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Órgão responsável pelo grosso dos repasses do Ministério da Educação (MEC), o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) avaliza contas e autoriza liberação de verbas para municípios que fraudam licitações, não comprovam despesas e aplicam incorretamente dinheiro que deveria financiar a merenda e o transporte escolar. Mesmo quando a Controladoria Geral da União (CGU) aponta as irregularidades, enviando alertas públicos, a autarquia ligada ao MEC dá carimbo de aprovadas a gestões postas sob suspeita ou não se mexe, deixando os casos sem análise.

Não existe legislação obrigando o FNDE a suspender os repasses e seguir o que diz um relatório da CGU, mas o órgão do MEC, segundo auditores, deveria rever seus pareceres ao ficar sabendo que há irregularidades. Só no Rio, a CGU encontrou problemas nas contas de 35 cidades entre 2003 e 2009, que em alguns casos provocaram falta de comida para os alunos. O FNDE afiançou ou manteve sem apreciação a documentação de 34 delas. Só em uma (Miguel Pereira) houve diligência para verificar a situação.

Em 2008 e 2009, uma das poucas contas aprovadas foi a do transporte escolar de Lagoa do Piauí (PI), cidade de 3,8 mil habitantes. Após um pente-fino, a CGU apurou que a licitação para oito rotas foi forjada. Propostas apresentadas pelas empresas traziam os mesmos erros de português. Os serviços prestados estavam longe de cumprir exigências de resoluções do FNDE. Os alunos eram transportados como carga em caminhões e os ônibus eram guiados por motoristas inabilitados.

Somados, os programas de apoio à alimentação (Pnae) e ao transporte escolar (Pnate) - ambos voltados ao ensino básico - transferiram a estados e municípios R$ 15,28 bilhões entre 2005 e setembro de 2011. O primeiro recebeu a maior fatia (R$ 12,79 bi), contra R$ 2,49 bilhões do outro. Apesar das cifras e do elevado índice de irregularidades na educação, é significativo o lapso de tempo entre a transferência do dinheiro e a avaliação, pelo FNDE, da regularidade das contas.

Menos de um terço dos relatórios do transporte escolar, referentes aos exercícios de 2008 e 2009, já foi escrutinado; no caso da merenda, 90% esperam análise. Em setembro, a Polícia Federal mandou prender o prefeito da cidade alagoana de Traipu, após desbaratar um esquema que desviou ao menos R$ 8,2 milhões dos cofres da educação, sendo que parte do dinheiro serviria ao transporte. Fraudes que ocorreram entre 2007 e 2010. Se a prestação de contas desse pistas das irregularidades, o FNDE não as farejaria: o último ano analisado foi 2006.

Prestação de contas não é prioridade

Para cumprir sua obrigação de fiscalizar o dinheiro, o FNDE se vale do controle social, exercido por conselhos de representes da comunidade. Cabe a eles inspecionar as escolas e enviar pareceres pela aprovação, ou não, das contas dos municípios. É tarefa do órgão examiná-los. Em Lagoa do Piauí, os conselheiros se limitavam a aprovar informações prestadas pela prefeitura, o que, segundo a CGU, é falha recorrente no país. Não por acaso, não houve merenda em março nas escolas do município, cujas contas da alimentação constam como "recebidas".

Em Presidente Sarney (MA), com 18 mil habitantes, as contas da alimentação aparecem como aprovadas em 2007 e recebidas em 2008 e 2009. Fora irregularidades em licitações, a CGU esteve lá e apurou que os alimentos eram mal armazenados e preparados com água suja. Em outubro de 2007, os auditores da CGU foram à cidade serrana de Areal (RJ). Detectaram irregularidades nas licitações da merenda, que custou ao município até 200% mais que a comprados por prefeituras vizinhas, com "forte indícios de conluio entre essas empresas". No transporte, os pagamentos ocorriam sem controle pela prefeitura. Nem por isso, as contas de 2007 de ambos os programas deixaram de ser "aprovadas".

- A prioridade é fazer a verba chegar às secretarias, e não a prestação de contas. Quando o conselho local dá parecer favorável, o FNDE apenas ratifica, em vez de olhá-lo. Quando se trata do contrário, não tem gente suficiente para levar o caso adiante - resume um auditor de contas da Educação.

Questionado, o FNDE se negou a informar quantos técnicos avaliam as 25 mil prestações de contas anuais e fazem as oito mil diligências. Em 2004, a equipe aprovou as contas de Rio Bonito (RJ), a partir do relato ofertado pelo Conselho de Alimentação Escolar (CAE). Porém, falhas na licitação provocaram falta de alimentos em, pelo menos, sete dias de um mês.

Auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) mostra que, em 2009, o FNDE levava, em média, 455 dias para enviar o primeiro ofício ao prefeito ou ao secretário de Educação, depois que alguma irregularidade é constatada ou denunciada. Daí até a instauração e o julgamento de uma tomada de contas especial (TCE), anos se passam. A demora para verificar as contas impede que se recupere dinheiro que pode ter sido usado.

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