O que podemos aprender com os países que vão nos visitar?

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Oito seleções de futebol vão disputar jogos da Copa do Mundo em Curitiba: as da Rússia, Espanha, Argélia, Nigéria, Irã, Austrália, Equador e Honduras. Os brasileiros nem sempre conhecem a cultura e a realidade dessas nações, mas os países que visitarão a capital paranaense têm o que ensinar na política ao Brasil – tanto de boas práticas democráticas como daquilo que não se deve fazer.

"Todos trazem aspectos positivos e negativos. Podemos imitar a capacidade para o desenvolvimento da ciência da Rússia, mas temos que fugir da forma como eles tratam as liberdades individuais", exemplifica o cientista político Masimo della Justina, professor da PUCPR.

Da Austrália, uma inspiração poderia ser a elaboração e execução do orçamento público: lá, além de gastar pouco, os gestores são cobrados para organizarem as finanças de um modo eficiente. Já Honduras e Equador são países pequenos e pobres que passaram por ditaduras e guerras civis. No entando, nos últimos anos, conseguiram manter regimes democráticos – ainda que tenham problemas.

O Irã se organiza como uma teocracia – quando existe uma autoridade religiosa que interfere nas decisões do governo – e o país é recorrente no noticiário quando o assunto é a liberdade de imprensa e de expressão. Mas nem tudo é ruim e até o controverso Irã pode inspirar os brasileiros. "O país é antigo e preza pela proteção do mercado interno. Isso traz benefícios para a economia. Mas é claro que isso precisa ser dosado", comenta Luís Alexandre Carta Winter, professor da PUCPR.

Coreia em Foz

Além das seleções que passam por Curitiba, outro país que vai marcar presença no Paraná durante a Copa é a Coreia do Sul, que ficará concentrada em Foz do Iguaçu, no Oeste do estado. Uma das regiões habitadas mais antigas do mundo, a Coreia passou por um processo de divisão em 1948, quando soviéticos e americanos separaram o território do país. Desde então, a Coreia do Sul recebeu maciços investimentos ocidentais e construiu uma democracia consolidada.

"Em termos de democracia, acredito que a Coreia seja o melhor exemplo. O país investiu em educação e hoje é uma potência tecnológica", comenta Andrew Traumann, professor de Relações Internacionais do Unicuritiba. Lá, o chefe de estado, eleito por voto universal, tem um mandato de cinco anos. O presidente é responsável por indicar o primeiro-ministro, que é o chefe de governo.

Países

Espanha

A Espanha é uma monarquia parlamentarista. O rei é o chefe de Estado e tem uma função simbólica: representa a nação. Embora a força da monarquia seja questionada – recentemente o rei Juan Carlos abdicou do trono em favor do filho –, o sistema pode ser considerado um exemplo. "Na transição entre o franquismo [regime do ditador Francisco Franco, que governou o país entre 1939 e 1975] e a redemocratização do país, os espanhóis foram capazes de construir instituições fortes", diz Andrew Traumann, da Unicuritiba. Quem governa, na verdade, é o primeiro-ministro, eleito de forma indireta pelo Parlamento. Na Espanha, há vários partidos, mas eles se dividem em dois grupos predominantes. "No Brasil, temos muitos partidos, mas as siglas menores são reféns das mais poderosas e isso enfraquece o Executivo", compara Traumann. Do ponto de vista econômico, o modelo espanhol gerou distorções sociais. "Há muita concentração de renda", comenta Masimo della Justina, professor da PUCPR.

Equador

País próximo do Brasil, o Equador está organizado como uma república presidencialista. Os equatorianos participam com regularidade de eleições. Novo na democracia, atualmente o Equador tem um governo de centro-esquerda, com tendências bolivarianas. "Eles são mais parecidos com a Argentina e a Venezuela do que conosco", diz Masimo della Justina, professor da PUCPR. O Poder Executivo tem primazia sobre outras instituições. Recentemente, o país adotou uma nova Constituição que, embora questionada por ter tendência bolivariana, trouxe alguns avanços reconhecidos internacionalmente. "O documento traz a floresta como novo sujeito de direito, é uma legislação bastante avançada", comenta Luis Alexandre Winter, professor da PUCPR. Nos últimos anos, o governo conseguiu reduzir a pobreza, dando acesso ao atendimento básico de saúde e à educação. "Algo interessante de lá, e que podemos tomar como exemplo, é o compromisso do governo com a educação, que é totalmente financiada pelo governo", comenta Justina.

Irã

No Irã, há eleições presidenciais a cada quatro anos, mas o sistema político é fortemente influenciado pelo Islã. Para ser candidato, a pessoa precisa passar pelo crivo das autoridades religiosas – o que impede mudanças. "Na prática, todos os políticos estão ligados ao governo. O eleitor pode escolher entre os mais moderados e os mais radicais, mas não existe oposição", explica Andrew Traumann, professor do Unicuritiba. As liberdades individuais são restritas. Ainda assim, há no país uma classe média escolarizada que, de forma consciente, faz opção pela teocracia. "Nós, ocidentais, temos tradição de separação entre Estado e religião. Essa interferência [da religião na política] é perigosa para o desenvolvimento e deve ser evitada", diz Luis Alexandre Winter, professor da PUCPR. Apesar disso, o Irã é um dos países mais antigos do mundo, com grande riqueza cultural, diz Masimo della Justina. Essa identidade cultural faz com que a economia se desenvolva internamente.

