Cronologia
Relembre os principais momentos dos protestos de junho em Curitiba:
13/06 Uma manifestação do Movimento Passe Livre contra o aumento de R$ 0,20 na tarifa do transporte urbano termina de forma violenta em São Paulo. Os cerca de 5 mil manifestantes são dispersados com balas de borracha e spray de pimenta pela PM. Jornalistas e fotógrafos são agredidos, contrariando o discurso da polícia de que estava apenas reprimindo baderneiros. As imagens chocam brasileiros em todo país.
14/06 Cerca de 700 pessoas saem às ruas de Curitiba em protesto contra a tarifa de ônibus na capital e em solidariedade às vítimas da violência policial em São Paulo. Os manifestantes saem da Boca Maldita e rumam ao Palácio Iguaçu. O protesto é pacífico.
17/06 Milhares de brasileiros saem às ruas em diversas cidades do país. Em Curitiba, 20 mil marcham no centro da cidade de forma pacífica. Eles pedem a derrubada da PEC 37 projeto que iria restringir o poder de investigação do Ministério Público. Também reivindicavam serviços públicos de qualidade e o fim dos gastos públicos nas obras da Copa. Um pequeno grupo, no fim da passeata, tenta invadir o Palácio Iguaçu. Os manifestantes são reprimidos pela polícia. Quatro são detidos por danos ao patrimônio.
20/06 Debaixo de chuva forte, 3,5 mil manifestantes fazem novo protesto em Curitiba. Desta vez, o ato termina em depredação no Centro Cívico e confronto direto com a PM. Cerca de 30 pessoas arremessam paus e pedras contra policiais e jornalistas que cobriam o evento. Três ficam feridos e sete são detidos.
21/06 15 mil pessoas se concentram na Boca Maldita. Mas ocorre uma separação em grupos. Um deles vai para o Centro Cívico, onde entra em confronto com a PM em frente do Palácio Iguaçu. Os policiais agem depois que um manifestante arremessa um coquetel molotov. Outro grupo se dirige à Arena da Baixada, no Água Verde. Lá, os manifestantes entram em confronto com torcedores atleticanos, que "defendiam" o estádia da Copa. No total, 30 pessoas são presas e três policiais saem feridos. O número de civis machucados no confronto não foi contabilizado.
22/06 Mil pessoas se reúnem na Praça Santos Andrade para protestar contra a PEC 37. Há policiamento reforçado e alguns comerciantes não abrem as lojas com medo de saques. Depois do ato, cerca de 50 manifestantes fazem um mutirão para limpar a bagunça do dia anterior, limpando pichações e recolhendo lixo das ruas.
O Brasil passou os últimos meses tentando entender os protestos que ficaram conhecidos como "Jornadas de Junho". Em pouco tempo, surgiu uma bibliografia extensa sobre o tema, além de análises, debates e pequenos documentários elaborados pela mídia, acadêmicos e até mesmo por políticos. As vozes dos manifestantes que saíram às ruas, porém, foram ficando cada vez mais fracas no debate público. Cinco meses depois do auge das marchas, a Gazeta do Povo foi atrás de jovens que estavam lá para que eles avaliassem os resultados dos protestos.
A produtora de tevê Thabata Curi Dumpierre Machado, de 18 anos, conta que o que a levou às ruas foi a indignação com a violência contra jornalistas em São Paulo, especificamente contra a repórter da TV Folha Giuliana Vallone, vítima de um tiro de bala de borracha da PM no olho. "O que aconteceu com ela e a omissão inicial do jornal me indignou", lembra. Em uma das passeatas de Curitiba, Thabata saiu carregando um cartaz onde se podia ler "Cadê a liberdade de imprensa?" momento registrado pelo fotógrafo da Gazeta do Povo Daniel Castellano.
A repressão policial nos protestos pela redução da tarifa de ônibus em São Paulo, aliás, foi o estopim da onda de descontentamento difuso que levou milhões a protestarem. Mas cada um conseguiu encontrar sua própria motivação para levantar cartazes e marchar por um país melhor.
O consultor comercial Emilio Bompeixe Schulte Netto, de 27 anos, aderiu à massa descontente pela magnitude da manifestação em si. "Juntei alguns amigos porque achei que aquele protesto seria histórico, e levantei a bandeira contra a PEC 37 [proposta de emenda à Constituição que restringia o poder de investigação do Ministério Público], que estava em discussão no momento e ia contra os interesses da população", conta.
Aquela jornada da qual participou Schulte Netto, em 21 de junho, culminou com a depredação de vários pontos no Centro Cívico, em Curitiba. "Comecei a ver as pessoas destruindo tudo, e estava gritando para que parassem, pois aquilo era nosso patrimônio também", lembra. Foi esse instante que o fotógrafo Daniel Castellano captou.
A jornalista Silvia Henz, que participou da Marcha das Vadias e se autodefine como "parceira para qualquer manifestação", decidiu fazer coro com a maior parte dos manifestantes. Saiu às ruas para pedir mais serviços públicos de qualidade, como saúde e educação, e menos investimentos na Copa do Mundo. "Boicote à Copa", dizia seu cartaz.
"A Copa representava uma inversão de valores para mim. Achei aquela causa certa e fui para a rua", diz Silvia. "Mas quando estava lá, vi uma porção de gente gritando por coisas que não tinham o menor sentido, pedindo a militarização do país e fora Dilma. Me senti enganada."
Nem tudo são flores
Silvia conta ainda que se sentiu desiludida com a falta de foco dos protestos. "A gente grita e acha que pode mudar as coisas, mas ninguém está nem aí e a gente descobre que não pode mudar nada, só pode abaixar a cabeça. Não sei se vou protestar mais na rua."
A decepção da jornalista Silvia encontra eco na avaliação que Thabata faz das jornadas. "O sentimento durante o protesto foi de felicidade, por saber que o povo tinha acordado e lutava por alguma coisa. Mas, no fim, a gente acabou vendo que não teve muito resultado. A tarifa [de ônibus] abaixou. Mas essa era a menor das conquistas que a gente queria", diz a produtora de tevê.
Schulte Netto, porém, é um pouco mais esperançoso. "Os protestos tiveram um impacto muito grande. A tarifa baixou, a PEC 37 foi derrubada, e o fato de a presidente [Dilma Rousseff] se propor a levar a plebiscito ideias de reforma política indicam isso", diz ele.
Os três concordam, porém, que a violência de grupos vândalos e a consequente repressão policial desestimularam a participação nas manifestações. "Eu não queria me envolver naquilo [no vandalismo]. Acho que a ideia do protesto nem era essa. Tinha gente que estava lá só para fazer bagunça, não sabiam o contexto", diz Thabata. "A truculência [da polícia] acabou prejudicando. Acertaram spray de pimenta no meu olho. Por isso não voltei mais", completa o consultor comercial.
Discussão
Ainda assim, analisando com certa distância temporal, os ex-manifestantes conseguem ver pontos positivos nos protestos. "As pessoas estão bem mais politizadas agora, compartilhando mais informações na internet", comenta Schulte Netto. "Até para tentar entender as passeatas, as pessoas passaram a debater mais", concorda Silvia. "Eu só espero que essa indignação se reflita nas eleições do ano que vem", arremata Thabata.
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