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Os mortos do cemitério da Filosofia, em Santos, não descansam em paz. Reportagem do jornal 'A Tribuna' mostra que há pelo menos 10 anos coveiros e pessoas que limpam as sepulturas mantêm vivo um mercado macabro: o da venda de ossos humanos. Até hoje ninguém foi punido. O jornal acompanhou a encomenda e compra de uma ossada por R$ 100. Durante a transação encontrou jazigos abertos e com ossos expostos. Sem se identificar, o repórter conversou com funcionários e descobriu que as irregularidades, além de antigas, são corriqueiras. E estimuladas pela fragilidade da vigilância.

O Cemitério da Filosofia abriga cerca de 25 mil corpos e é o maior de Santos. São 20 servidores públicos para zelar por uma área de 48 mil metros quadrados. Em média, um funcionário para cada 2.400 metros quadrados.

Segundo relatos de coveiros, os universitários da área de Saúde são os que mais procuram por ossos, que seriam usados em estudos de anatomia. Adeptos de magia negra também estariam entre os clientes. No Cemitério do Paquetá, onde estão sepultadas várias personalidades ilustres, funcionários ameaçaram até chamar a polícia quando foram abordados sobre a compra. No Areia Branca, coveiros disseram que seria ‘‘difícil’’ fornecer os ossos, por causa da fiscalização de chefias. Mas sugeriram uma investida no cemitério do Saboó, onde haveria mais facilidades. Lá, o negócio foi fechado com um coveiro. A entrega foi feita no dia seguinte, no meio da tarde, em frente ao portão principal do cemitério. O vendedor tirou a ossada, envolta em um saco branco, de dentro de uma mochila. Pegou o dinheiro e saiu tranquilamente, dizendo que, se preciso, conseguiria mais ossos.

Na maioria dos casos, os ossos são retirados do ossuário geral, que fica no chamado Cruzeiro das Almas. Lá, são depositadas, principalmente, ossadas de pessoas que foram sepultadas como indigentes. O material fica a céu aberto, para que se decomponha rapidamente.

Mas também há indícios de que sepulturas são arrombadas para atender aos compradores.

- Se você quiser, é só arrastar umas tampas que estão soltas e pegar os ossos) - disse um coveiro, que, no entanto, se negou a participar da transação. ‘Isso dá cadeia’, afirmou.

De acordo com o Código Penal, violar sepulturas ou urnas funerárias é crime passível de um a três anos de reclusão, assim como destruir, subtrair ou ocultar cadáveres.

Dentro do Cemitério da Filosofia, próximo ao ossuário geral, o comprador conversa com um rapaz que limpa campas. Sem se identificar, pede uma ajuda para comprar os ossos. E o funcionário relata a fragilidade na fiscalização do local.

O vice-prefeito e secretário de Obras e Serviços Públicos, Antônio Carlos Silva Gonçalves, considerou a prática ‘‘absurda’’ e ‘‘vergonhosa’’. E prometeu exonerar os envolvidos. A Prefeitura de Santos pretende enviar à Câmara Municipal um projeto de lei que permitirá a venda e perpetuação de sepulturas nos cemitérios públicos. Com os recursos a serem gerados, seriam instaladas câmeras de monitoramento para inibir delitos.

O secretário prometeu instaurar uma sindicância administrativa para apurar a participação de funcionários e registrar um boletim de ocorrência com base no conteúdo da reportagem.

O presidente do Centro Acadêmico da Faculdade de Medicina do Unilus, Eric Augusto Rovera, afirma que os estudantes não têm motivos para comprar ossos clandestinamente, já que nos laboratórios há exemplares reais e obtidos legalmente. O material fica à disposição dos alunos, inclusive nas vésperas de provas.

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