| Foto: Jonathan Campos / Gazeta do Povo

O nepotismo é um sistema político. O nepotismo é uma rede social e política de interesses. O nepotismo é uma estratégia de classes, de grupos sociais e de famílias para obtenção e preservação do poder político e da dominação da elite (....)

* * *(...) Os campeões de nepotismo todos fizeram estágio na Assembleia Legislativa (...)

* * * Redes de nepotismo no Poder Executivo são facilmente verificáveis pelos nomes influentes.

Até mesmo em políticos com formação considerada moderna, como o sociólogo Fernando Henrique Cardoso, constataram-se relações nepotistas (...)

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Serviço: Livro Na Teia do Nepotismo – Sociologia política das relações de parentesco e poder político no Paraná e no Brasil, de Ricardo Costa de Oliveira. Editora Insight (www.editorainsight.com.br).
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O cientista político Ricardo Costa de Oliveira fez uma pesquisa acadêmica que, por curiosidade, poderia ter sido realizada, de maneira mais simples, por qualquer cidadão: procurar, em matérias jornalísticas e em sites oficiais, o grau de parentesco dentre os membros dos poderes públicos. O resultado é uma coincidência de sobrenomes que cria uma teia de parentesco, podendo começar no Tribunal de Justiça, seguindo para o Palácio Iguaçu, passando pela Assembleia Legislativa e pelos cartórios paranaenses. Se a pesquisa ampliar para outras gerações, a lista vai aumentando. O resultado dessa pesquisa está exposto no livro Na Teia do Nepotismo – Sociologia política das relações de parentesco e poder político no Paraná e no Brasil, lançado no último dia 5 de dezembro e que está disponível em livrarias e bibliotecas públicas.

O senhor entende o nepotismo não somente como a nomeação de parentes para cargos públicos, mas sim de maneira mais ampla. Diversos políticos, mesmo que de épocas diferentes, que disputam e conquistam mandatos, praticam nepotismo?

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O conceito de nepotismo diz da relação entre famílias e o Estado e também a análise que investiga os clãs e linhagens, quando há uma continuidade. Essa abordagem que fiz é da sociologia histórica.

Então não é coincidência que um filho de político continue a carreira do pai?

A questão do parlamentar hereditário ocorre quando há uma continuidade do poder político, de uma geração para outra. É um conceito utilizado em várias sociedades. Na Índia a sociedade de castas tem de maneira intensiva o uso do parlamentar hereditário, que é o político que transmite o cargo, a posição política, a um parente. É a forma pela qual o poder é transferido e também as suas prerrogativas, as vantagens desse poder. O fato de uma pessoa seguir a carreira do pai não é o problema. O problema é quando temos uma concentração dos capitais sociais, uma oligarquização da instituição. O que está acontecendo com os jovens parlamentares, nossos novos deputados: há uma substantiva maioria de indivíduos ligados a famílias políticas. Se fossem alguns casos, tudo bem. Mas hoje, para entrar no Parlamento, o jovem precisa, necessariamente, ter ligação com famílias que já estão no poder.

O senhor escreve no livro que família ainda importa muito na política brasileira. Por que isso é ruim?

É visto por muitos autores, sociólogos estrangeiros, como algo negativo. Eles estudam como as instituições brasileiras são atravessadas e muitas vezes dominadas por famílias. A política brasileira ainda é formada por instituições pré-modernas, pré burocrática como é a nossa Assembleia Legislativa do Paraná. A série "Diários Secretos" mostrou isso: não há racionalidade administrativa, não há transparência ou controle público. São instituições controladas por relações pessoais.

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Na visão do nepotista, todos os indicados são pessoas preparadas para o cargo e que merecem confiança. O que o senhor acha disso?

Sempre há exceções, mas o que se verifica quando o político nepotista sai do governo é que seus parentes nomeados perdem o cargo e não conseguem um emprego da mesma altura, do mesmo gabarito. Se essa pessoa tem um currículo tão bom, deveria ter luz própria, seja na academia, ou no mundo empresarial. Deveria manter sua autonomia no mercado de trabalho.

O senhor diz que o nepotismo é um sistema político, é uma rede social. Como funciona este sistema?

É um ambiente que só pode existir em condições de grande desigualdade, carência e desestruturação. Hoje o grande foco nepotismo é na África, em função da desigualdade. Em países com alto índice de desenvolvimento humano, como na Suécia, Dinamarca, o parlamentar não tem muitas vantagens e prerrogativas. Está lá para exercer a atividade legislativas, sem grandes verbas indenizatórios, ou exército de comissionados. A sua disposição é o seu trabalho politico e legislativo. No Brasil os partidos políticos são dominados por famílias e nas instituições parlamentares também ocorre a facilidade da reprodução familiar. Existe uma estrutura política e financeira, associada a grande número de cargos em comissão e vantagens pecuniárias. Se forem cortadas essas verbas e quantidade imensa de cargos, essas instituições se tornariam mais democráticas.

No livro, o senhor diz que "os campeões de nepotismo todos fizeram estágio na Assembleia Legislativa". Por que isso?

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A Assembleia Legislativa do Paraná é matriz institucional desta cultura. Quando o ator político entra nela, absorve essa cultura, essa prática ao longo do seu caminho. Muitos dos atores políticos paranaenses passaram pela Assembleia e se acostumaram a esse ambiente pré-moderno.

O senhor diz que o nepotismo só pode sobreviver com a falta de transparência na política e com a ignorância. O que essa ignorância faz?

Quanto mais informação tem o eleitor, mais crítico ele é. O nepotismo só existe em uma relação de carência, pobreza e dependência pessoal. Em municípios pobres desestruturados criados pelos deputados, o eleitor não tem opção se não votar nos candidatos que os poderosos indicam. É uma relação de clientelismo clássica na ideia de que o voto pode trazer recursos para o município. Assim não há cidadania.

A prática do nepotismo em Curitiba, pela sua pesquisa, veio da época do cargo de capitão-mor, entre 1765-1799. Qual era a importância desse cargo?

A Câmara Municipal era ocupada pelos denominados homens bons. O capitão-mor era considerado a maior autoridade militar de segurança da vila, o comandante das ordenanças na vila. As famílias ricas queriam controlar o cargo nas vilas, como hoje são os cargos de prefeito. Essa elite de homens bons era formada por grandes proprietários, eram pessoas que tinham direito ao voto na câmara e representavam apenas entre 1% e 3% da população. E aí começa a cultura do nepotismo no processo de colonização. O problema é que até hoje não conseguimos uma modernização completa, temos uma duração desses problemas sociais visíveis no Brasil, em Curitiba, ainda somos uma sociedade desigual.

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