Noite de quinta-feira. Assim como faz todas as semanas, Ramatis Vargas, 54 anos, cuida da barraca de pamonha e derivados de milho que mantém na conhecida Feira da Lua, na Avenida Inglaterra, em Londrina. A aproximação da reportagem é discreta, mas ele não se acanha quando é perguntado sobre o parentesco com o ex-deputado André Vargas (sem partido). “Sou eu, sim”, diz um dos seis irmãos do ex-parlamentar, que teve o mandato cassado no fim do ano passado, acusado de ligações com o doleiro Alberto Youssef, preso na operação Lava Jato. Petista de carteirinha – é suplente de vereador em Londrina –, Ramatis acredita que a punição do irmão foi dada de maneira exemplar, para não ameaçar a eleição da presidente Dilma Rousseff (PT). “[Ele] foi punido drasticamente em virtude de outros casos”, considera. Nesta entrevista à Gazeta do Povo, o feirante explica como, em pouco tempo, Vargas passou de vereador à vice-presidente da Câmara dos Deputados e quais as relações que manteve durante a carreira. Ele conta também quais os planos do irmão para os próximos oito anos sem mandato. “A intenção dele é voltar para o partido”, revela.
Para o senhor, qual foi o erro do André Vargas?
Quando um cara está no poder, é um funcionário público, independente do grau, e recebe algum benefício de uma pessoa com quem ele tem alguma conversa, é improbidade. Essa foi a burrice do André e ele sabe disso. Mas na Lava Jato em si, o André não tem relação. Tanto que o nome dele não aparece em momento nenhum até agora.
Agora ele (André Vargas) está repensando. Parece que quer montar uma empresa de representação de cosméticos. Ele sempre foi um cara trabalhador, começou a trabalhar com 12 anos como office-boy.
Então o senhor acha que a pena de cassação do mandato foi exagerada?
Ele foi punido exemplarmente. Se o André não pede a desfiliação do PT, não sai do partido, não entrega o cargo de vice-presidente [da Câmara dos Deputados], a Dilma [Roussef] teria perdido a eleição. Porque a diferença da Dilma para o Aécio [Neves] foi muito pequena e o André Vargas, com o peso que tinha, teria derrotado a Dilma.
E a relação dele com o PT? Ele se sente injustiçado pelo partido?
Não, ele não deixou de ser petista em momento nenhum. Assim como eu sou petista e continuo sendo petista, apesar de algumas coisas feitas para alguns membros. Isso não faz com o que está escrito e no que nós acreditamos no partido tenha mudado. O estatuto está lá, o grande problema é botar em prática em alguns momentos. O André continua sendo petista, não está filiado, mas assim que passar todo esse maremoto, a intenção dele é voltar para o partido, não tenha dúvida. Sem mágoa, sem nada. Ele sabe que o processo e o momento eram de sacrifício.
O André acredita que influenciou negativamente a campanha da Gleisi Hoffmann (PT) para o governo?
Na minha percepção e na de outros petistas, é o inverso. A Gleisi perdeu muito por não ter o André. Esse grande problema da Lava Jato não interferiu. Se o André tivesse pedido afastamento sem perder os direitos políticos e se candidatasse, ele estaria eleito.
A que o senhor atribuiu a ascensão rápida do seu irmão no partido e no Congresso?
A ascensão se dá ao grande poder de articulação que ele tem. Ele foi candidato a vereador aqui [em Londrina] por três vezes. Nas três eu coordenei a campanha. Ganhou na terceira. Logo no início do mandato, foi para a presidência municipal do partido. Ele reestruturou o partido no estado e ganhou para deputado estadual com os votos petistas. Também tem a questão do atendimento. Ele foi um deputado atuante, que foi a todos os lugares levando verba e atendendo aos municípios. Aqui em Londrina, o deputado mais atuante era ele.
Mas ele não teve apoio de outras forças políticas? Do José Janene ou do Antonio Belinati?
Não. Na verdade, quando o Janene era deputado, os dois eram adversários. Ele não ajudou politicamente o André.
Mas ele acabou herdando o eleitorado do Janene...
Pelo estilo e articulação política. De uma maneira um pouco diferente, o André também foi nas prefeituras e atendeu as demandas. O grande problema não é trazer a verba, é manter essa relação com a comunidade.
E qual era o grau de aproximação do Janene com o André?
Eles se aproximaram na eleição do [Luiz Eduardo] Cheida [para prefeito de Londrina, em 1992], no PT. O André era um dos coordenadores da campanha. O Janene e o legado belinatista da época foram para a campanha do Cheida no segundo turno. Mas, na sequência, ele não manteve relacionamento político com o Zé [Janene], tanto que quando ele saiu candidato a deputado estadual, não fez dobradinha com o Zé. Ainda não tinha proximidade nenhuma nem identificação com o eleitorado do Zé.
Como o André conheceu o Alberto Youssef?
Não sei. Na verdade, a cidade toda se articula com pessoas que fazem trabalhos como o do Youssef. Em Londrina era assim. O Youssef tinha uma loja de câmbio e as pessoas trocavam dólar com ele, naturalmente, como trocam em qualquer lugar. Depois, ele participou do caso da AMA/Comurb] e foi condenado. Participou do escândalo do Banestado, se articulou com o PSDB. Mas, não vejo uma relação política com o André.
E como está o André hoje?
Está bem. Aquele período foi monstruoso. Um homem que estava no terceiro ou quarto nível de poder do país passou a ser o último ser humano da Terra. E para a família foi pior, pois somos voltados à questão da religiosidade. Meu pai é espírita e sempre pregou as coisas retas e justas e o André também. A não ser no momento em que ele pegou carona em um avião. Mas a relação de família não foi abalada entre nós, abalou com o que abalou ele. Agora o terremoto já passou.
E por que ele não quer falar com a imprensa?
O grande problema é que o André tomou decisões ou falou algumas coisas deslocadas da racionalidade e isso acabou repercutindo negativamente. Ele acabou não raciocinando. Se manteve nas redes sociais e conversando com alguns jornalistas, alguns que a gente jamais teria aconselhado. O André tem um apelido até engraçado que é “Bocão” porque ele fala muito e pagou caro por ter falado.
E o que ele pretende fazer agora?
Agora ele está repensando. Parece que quer montar uma empresa de representação de cosméticos. Ele sempre foi um cara trabalhador, começou a trabalhar com 12 anos como office-boy.
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