Rússia

O país é uma federação republicana, com sistema misto entre o presidencialismo e o parlamentarismo. Embora haja eleições para presidente a cada seis anos, com voto secreto e universal, a Rússia não é vista como um modelo político a ser seguido. "Depois do socialismo, vemos a emergência de novos ricos, com alta concentração das riquezas. O regime é autoritário internamente, com pouca tolerância à opção dos indivíduos", comenta Masimo della Justina, professor da PUCPR. Os movimentos separatistas foram tolhidos nos últimos anos e a Rússia também restringe direitos dos gays. Com um governo centralizador, os recursos do governo são distribuídos entre os aliados e a oposição fica sufocada. No entanto, a população aprova o governo. "Vemos que a população russa se sentiu humilhada com o fim da União Soviética. Um líder forte e centralizador reergueu o orgulho russo. Para eles, isso é mais imprescindível que a democracia", afirma Andrew Traumann, da Unicuritiba.

Austrália

Da terra dos "socceroos", os especialistas indicam uma série de exemplos positivos de democracia. A Austrália é uma democracia parlamentarista. É difícil até achar defeitos na organização política do país: o regime jurídico e a organização das finanças públicas são copiadas em diversos lugares do mundo. "O Poder Judiciário tem força para criar normas a partir da interpretação das leis. Se aqui a jurisprudência tem força, lá ela vira lei. Isso faz com que as leis se adaptem à dinâmica dos costumes", comenta Eduardo Saldanha, professor da FAE. Outra grande ideia dos australianos é a lei de responsabilidade fiscal, que efetivamente é executada pelos governantes. "O endividamento do Estado é mínimo e os gastos são eficientes", diz Saldanha. Mas nem tudo são flores: a Austrália tem uma política de imigração considerada elitista, com programas de atração apenas para quem tem curso superior, por exemplo.

Honduras

O país da América Central, assim como a maioria das nações do continente, adota o sistema presidencialista. Diferentemente de expressiva parcela dos vizinhos latino-americanos, onde o Executivo domina os demais poderes, em Honduras o Parlamento é forte e possibilita um maior equilíbrio institucional. "O país passou por guerras civis, mas hoje se insere na democracia. A grande vantagem histórica de Honduras é que os grupos radicais e revoltosos se organizaram e passaram a integrar a sociedade como partidos políticos, o que aumenta a participação política", comenta Luis Alexandre Winter, da PUCPR. Apesar disso, em 2009 o país passou por uma convulsão com a deposição do então presidente Manuel Zelaya. Para seus aliados, ele sofreu um golpe. Os opositores diziam que ele desrespeitou a Constituição ao propor a reeleição dos presidentes – o que é proibido em Honduras para evitar a concentração de poder. Hoje, o país já retomou a normalidade democrática.

Nigéria

A Nigéria é uma república presidencial e pluripartidária. É um dos países mais ricos da África, grande exportador de petróleo. Para os analistas, é uma nação que inspira admiração e preocupação. "É um país gerador de paz para outras nações africanas. Oferece aparato militar e logístico em missões de paz, além de uma forte ajuda econômica. No entanto, na Nigéria a corrupção é uma pandemia e isso é algo que devemos evitar por aqui", comenta Masimo della Justina, da PUCPR. Há liberdade de imprensa e expressão, mas existem conflitos entre grupos radicais de diferentes religiões e etnias. O país se divide entre cristãos, islâmicos e os seguidores de seitas animistas. "O sistema político não consegue atuar nesses conflitos. Como há muita corrupção, a Nigéria não consegue criar oportunidades econômicas e de formação de renda para a população. Com maior capacidade econômica, a população não daria ouvidos a grupos radicais", comenta Justina.

Argélia

País com maior extensão territorial do continente africano, a Argélia só conquistou sua independência da França em 1972. Desde então, passou por vários sistemas de organização política. Nos anos 1990, os argelinos enfrentaram uma sangrenta guerra civil. Atualmente, é uma república, cujo presidente tem mandato de cinco anos, eleito por voto universal. Ele nomeia o primeiro-ministro, que é o chefe de governo. Embora se organize formalmente como uma democracia, a população convive com um governo centralizador e autoritário. Há problemas com a liberdade de imprensa. "Há muitos integrantes da Al-Qaeda que fugiram da Líbia para a Argélia. O governo aproveita a presença desse grupo para aumentar o controle sobre a população", afirma Andrew Traumann, da Unicuritiba. "Mas precisamos reconhecer que a Argélia é o país com alta atividade econômica e posição de destaque na ciência, com grande desenvolvimento intelectual", comenta Eduardo Saldanha, professor da FAE.

Fontes: Luis Alexandre Carta Winter, Eduardo Saldanha, Andrew Traumann e Masimo della Justina.