O voto de Celso de Mello, que decidiu nesta quarta-feira aceitar os embargos infringentes no caso do mensalão, repercutiu instantaneamente na sociedade civil e também entre especialistas. Ouvidos pelo GLOBO, eles demonstram preocupação com o tempo que o julgamento dos recursos pelo Superior Tribunal Federal (STF) pode levar e também com a possibilidade de impunidade.
Edmar Bacha, diretor do Instituto de Estudos de Política Econômica Casa das Garças e ex-presidente do BNDES, diz esperar que haja celeridade daqui para frente.
"Eu espero que a Corte se dê um prazo fixo: "vamos terminar isso até março do ano que vem", algo concreto. Ou então, "não vamos tirar férias para acelerar o processo de garantir o direito dos réus e assegurar que a Justiça seja feita", diz.
Já Gil Castello Branco, secretário-geral da ONG Contas Abertas, se disse desagradado com os rumos que o caso levou.
"Vai ser difícil acordar amanhã. Sonhávamos com um marco para o fim da impunidade e nos deparamos com os recursos dos recursos, os embargos dos embargos. O enredo parecia diferente, mas o final do filme será o de sempre. Os tubarões não irão para a cadeia", protestou.
Cristiane Maza, da organização Todos Juntos Contra a Corrupção, também expressou descontentamento. Para ela, a opção de aceitar os embargos infringentes foi "decepcionante". "Acho que essa decisão vai levar a uma retomada às ruas. É preciso que as pessoas voltem às ruas. Para o cidadão comum, parece que o Supremo não é supremo. Havia uma expectativa muito grande para que essa questão não terminasse em pizza", afirmou.
Cientista político da PUC-RJ, Ricardo Ismael diz que o Supremo optou por protelar o cumprimento das sentenças. Ele afirma que a sensação de impunidade tende a aumentar na sociedade brasileira.
"O que mais lamento é que isso vai demonstrar que nem todos são iguais perante à lei. Infelizmente, para alguns, os julgamentos são ritos sumários. São rápidos. Para outros, os poderosos, os processos podem se arrastar por anos. Há a constatação da impunidade", critica.
Luciano Santos, advogado especialista em direito eleitoral do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), acha que "por mais técnica, polêmica e passível de divisões a questão", o voto a favor dos embargos infringentes "encerra um crédito que a opinião pública tinha dado ao Supremo Tribunal Federal (STF)".
Segundo Santos, o julgamento do mensalão foi, em sua essência, emblemático e muito eficiente; os réus já haviam sido julgados numa corte privilegiada e, por isso, "o caso já poderia ter sido encerrado". Mas o caso não foi o que, para Santos, "traz uma sensação de desalento e impunidade à sociedade".
"Muitas cortes superiores, como o próprio Tribunal Superior Eleitoral (TSE), vêm interpretando embargos semelhantes como inconstitucionais. O supremo anda, portanto, num caminho contrário. A discussão não é só técnica, a divisão que se produziu entre os ministros do STF expõe a disfuncionalidade do Judiciário brasileiro", declarou.
Para o advogado, "a lua de mel da população com o STF acabou". E a população agora deve ficar atenta a alguns fatores daqui para a frente: como os réus vão recorrer ao STF, se esses embargos serão votados com rapidez, se serão julgados em blocos (como ocorreu no julgamento do mensalão), e se o chamado "mensalão mineiro", que afeta o PSDB, será avaliado com critérios semelhantes pelo Supremo - e principalmente antes das eleições de 2014.
"Preciso não acreditar que a nova composição do STF (com dois ministros novos indicados pela presidente Dilma Roussefff, Luís Roberto Barroso e Teori Zavascki, que votaram a favor dos embargos) tenha trazido algum partidarismo ao julgamento. Mas acho que a decisão desta quarta-feira traz à tona uma discussão pertinente, que a população precisa promover: será que deve caber apenas ao presidente indicar a composição do STF?", indaga.
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