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 | Antônio Costa/Arquivo/ Gazeta do Povo
| Foto: Antônio Costa/Arquivo/ Gazeta do Povo

Há tempos a preocupação com a corrupção dos agentes públicos tem aumentado. Porém a mesma atenção não é dada a outros agentes corruptores, como pessoas jurídicas. A Lei Anticorrupção Empresarial, sancionada em agosto pela presidente Dilma Rousseff (PT) e que entra em vigor em fevereiro de 2014, é uma nova ferramenta que visa mudar essa visão. Casos como o da multinacional francesa Asltom, suspeita de pagar subornos para embolsar contratos em vários países, inclusive no Brasil, podem ganhar novas nuances punitivas. Nesta entrevista à Gazeta do Povo, Fábio Guaragni, promotor de Justiça do Ministério Público do Paraná, explica alguns pontos da nova regra e aponta como ela pode mudar, inclusive, a cultura da administração empresarial no Brasil. "O olhar sobre o corruptor é necessário para mudar uma perspectiva e enxergar que, por trás do corrupto, há uma agência corruptora que replica a atividade de corrupção em vários lugares", salienta.

É possível comparar a Lei Anticorrupção com outras legislações?

A Lei de Improbidade Administrativa também apanha não funcionários públicos e pessoas jurídicas que participam da prática de improbidade. Todas as hipóteses de infração da lei nova são também passíveis de encaixar na Lei de Improbidade Administrativa, que já era o veículo importante para fazer esse tipo de controle, mesmo que a meta dela não tenha sido propriamente a pessoa jurídica. Essa [nova] lei deriva de uma convenção da Organização das Nações Unidas que determina aos países membros e signatários, dentre os quais o Brasil, que punam a pessoa jurídica. E o Brasil, na verdade, está fazendo valer essa orientação com um atraso de dez anos.

Há outros tipos de punições na nova lei?

Ela cria uma responsabilidade objetiva civil e administrativa e um rol de penalidades para a pessoa jurídica. Algumas dessas penalidades são novas. Um avanço que se deve considerar é o olhar para o corruptor porque havia essa necessidade. Para grandes empresas que dominam setores econômicos e com grandes contas com agentes públicos, a prática de corrupção é funcional. São determinadas áreas da economia em que a corrupção é uma mola propulsora para mais ganhos, e toda ela é conduzida pelo corruptor, que é a pessoa jurídica. No entanto, a imprensa e nós, da investigação, centralizamos nosso olhar sobre o corrupto. O olhar sobre o corruptor é necessário para mudar uma perspectiva e enxergar que, por trás do corrupto, há uma agência corruptora que replica a atividade de corrupção em vários lugares. Até para a investigação é mais interessante seguir os passos do corruptor do que do corrupto.

No caso da multinacional francesa Alstom, suspeita de pagar propina a agentes públicos, quais seriam as punições de acordo com as duas leis?

Pela Lei de Improbidade Administrativa, nesse caso, cabem algumas penas para a empresa, como o ressarcimento do dano, multa civil até três vezes o valor do acréscimo patrimonial do funcionário, mas que é um valor baixo, em regra, e a proibição de contratar com o poder público e receber benefícios ou incentivos fiscais e creditícios. Com a nova lei, as multas são bem maiores porque são incidentes sobre o faturamento bruto das empresas. Outra novidade é a contrapublicidade, que é a obrigação da empresa de publicar na imprensa a sentença que a condenou por corrupção. Isso é muito significativo porque o grande capital da pessoa jurídica é a imagem. A Lei de Improbidade Administrativa possui outra diferença: a sanção tem de ser pedida no Judiciário, ao passo que, com esta lei, a multa e a contrapublicidade são administrativas, ou seja, podem ser feitas pelo próprio chefe do órgão corrompido, como o prefeito, por exemplo.

Especialistas apontam que há alguns pontos a serem discutidos. Qual a sua visão?

É uma novidade do ponto de vista da operação do poder estatal de impor sanções porque não há uma construção jurisprudencial e doutrinária sobre esse tema. Se for bem utilizada, ela pode ser uma revolução, na medida em que pode produzir grandes ganhos de cidadania. Mas teremos algumas discussões, como uma justaposição de leis.

De maneira geral, como o senhor vê os efeitos da Lei Anticorrupção?

A primeira coisa que a lei faz é produzir um novo olhar, que enxerga o corruptor como uma mola propulsora da corrupção. O segundo ponto é que há um elenco de reações muito poderoso, a pessoa jurídica que talvez não tivesse muito a temer agora tem bastante, pois a possibilidade de condenação é possante. Há também o fato de autoridades administrativas poderem impor parte das sanções, o que faz com que o processo seja muito mais rápido. A lei incita também uma responsabilidade objetiva, o que significa que ela abre mão da discussão de dolo e culpa e, nesse ponto, também devem ocorrer questionamentos.

Ela pode gerar novas práticas nas gestões de empresas?

Entramos em outro universo, o da gestão de riscos, que hoje é democratizado. Não é só o Estado que tem de fazer controle de riscos, mesmo o de corrupção ou de perigos para a administração pública. Da maneira em que as corporações são agências de poder, a fiscalização dos riscos incumbe também às empresas. As corporações estão atentas a isso, não só como uma estratégia de marketing, mas para que haja uma dinâmica mais transparente, que faça com que o público confie na pessoa jurídica. É necessário saber como a empresa costuma proceder, se ela é saudável ou não, se é honesta ou não. Cada vez mais a transparência e a exigência de uma estratégia pública clara se colocam como exigências de mercado, e a nova lei impulsiona essa exigência.

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