país nos últimos dois anos. Acima de tudo precisamos de uma sociedade e um setor empresarial mais honestos.”
Moro não falou das investigações sobre o Lula. No final do evento, os participantes enviaram perguntas, mas ninguém tocou no caso que envolve o ex-presidente. “Ninguém perguntou e se perguntassem eu não falaria, porque é um caso pendente”, afirmou o juiz.
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