Nove respondem por suposto esquema de compra de draga
Depois de mais de um ano da deflagração da Operação Dallas, o Ministério Público Federal (MPF) denunciou em maio de 2012 nove pessoas pelos crimes de fraude em licitação e corrupção ativa e passiva: os ex-superintendentes da Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina (Appa) Eduardo Requião e Daniel Lúcio Oliveira de Souza; os empresários Alex Hammoud, Gilberto Nagasawa Tanaka e Luís Mussi, que também é suplente do senador Roberto Requião (PMDB); os ex-funcionários da Appa Jessé Bezerra da Silva e Maurício Vitor de Souza; o ex-chefe de gabinete de Roberto Requião, Carlos Augusto Moreira Júnior; e o advogado Sérgio Luis Fernandes este último só responde pelo crime de corrupção.
O caso não veio à tona na época da denúncia porque todo o processo tramita em sigilo na Justiça Federal de Paranaguá. A Gazeta do Povo teve acesso ao processo que está em fase de tomada de depoimentos de testemunhas que antecede as alegações finais das partes e a sentença.
Na denúncia, o procurador da República Alessandro José Fernandes de Oliveira descreve um esquema envolvendo agentes públicos e empresários supostamente montado para fraudar a licitação milionária que previa a compra de uma draga, no valor de R$ 46,5 milhões, para executar a dragagem do Porto. Este serviço consiste no aprofundamento do calado do "Canal da Galheta" permitindo que embarcações maiores possam atracar em Paranaguá. Uma perícia, que consta nos autos, elenca 32 itens que, para o MPF, comprovam que os denunciados tentaram comprar uma draga deteriorada.
Durante as investigações, a PF interceptou com autorização judicial ligações e troca de e-mails dos denunciados o que embasou a denúncia. O procurador narra que, antes mesmo de abrir a licitação, Hammoud já trocava mensagens com Daniel Lúcio, então superintendente da Appa, oferecendo opções de dragas.
Aberto o processo licitatório, duas empresas foram classificadas uma delas a Global Connection Comercial LTDA, que tinha justamente Hammoud como um dos donos, em sociedade com Mussi. O preço oferecido pela Global era superior em R$ 2 milhões da concorrente; mesmo assim, a empresa de Hammoud foi declarada vencedora. A assinatura do contrato e o pagamento de R$ 46,5 milhões só não foram concretizados porque a empresa derrotada conseguiu barrar o processo judicialmente. Com o revés na Justiça e depois de tentar reverter a situação, diz o MPF, os denunciados arquitetaram um plano B: fazer com que a Global entrasse na Justiça com um pedido de indenização contra a Appa em razão do dano material que estaria sofrendo com a aquisição da draga. Esses recursos, diz o MPF, ficariam com os denunciados. "De fato, a ganância dos denunciados, com vista ao ganho fácil às custas do erário não tinha limites", cita o procurador na denúncia.
Dallas
A operação da PF não se restringiu apenas a apurar a licitação da draga. Foram investigados os crimes de desvio de cargas a granel destinadas à exportação, favorecimento de empresas responsáveis pela retirada de resíduos do Porto de Paranaguá, corrupção ativa e passiva, desvio de dinheiro público, superfaturamento e formação de quadrilha. Segundo a Receita Federal estimou à época, apenas os desvios de carga podem ter lesado os cofres públicos em até R$ 8,5 milhões. O MPF desmembrou a operação Dallas em cinco inquéritos que tramitam na Justiça Federal.
O ex-superintendente da Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina (APPA) Eduardo Requião está sendo investigado pelo Ministério Público Federal (MPF) do Paraná por suspeita de lavagem de dinheiro e/ou ocultação de bens. O inquérito, que tramita na 2.ª Vara Federal Criminal de Curitiba, é um desdobramento da Operação Dallas, deflagrada pela Polícia Federal em 2011 para apurar supostas fraudes cometidas no Porto de Paranaguá. Entre as possíveis ilicitudes detectadas pela PF na época está a suspeita de fraude na licitação da compra de uma draga no valor de R$ 45,6 milhões que, segundo o MPF, renderia cerca de R$ 10 milhões para os denunciados, sendo que metade ficaria para Eduardo Requião.
O MPF denunciou Eduardo Requião e outras oito pessoas pelos crimes de fraude em licitação e corrupção ativa e passiva. A Gazeta do Povo teve acesso com exclusividade a toda a ação penal que corre em sigilo na Justiça Federal de Paranaguá (veja matéria ao lado). O MPF abriu investigação contra Eduardo Requião por suspeita de lavagem e ocultação de bens depois que a PF encontrou na casa do ex-superintendente em Curitiba, durante mandado de busca e apreensão, um talão de cheque do Bank United, com sede em Miami, na Flórida, nos Estados Unidos.
