O juiz Sergio Moro afirmou ao Supremo Tribunal Federal (STF) que a divulgação dos áudios do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, inclusive o telefonema com a presidente Dilma Rousseff (PT), não teve motivação político-partidária nem tinha o objetivo de criar polêmicas ou conflitos.
O juiz admite que pode ter errado no entendimento jurídico adotado no caso, mas pede, em três momentos no texto, “respeitosas escusas” ao Supremo por ter dado publicidade ao material. Apesar disso, no documento, Moro afirma que decidiu pela publicidade dos áudios considerando que alguns deles caracterizam tentativa de obstrução à Justiça e intenção de “intimidar as autoridades responsáveis pela investigação e processo”.
“Para sintetizar esses atos e tentativas, relembro aqui o diálogo acima transcrito do ex-Presidente no qual, ao referir-se aos responsáveis pelos processos atinentes ao esquema criminoso da Petrobras e ao que deveria ser feito em relação a isso, disse, sem maiores pudores, que ‘ELES TÊM QUE TER MEDO’. Não se trata de uma afirmação que não gere naturais receios aos responsáveis pelos processos atinentes ao esquema criminoso da Petrobras”, escreve Moro no final do ofício.
Segundo o magistrado, a derrubada do sigilo das escutas feitas pela força-tarefa da Lava Jato também foi provocada porque ele avaliou que “não haviam sido alcançadas condutas criminais” das autoridades com foro privilegiado que foram alcançadas nas gravações e que só podem ser investigadas com aval do Supremo.
Lula e Dilma
Sobre as conversas de Lula envolvendo Dilma, o juiz disse que “no momento, de fato, não percebidos eventuais e possíveis reflexos para a própria Exma. presidente da República”. Sobre o último áudio com Dilma, interceptado depois de decisão pela interrupção das escutas, Moro explica que não havia “atinado” para o horário da conversa, o que motivou novo despacho.
“Quanto ao conteúdo, da mesma forma que os demais, entendeu este julgador que ele tinha relevância jurídico-criminal para o ex-Presidente, já que presente a apuração se a aceitação por ele do cargo de Ministro Chefe da Casa Civil teria por objetivo obter proteção jurídica contra as investigações”, justifica o magistrado sobre a manutenção do diálogo nos autos do processo. Na conversa, a petista diz a Lula que encaminharia a ele o termo de posse do petista para que fosse usado em “caráter de necessidade”.
Moro aponta no ofício que Dilma negou publicamente o caráter ilícito do diálogo, mas questiona a atitude da presidente, dizendo que, “se o referido diálogo não tinha conteúdo jurídico-criminal relevante”, não havia necessidade de antecipar a posse de Lula como ministro. A posse ocorreria no dia 22/03, mas acabou antecipada para o dia 17, um dia após a divulgação dos áudios.
Citando outro diálogo entre Lula e Dilma, em que o ex-presidente aponta que o STF, o Superior Tribunal de Justiça e o parlamento estão “acovardados” com o avanço da operação Lava Jato, Moro indica que não houve manifestação da presidente com o mesmo propósito, o que não justificaria remessa do diálogo ao STF. “Apesar disso, pela relevância desse diálogo para o investigado, não há falar em direito da privacidade a ser resguardado, já que ele é relevante juridicocriminalmente para o ex-Presidente”, aponta o juiz.
Obstrução à Justiça
A resposta de Moro ocorre sobre pedido do ministro Teori Zavascki que, na semana passada, determinou que as investigações sobre Lula fossem remetidas ao STF e pediu explicações ao juiz sobre a divulgação dos áudios. Em vários trechos do ofício , Moro defende que a publicidade “era a melhor maneira de prevenir novas condutas ou tentativas de obstrução ou intimidação da Justiça” pelo ex-presidente Lula.
O magistrado cita exemplos de conversas interceptadas pela Polícia Federal, que, segundo ele, revelam tentativas do ex-presidente de obstrução à Justiça e intenção de “intimidar as autoridades”. Entre elas, estão conversas entre Lula e o advogado Roberto Teixeira, em que a ministra do STF Rosa Weber é citada. Ela era responsável por apreciar um pedido da defesa de Lula de remeter a ação ao Supremo.
Em outra conversa, com o ex-ministro Paulo Vannuchi, Moro indica que Lula reclama da atuação do então Subprocurador da República, Eugênio Aragão. O juiz cita ainda que, conforme o diálogo, o ex-presidente teria intenção de utilizar parlamentares federais para intimidar um procurador responsável pela investigação da atuação de Lula em contratos do BNDES.
Moro aponta ainda os áudios em que Lula conversa com o presidente do PT, Rui Falcão, em que revela saber antecipadamente que haveria busca e apreensão em sua residência e de seus filhos. Para o juiz, o petista “aparentemente revela intenção de convocar parlamentares federais para aguardarem no local das buscas, a fim aparentemente de obstruí-las ou de constranger os agentes policiais federais”.
Apesar de transcrever parte dos diálogos, considerando que os áudios são “relevantes”, Moro aponta no ofício que não há nenhuma prova ou indício de que autoridades com foro tenham cedido às solicitações indevidas de Lula. Assim, conforme Moro, não haveria necessidade de remeter os autos para o STF.