Os procuradores suspeitam ainda que Eduardo Requião pode ter usado a mulher e um dos filhos como "laranjas para possível [crime] de lavagem de dinheiro" já que são eles, segundo o MPF, os titulares da conta bancária no Bank United. O MPF salienta, no entanto, que esta investigação não tem conexão com os ilícitos detectados na Dallas, já que a compra da draga objeto da suposta licitação fraudada não foi efetivada. Mas o MPF tem indícios que demonstram a "existência de movimentação cambiária de grande monta" entre Eduardo Requião e o empresário paraguaio Alex Hammoud dono da empresa que venceu a licitação para a compra da draga.
Numa conversa telefônica captada pela PF com autorização judicial, Hammoud diz ao ex-superintendente da Appa, Daniel Lúcio Oliveira de Souza, que já guardou uma grande importância em dinheiro para Eduardo Requião. "Ele se comprometeu comigo de uma maneira, ele inclusive uma vez me entregou uma soma grande de dinheiro, assim: Alex, toma, guarda pra mim, guardei um tempo, Alex devolve, devolvi. Então, não tinha por que fazer isso, e parte de tudo que távamos (sic) fazendo era cinquenta por cento pra ele e eu ia cumprir com isso", transcreve o MPF na denúncia. Em outro trecho o MPF reproduz o diálogo que sugere que Eduardo Requião ficaria com US$ 2,5 milhões com a venda da draga. "Tá bom, então, vai sobrar dois e meio, eu tinha acertado com o Eduardo, dólares, dois e meio dólares", diz Hammoud para Daniel Lúcio.
Armas
O mandado de busca e apreensão na casa de Eduardo Requião resultou ainda num outro inquérito aberto pela PF. Na casa dele, agentes da PF apreenderam cerca de dez armas, entre elas pistolas, revólveres e dois fuzis. A Delegacia de Repressão ao Tráfico Ilícito de Armas (Delearm) investigou o caso e a PF indiciou Eduardo Requião por posse ou porte ilegal de arma de fogo e munição. O caso tramita na 2.ª Vara Federal Criminal de Curitiba. A Gazeta do Povo apurou que a investigação ainda está em curso e que Eduardo Requião já foi ouvido. Caso seja condenado pelos dois crimes, ele pode pegar de quatro a nove anos de prisão e ainda pagar multa.
Envolvidos não comentam as acusações
Nenhum dos denunciados pelo Ministério Público Federal (MPF) no processo envolvendo a suposta fraude na licitação da compra da draga quis comentar o caso. Os advogados de dois deles atenderam a reportagem, os demais disseram que não poderiam se manifestar porque o processo tramita em segredo de Justiça.
Francisco de Assis do Rêgo Monteiro Rocha Júnior, que defende o ex-superintendente do Porto de Paranaguá Daniel Lúcio Oliveira de Souza, afirmou que o cliente é inocente de todas as acusações. Rocha Júnior afirmou que o cliente teve o telefone interceptado por um longo período e que o MPF teria selecionado trechos da conversa.
"O superintendente é uma pessoa pública, com grande representatividade política, que efetivamente conversava com estivadores até grandes grupos econômicos os quais levavam suas respectivas demandas", diz. "Agora é fácil monitorar por longo tempo e selecionar trechos para imputar essa acusação de fraude em licitação", criticou o advogado. Sobre a acusação de que o Porto compraria uma draga deteriorada, Rocha Júnior afirmou que o MPF se manifestou contrário à realização de uma nova perícia. "A draga está na China em franco funcionamento", justificou.
A advogada Úrsula Boeng, que defende Sérgio Luis Fernandes, afirmou que o Tribunal Regional Federal (TRF) da 4.ª Região, trancou parte da ação penal contra ele no que dizia respeito à acusação de fraude na licitação. A defesa sustentou que o cliente teve atuação exclusivamente judicial sendo contatado pela empresa Global Connection Comercial LTDA para derrubar a liminar que impedia a assinatura do contrato com o Porto. Desta maneira não atuou em qualquer estágio da licitação. A advogada disse ainda que recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) para tentar trancar também a parte do processo que trata da acusação de corrupção.
Roberto Brzezinski Neto, que advoga para Eduardo Requião e Luis Mussi, afirmou que não poderia se manifestar sobre as acusações porque o processo tramita em segredo. A mesma justificativa foi dada pelo ex-funcionário do Porto Jessé Bezerra da Silva. Christian Laufer, que defende os empresários Alex Hammoud e Gilberto Nagasawa Tanaka, não retornou às ligações da reportagem, assim como Jeferson de Amorin, que representa Carlos Augusto Moreira Júnior. Maurício Vitor de Souza, que advoga para si próprio, não atendeu ao celular.
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